Samanta Obadia*
Por que, com tanta informação, nossos jovens ainda cedem à armadilha das drogas e do álcool?
Esse tema, tão comum e discutido em escolas, na mídia e na sociedade, parece não se esgotar, e, se ele retorna, continuamente, é porque há algo que ainda não compreendemos.
A questão é mais profunda do que pensamos. Estamos todos envolvidos, como jovens, pais ou educadores, numa rede de interesses que supera a simples questão do consumo das drogas lícitas e ilícitas.
Droga: como a própria palavra sugere, é algo ruim, nocivo. Até mesmo os remédios usados com objetivos específicos de cura carregam este nome para nos lembrar que é uma droga, ou seja, algo que não deve ser usado à revelia, mas deve ser indicado com cuidado por um médico. Aliás, o uso de remédios aumentou substancialmente, nas últimas décadas, o que contribui para descaracterizar o perigo de seu uso. Tal banalização, estimulada pela indústria farmacêutica, agrava, indiretamente, a relação sem escrúpulos da sociedade, principalmente dos jovens, com as drogas alucinógenas.
Para agravar esta realidade, a rede de interesses no negócio das drogas é inquestionável e engloba desde empresários, classe alta e média até jovens e crianças de baixa renda e sem instrução.
Há algumas décadas, criamos nossos filhos rodeados de elementos químicos, que, na maioria das vezes, são ministrados sem controle, como no caso dos alimentos enlatados, com corantes e agrotóxicos, ou ainda com suplementos e tantos remédios.
Esta é uma atitude cotidiana muito estimulada pela mídia, que vende a ideia de que não vivemos sem determinadas substâncias, o que nos leva ao consumo exacerbado de produtos cada vez mais "milagrosos e imprescindíveis" para a nossa saúde.
O organismo humano, a cada dia que passa, a cada alimento ingerido com agrotóxico, a cada substância com adoçante artificial e a cada enlatado consumido, tem o seu paladar alterado e vicia os seus cinco sentidos em cores berrantes, pacotes coloridos e fortes sabores distorcidos.
Sabemos que estes elementos químicos danificam alguns órgãos do nosso corpo, o que nos leva ao consumo de outros elementos protetores, remédios paliativos e novos sabores pelo simples prazer sensorial, sem os necessários benefícios físicos.
As crianças crescem e se acostumam a esse paladar produzido, perdendo a delicadeza do olfato, imerso em cheiros fortes e misturados.
Produzimos em nossos filhos uma necessidade química e uma tolerância perigosa em relação a estes elementos consumidos, desde a infância. Esse costume, aparentemente inofensivo, abre possibilidades para o uso de várias substâncias nocivas, difundidas pela propaganda. Mesmo medicamentos com rótulos onde há o alerta de uso sob prescrição médica, são adquiridos livremente nas prateleiras das farmácias.
Ora, se a pessoa adquire o remédio facilmente, se estiver com dor, será que vai esperar ir ao médico para depois fazer uso do remédio que já tem em casa ou que vai usar imediatamente?
O enredo é tão complexo que, para retirar agrotóxicos da fruta, dos legumes e das verduras há um comprimido que se dissolve na água para purificá-los e torná-los próprios ao consumo, isto é, usar a química para purificar o alimento contaminado pelo próprio homem. Um círculo vicioso já assimilado pela sociedade...
Criamos uma sociedade que faz uso de drogas, diariamente, desde o adoçante aos "inofensivos" remédios contra a gripe. O fundamental é que perdemos a noção do perigo que isto representa, pois, aos poucos, as crianças e os jovens passam a aceitar o uso destes elementos químicos como algo normal e até mesmo como algo indicado. Subliminarmente e/ou sem controle, o ser humano vai se transformando em um poço de desejos consumistas alucinados.
O proibido é sempre uma tentação para o ser humano: lidar com o desejo é difícil; é preciso amadurecer, ponderar, discernir. Na juventude, tudo se agrava, porque o proibido lhe interessa naturalmente. É preciso, porém, evitar um discurso a favor da rebeldia sem propósito, com destino aos alucinógenos, pelo simples prazer de fuga de seus medos e angústias. Deixemos que os jovens saibam que os medos e as angústias sempre existirão e que, quanto mais cedo aprenderem a conhecê-los, mais chances têm de superá-los.
Droga! Não podemos esquecer o significado desta palavra. Algo que não combina com organismo vivo, com corpo humano, com respeito à vida.
É preciso reacender os verdadeiros valores e princípios éticos no coração dos seres humanos, reordenar as prioridades e retomar a solidariedade entre nós, a fim de preenchermos de sentido a existência humana.
*Filósofa e psicanalista
Jornal do Brasil - Segunda-feira, 15 de Junho de 2009 - 00:00
http://jbonline.terra.com.br/leiajb/noticias/2009/06/15/sociedadeaberta/uma_reflexao_necessaria.asp
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