RUBEM ALVES*
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O gesto delicado da jovem sorridente confirmava que minha idade
não era mais a melhor idade
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RECAPITULANDO... Homem maduro, músculos firmes... Era, sem dúvida, a minha melhor idade. Entrei no metrô, vagão lotado, segurei-me num balaústre, confiante em mim mesmo, olhei em volta. Uma jovem de uns 25 anos me olhava sorridente confirmando que aquela era minha melhor idade.
Foi então que a jovem que confirmava minha melhor idade com o seu sorriso levantou-se e me ofereceu o seu lugar. Fiz o resto da viagem assentado, olhando fixamente para a sua bolsa à altura do meu nariz porque tinha vergonha de olhar diretamente para o seu rosto.
O seu gesto delicado me disse que minha idade não era a melhor idade. Daí para a frente as confirmações foram se sucedendo, lembrando-me de que a minha idade não era a melhor idade.
Na festa de aniversário da minha nora, eu tranquilamente assentado no jardim, vem uma senhora na melhor idade dela para me cumprimentar, percebo, dou o impulso para me levantar e abraçá-la. Ela, no entanto, delicada como a moça do metrô, me fez lembrar que a minha idade não era a melhor idade para me levantar.
Com uma voz carinhosa me disse: "Não se levante. Fique sentadinho aí..." "Sentadinho" diminutivo, dizia coisa muito grande: sua idade é a pior idade... Se eu fosse um jovem, ela não teria usado o diminutivo dessa forma.
Mas agora a situação se agravou. Agora são senhoras matronais que me oferecem lugar na fila do supermercado e os senhores já não tão jovens que se oferecem para nos ajudar a atravessar a rua segurando-nos pelo braço.... Todos esses gestos gentis revelam que aqueles que nos oferecem o lugar na fila, que colocam a mão no nosso ombro para nos manter sentadinhos ou nos ajudam a atravessar a rua (velho não olha para os dois lados para ver se um carro vem vindo) sabem a verdade óbvia: nossa idade não é a melhor idade.
Disse que todos sabem! Errei! As companhias aéreas nos aeroportos não sabem. Elas nos chamam para o embarque dizendo que a nossa é a melhor idade: idade do reumatismo, da careca, da bengala, dos músculos flácidos, dos ouvidos surdos, dos corpos segregados do amor... Eles acreditam mesmo que a nossa é a melhor idade? Não. Mentem.
Seria tão bom se parassem de nos ofender e passassem a ler as Sagradas Escrituras!
"Lembra-te do teu Criador nos dias da tua mocidade, antes que venham os maus dias e cheguem os anos em que dirás: Não tenho neles prazer.
Antes que se escureçam o sol, a lua e as estrelas, luzes da tua vida, e tornem a vir as nuvens depois do aguaceiro.
No dia em que tremerem os guardas da casa, os teus braços, e se curvarem os homens outrora fortes, as tuas pernas, e se cerrarem as janelas, os teus olhos, e os teus lábios se fecharem: o dia em que não puderes falar em voz alta, quando tiveres medo do que é alto, e te espantares no caminho, e o teu cabelo ficar branco, e um simples gafanhoto for muito peso para tuas forças, porque vais para a casa eterna...
Antes que se rompa o fio de prata, e se despedace o copo de ouro, e se quebre o cântaro junto à fonte, e o pó volte à terra e o sopro da vida volte a Deus, que o soprou."
Brumas e espumas.
Tudo são brumas e espumas..."
_________________________*Teólogo. Educador. Escritor.
Fonte: Folha online, 07/09/2010
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