MICHAEL KEPP*
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É curioso os brasileiros usarem
modos tão diretos para pedir favores
e tão indiretos para recusá-los
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APESAR DE OS brasileiros acharem os americanos "objetivos", um eufemismo para "curto e grosso", meus compatriotas não são nada diretos quando pedem um favor.
Talvez porque os americanos sejam ensinados a pedir desculpas até pela menor inconveniência. Sempre dizem "com licença", seja quando esbarram em um pedestre, seja como preâmbulo para uma pergunta.
Os preâmbulos que precedem o pedido de um favor são ainda mais precavidos.
Eles começam com um "com licença, mas" e se escoram em um "se". Uma vez, pedi a um amigo carioca: "Com licença, mas você se importaria se eu abusasse e perguntasse se pode me emprestar esse CD?".
Ele achou o pedido incrivelmente barroco e disse que um brasileiro só diria "cara, me empresta esse CD".
Apesar dos meus 28 anos de Brasil terem me tornado um híbrido de duas culturas, meu lado americano ainda acha esse pedido brusco meio presunçoso.
Talvez porque me lembre do tratamento diferenciado que alguns brasileiros esperam receber das classes menos favorecidas quando fazem pedidos. Veja o empresário que chega ao botequim quando está fechando e diz ao gerente: "Amigo, fique aberto mais um pouco. Estou com um famoso cineasta faminto".
Acho curioso os brasileiros usarem modos tão diretos como "me dá" ou "me deixa", mas escolherem modos tão indiretos de recusa.
Veja expressões vagas como "pode ser" e "vamos ver", seguidas por "se não der, fica para a próxima", com as quais se dribla o "não".
Os americanos não navegam em torno dos negativos quando recusam um favor.
"Talvez o modo ideal de pedir e
recusar favores seja incorporar
o melhor das duas culturas."
É por isso que os brasileiros os consideram tão diretos. Um ianque encerra um convite com "não posso, estou ocupado".
Uma vez, ao chegar a um hotel num parque nacional americano, vi que precisaria de um carro para ir às trilhas.
Pedi a um funcionário: "Com licença, mas eu estaria pedindo demais se perguntasse se estaria interessado em me levar até uma trilha por um valor que achasse aceitável?".
Sua recusa ríspida, "sim, você estaria", foi pior do que "não posso, estou ocupado".
Talvez o modo ideal de pedir e recusar favores seja incorporar o melhor das duas culturas. Os pedidos não seriam bruscamente brasileiros nem barrocamente americanos, e as recusas seriam definitivas, sem ser duramente americanas ou evasivamente brasileiras.
Nesse mundo de fantasia, eu perguntaria ao funcionário: "Você poderia me levar a uma trilha por uma grana?".
E ele responderia: "Gostaria, mas estou ocupado. Fica para a próxima".
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*MICHAEL KEPP, jornalista norte-americano radicado há 28 anos no Brasil, é autor do livro de crônicas "Sonhando com Sotaque - Confissões e Desabafos de um Gringo Brasileiro" (ed. Record)
Fonte: Folha online, 01/02/2011
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