Juremir Machado da Silva*
Tem dado sobre tudo. Até sobre o riso. Quem ri mais? Uma
pesquisa afirma que os franceses riem 4,6 vezes por dia em média. Os
cariocas andam rindo de graça. Por causa da bunda da atriz Paolla
Oliveira. Só se fala nisso. Carioca ri de qualquer coisa. Tem cara
andando de praia em praia para encontrar bumbuns mais engraçados. O riso
depende da idade. Um francês de menos de 25 anos ri em torno de sete
vezes por dia. Já 21% dos franceses na chamada melhor idade, ou terceira
idade, riem menos de uma vez por dia. Segundo o viajante Jean de Léry,
que esteve no Brasil no século XVI, os índios só faziam rir. Hoje,
parecem velhos franceses. Não acham graça de coisa alguma. Também
pudera. Eles já sabem que foram saqueados e que não tem volta.
Os dados são de precisão impressionante. Em 1939, os franceses riam
20 minutos por dia. Os nazistas acabaram com a festa. Em 1980, os
franceses já riam apenas seis minutos por dia. Hoje, um terço dos
franceses ri menos de um minuto por dia. Não é triste? Sérias medidas
estão sendo tomadas. O riso é coisa grave. Terapias do riso ganham
força. Empresas já pensam em premiar quem rir mais de dez vez por dia no
trabalho sem diminuir a produtividade. O riso profissionalizou-se.
Antes, as pessoas riam do que elas mesmas faziam ou contavam. Agora, a
maioria ri do que é oferecido por profissionais do riso, os humoristas. O
riso é uma das mercadorias mais valorizadas da nossa época. O riso vale
muito na bolsa dos valores imateriais da humanidade.
A gargalhada está em extinção. Vai desaparecer antes da ararinha azul
e dos armadores de cabeça erguida. Um processo de adestramento vem
eliminando a gargalhada dos espaços públicos. Europeus raramente soltam
uma gargalhada num restaurante. Há quem considere a gargalhada tão
grosseira quanto soltar pum. Pessoas elegantes apostam em “felicidade
sóbria”, “satisfação frugal” e “slow life”. A gargalhada é vista como
uma aceleração descabida. Alguns desses dados podem ser encontrados em
“Da leveza”, livro de Gilles Lipovetsky sobre a verdadeira luta de
classes do século XXI, o combate mortal entre leves e pesados, leveza e
profundidade, lúdico e chatice. Eis o paradoxo: ri-se menos na era da
leveza. Paga-se para rir. Rir tem preço. O preço da leveza.
Ri melhor quem ri mais. O Brasil pode explorar a indústria do riso.
Europeus, no futuro próximo, pagarão qualquer coisa para rir até chorar.
O riso aparentemente espontâneo voltará a ser valorizado, em oposição
ao riso industrializado. Rir faz bem à saúde. Rir é o melhor remédio.
Foi encontrado um europeu que só ri de economistas. O economista A
defende o desenvolvimentismo e o fim da austeridade. O economista B
defende o Estado mínimo e controle fiscal rigoroso. O político A segue o
economista A. Dá errado. O político B segue o economista B. Dá errado.
Ambos garantem que fazem ciência. O grego ria para não chorar. Cansou.
Quer soluções mais sérias.
As sociedade vão se dividir em sociedades que riem muito, pouco ou nada. O riso é o capital do século XXI. Não achou graça?
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* Sociólogo. Escritor. Tradutor. Prof. universitário.
Fonte:Correio do Povo online, 10/02/2015
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