Mauro Santayana*
Quando os homens se tornaram eretos, a visão dos horizontes os impeliu a caminharem sempre em frente. Adiante, no desconhecido, há surpresas, aventuras, alguma coisa que faz a vida mais agradável ou mais plena. Sendo uma astúcia ótica, a linha, que segue adiante, quando a buscamos, é apenas uma referência no espaço. Nada nos pode garantir que ela nos possa servir a glória, ou a fortuna.
Os campos petrolíferos do Oriente Médio têm sido horizonte norte-americano desde a Primeira Guerra Mundial. Ontem, com a retirada de grande parte das tropas enviadas por Bush ao Iraque, o horizonte se abateu, mas não definitivamente. É certo que os norte-americanos, cerrada a passagem do Iraque, como se vedará, em breve, a do Afeganistão, irão usar outras armas para o domínio da região.
Milhares e milhares de pessoas, entre elas, soldados invasores, morreram e se tornaram inválidas, para que, depois de tantos anos, os estrategistas se convencessem de que o horizonte era ilusório. Enfim, lutaram, mataram, chacinaram, morreram, para nada. Deixam o Iraque levando como troféu a miserável glória de terem mandado enforcar Saddam Hussein, e deixando no país a perspectiva de um acerto de contas brutal entre sunitas, xiitas e curdos.
Na linha do horizonte abrem-se as miragens, com seus lagos sedutores. Nela, como na bela descoberta de El Greco, a perspectiva se altera, para que todas as coisas pareçam maiores. Dois jovens mineiros – se outros não houver entre os mortos de San Fernando – abandonaram os horizontes próximos, mais seguros, e, iludidos pelo sonho americano, ouviram o canto dos traficantes de ilusões. Viram o mundo desabar, antes mesmo de pisarem a terra que lhes prometeram. Talvez não conhecessem a advertência de Vicente de Carvalho, de que a árvore da felicidade deve ser posta onde nós estamos, e não alhures.
Mais triste ainda é a saga dos rapazes do Maranhão, levados a prostituir-se na Espanha. Havia horizontes promissores mais próximos, nas novas fronteiras econômicas de um Brasil que cresce, mesmo no Norte e Nordeste. Eles se deixaram iludir pelas distorções da perspectiva, e viram na Europa o seu futuro. Talvez, ao voltarem ao Brasil, a vergonha os impeça de retornar às suas cidades, às suas famílias, aos seus amigos. É provável que, no regresso, descubram o imenso e fascinante mundo de oportunidades de trabalho, empreendedorismo e aventuras, que a pródiga diversidade do Brasil guarda para os que nele quiserem plantar suas esperanças.
Não se menospreze a grande revolução que o Brasil vive, neste momento. Descobrimos, ainda a tempo, que o mercado mais seguro é o interno, e que, sem empregos e salários, não há o necessário consumo que o crie. Ainda continuamos sendo um dos países de maior desigualdade social no mundo, mas o pouco de renda que se redistribuiu, nos últimos oito anos, já alimenta o processo de revolução social que estamos vivendo.
Ao combater, com êxito, a fome – a partir da política emergencial da ajuda direta aos mais pobres – o Estado abriu o caminho da esperança aos marginalizados em toda a história do país. Como lembrou, há mais de 40 anos, o jornalista Franklin de Oliveira, nascido no Maranhão, não é o desespero que faz as grandes revoluções mas, sim, a esperança. A esperança da dignidade, em primeiro lugar. Essa revolução se encontra em marcha, e ninguém será capaz de interrompê-la, como fizeram em 1954 e em 1964. E em 1995, com a adesão do governo ao famigerado Consenso de Washington.
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* Jornalista
Fonte: JB online, 02/09/2010
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