quinta-feira, 7 de março de 2019

50 chances



Guy Perelmuter*
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 A natureza e seus limites sendo testados pela tecnologia

O PhD em Filosofia pela Universidade de Cambridge, Stephen Cave, publicou em 2012 o livro “Immortality: The Quest to Live Forever and How It Drives Civilization” (em português, algo como “Imortalidade: a busca pela vida eterna e como ela conduz a civilização”). Nele, o autor argumenta que cada civilização pode ser caracterizada por diversas tecnologias cujo objetivo visa aumentar a duração da vida humana: a agricultura para garantir alimentos durante o ano todo, as roupas para proteger as pessoas do frio, a engenharia para fornecer abrigo, as armas para caça e defesa, e remédios para combater ferimentos e doenças. De fato, este raciocínio leva à conclusão que não são apenas as indústrias farmacêuticas, hospitalar e de equipamentos médicos que possuem como principal finalidade a manutenção de nossa saúde. 

O progresso científico permitiu que a Medicina – existente de alguma forma desde a Pré-História, passando pelo Egito Antigo, Babilônia, Índia, China, Grécia e Roma – alcançasse feitos extraordinários, reduzindo o sofrimento e melhorando a qualidade de vida da sociedade de forma geral. O estado atual da ciência médica é fruto de séculos de avanços tecnológicos, com a criação dos primeiros hospitais no século IV, o entendimento da anatomia humana, o desenvolvimento de vacinas e da anestesia, a construção de equipamentos para visualizar o interior do corpo humano, a compreensão dos mecanismos de doenças degenerativas, os transplantes de órgãos e o mapeamento do código genético. 

Nossa caminhada rumo a uma expectativa de vida crescente movimenta trilhões de dólares em pesquisas, diagnósticos, procedimentos médicos, equipamentos e remédios – e agora a longevidade assume um papel de protagonista em centros de pesquisa, universidades e empresas privadas ao redor do mundo. Do Instituto Buck, fundado em 1999 como a primeira instituição de pesquisa privada com foco exclusivo no envelhecimento, passando pela Clínica Mayo fundada em 1889 e pela Calico (California Life Company, ou Companhia de Vida da Califórnia) fundada pela Google em 2013, nunca se pesquisou tanto sobre como envelhecemos e como podemos tentar retardar este processo. 
 
Uma das principais linhas de pesquisa atualmente está ligada à senescência (do latim, senescere, ou literalmente, “envelhecer”) celular, que foi comprovada em experimentos nos primeiros anos da década de 1960 por Leonard Hayflick (da Escola de Medicina da Universidade da Califórnia em San Francisco e da Escola de Medicina da Universidade de Stanford) e Paul Moorhead (da Escola de Medicina da Universidade da  Pensilvânia). Eles descobriram o que ficou conhecido como o “limite de Hayflick”: uma célula humana normal pode se dividir e, portanto, se renovar, cerca de 50 vezes. Este fenômeno não ocorre com todas as células do corpo: neurônios, células musculares cardíacas e células receptoras da retina são alguns exemplos de células que não passam por esse processo de divisão (chamado de mitose). 

Uma célula torna-se senescente – ou seja, perde a capacidade de se replicar – quando a parte final de seu DNA (conhecida como telômero, uma sequência de bases repetidas que evita que um cromossomo se misture com seu vizinho) torna-se curta demais. As únicas células que realizam a mitose e cujos telômeros não se tornam menores a cada ciclo são as células cancerígenas, ao passo que as outras perdem sua capacidade de replicação ao atingirem o limite de Hayflick. 

De fato, produzimos células cancerosas frequentemente. Simplificando a questão, quando isso ocorre em um organismo saudável, as células vizinhas emitem substâncias que disparam o processo de remoção dessas estruturas indesejáveis. Entretanto, à medida em que o processo de envelhecimento avança, as células senescentes enviam este sinal de que “há algo errado” frequentemente, gerando inflamações constantes, que por sua vez podem responder por diversas doenças associadas à degeneração e à passagem do tempo: Alzheimer, artrite e problemas cardíacos, por exemplo. Os cientistas acreditam que, se conseguirem evitar que esses “sinais” errados sejam enviados pelas células senescentes, uma série de problemas crônicos associados com o envelhecimento poderão ser reduzidos de forma significativa. Com os investimentos em pesquisas com células-tronco, que podem se transformar como virtualmente qualquer tipo de tecido, é possível imaginar a constante elaboração de tecidos saudáveis que podem ser impressos em 3D e transplantados para o paciente, retardando o processo de senescência celular. 

A promessa de uma vida longa o bastante para bilhões de pessoas tem consequências econômicas, políticas, sociais e geográficas. Em um mundo onde a expectativa de vida vem aumentando sistematicamente e onde a sociedade moderna segue causando danos potencialmente irreversíveis para o meio ambiente, a exploração do espaço começa a ganhar relevância estratégica para os negócios e para própria sobrevivência da raça humana. Este será nosso tema para próxima coluna. Até lá. 
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* Guy Perelmuter é fundador da GRIDS Capital, Engenheiro de Computação e Mestre em Inteligência Artificial. Publica neste espaço toda primeira quinta-feira do mês
Fonte:  https://economia.estadao.com.br/colunas/guy-perelmuter 07/03/2019
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