domingo, 22 de fevereiro de 2015

'A Igreja ainda não aprendeu a viver numa ‘política de comunhão’


 Reprodução

Monge Marcelo Barros acredita que mensagem 
de Francisco fortalece Teologia da Libertação. 

A Teologia da Libertação vivencia, hoje, um momento de refortalecimento e difusão de suas ideias na figura do Papa Francisco. Ainda que não se considere adepto do pensamento dessa corrente do Cristianismo, o Sumo Pontífice tem ecoado em todo o mundo fundamentos da mensagem libertadora.


Para comentar esse contexto, o monge beneditino e escritor Marcelo Barros conversou com exclusividade com a Adital, durante o 11º Encontro Nacional da Pastoral da Juventude (ENPJ), realizado em janeiro desate ano, em Manaus, Estado do Amazonas, no Brasil.


Barros acredita que, atualmente, os grandes temas da humanidade passam primordialmente pelas juventudes e por uma cultura do "bem viver”, respeitando povos, tradições e culturas. Na relação dialógica entre a vida concreta e a espiritualidade, o escritor também aponta que a Igreja Católica ainda não aprendeu a viver numa "política de comunhão” e que o desafio de Francisco passa por esse caminho.




Adital – O senhor acredita que os jovens vão se apropriar das ideias da Teologia da Libertação? Como engajar a juventude nesta temática?

MB – A Teologia da Libertação tem que incorporar, hoje, os grandes temas, que são os temas da juventude. Então, toda a questão, por exemplo, da relação de gêneros, especificamente os novos desafios, como a questão do homoerotismo, de todos esses desafios éticos e morais que tocam a família, que tocam as relações humanas, têm que ser incorporados na Teologia da Libertação. Como também a questão da cultura do Bem Viver, toda a questão ecológica, indígena e negra.


Adital – Na sua opinião, a ascensão dos governos progressistas na América Latina contribui para uma abertura, para uma recuperação da Teologia da Libertação?

MB – Sem dúvida nenhuma, inclusive, alguns deles, como o de Rafael Correa [presidente do Equador], foi formado dentro dos campos da Teologia da Libertação. Agora, o que é importante é que a Teologia da Libertação sempre parte das bases e dos pequenos, e não dos governos, mas é bom ter governos como aliados.


Adital – Qual é a relação das ideias do Papa com a Teologia da Libertação?

MB – O Papa Francisco mostra uma identidade muito grande com alguns princípios fundamentais da Teologia da Libertação, como o fato da inserção na vida concreta, a partir dos pobres, ter uma atitude espiritual que é de amor universal, abertura... Isso coincide muito profundamente, o que é importante é que haja uma leitura mais sistemática, mais estrutural e não somente ocasional.


Adital – A chegada do Papa Francisco ao Vaticano resgata, então, a Teologia da Libertação? Quais são os desafios que ele tem que enfrentar, sobretudo, dos movimentos mais opressores, em vista da opção pelos movimentos mais oprimidos?

MB – Como o Papa representa uma instituição que é imperial, que é monárquica, que é piramidal e que, até agora, não aprendeu a partir do diálogo e a viver numa política de comunhão no sentido de igualdade, então, o desafio é nisso. Ele, como Papa, deve propor esse caminho novo.




Adital – O senhor acredita que está havendo uma campanha de difamação contra o Papa Francisco? Tem gente duvidando, por exemplo, da veracidade da carta que ele enviou aos jovens aqui do Encontro...

MB – O Papa Francisco desgosta profundamente dos grandes do mundo. Então, na Itália mesmo, na Europa, em vários jornais e meios de comunicação, tem havido sim uma campanha sistemática contra ele, e é muito importante que a proposta dele, que agrada tanto a muita gente da humanidade, penetre mais nas estruturas da Igreja Católica.


Adital – Recentemente, tivemos o atentado contra a revista Charlie Hebdo, em Paris, que colocou muito em discussão a intolerância religiosa e a liberdade de expressão. Como o senhor analisa essa questão? Quais os limites de um e de outro?

MB – Acho que o atentado de Paris foi uma coisa lamentável, a gente só pode se condoer e se solidarizar com os parentes das vítimas, mas ele é resultado de uma expressão cultural de muita arrogância, de muita prepotência dos franceses, dos europeus, que olham sempre o outro, o muçulmano, o árabe e o latino-americano, o africano como inferior, como não tendo direitos iguais. Então, uma coisa é liberdade de expressão, a outra é essa avacalhação de uma maneira suja, que o outro não pode responder, da religião e da cultura. Então, enquanto não houver uma mudança nessa linha, pode haver outros fatos como esse. Eu lamento, não sou a favor, mas é uma violência provocada por outra violência. A violência institucional é maior.


(Colaborou Marcela Belchior)
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Fonte: Adital online, 22/02/2014 
 Foto: Reprodução.

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