Domenico Agasso Jr – 22 Março 2019 – Foto: Eli B / Flickr
“Francisco procura retomar com vigor o caminho da reforma eclesial, iniciada por Paulo VI e que depois daquele pontificado conheceu uma perda de intensidade e direção até o gesto decisivo e marcante da renúncia de Bento XVI“, afirma ao Vatican Insider o sociólogo Luca Diotallevi, autor do livro “Il paradosso di Papa Francesco, la secolarizzazione tra boom religioso e crisi del cristianesimo” .
Diotallevi, professor de sociologia na Universidade de Roma Tre, já colocou em discussão algumas aquisições tradicionais da sociologia religiosa em
ensaios como “A ordem imperfeita, modernização, estado, secularização” e
“Fim da corrida, a crise do cristianismo como religião confessional”.
A reportagem é de Domenico Agasso Jr., publicada por Vatican Insider, 03-03-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
O novo livro começa com uma pergunta: “Como é possível que o Papa tenha sucesso e a Igreja católica esteja em crise?”
O professor Diotallevi imediatamente deixa claro que o seu é o texto de um sociólogo, que tenta se manter fora do conflito entre paixões e “partidos”, que não quer entrar nas controvérsias a favor ou contra Francisco.
A divergência das sortes das duas realidades (Papa e Igreja) exige que a sociologia compreenda, segundo Diotallevi,
Na sociedade atual, as grandes organizações têm enormes problemas. Quanto mais uma realidade social quer ser grande, mais ela deve ser “feita” por muitas organizações, muitas instituições, muita cultura, e assim por diante, porém não podem ser colocadas aleatoriamente lado a lado para buscar sua própria vantagem. Os paladinos da velha Igreja não querem e talvez nem mesmo entendam isso. O Vaticano II e Paulo VI, precisamente afundando suas próprias raízes em toda a tradição da Igreja e não só naquela dos últimos séculos, tinham encontrado ideias para aceitar esse desafio. Tudo isso e o paradoxo de Francisco, que não pode ser explicado à luz da teoria clássica da secularização.
Agora, porém, no período que vai desde a morte de Paulo VI até a renúncia de Joseph Ratzinger e à eleição de Francisco
A encruzilhada é aquela entre
O professor Diotallevi imediatamente deixa claro que o seu é o texto de um sociólogo, que tenta se manter fora do conflito entre paixões e “partidos”, que não quer entrar nas controvérsias a favor ou contra Francisco.
“O fato aparentemente paradoxal é que neste momento o papa tem sucesso e a Igreja está em dificuldades – observa Diotallevi. Se nos projetarmos de volta aos anos 1950, à Igreja de Pio XII e àquela sociedade, uma situação como a atual era impensável. Na época do papa Pacelli, se o Papa ia bem, a Igreja estava bem, se o papa ia mal, a Igreja também ia mal.
Seria como dizer que o carro
obrigatoriamente tinha que seguir reto se o motorista estava bem e, ao
contrário, inevitavelmente derrapava se quem dirigia estava mal. Hoje as
coisas não são mais assim. O que aconteceu?”
A divergência das sortes das duas realidades (Papa e Igreja) exige que a sociologia compreenda, segundo Diotallevi,
“um fenômeno que é paradoxal e que nunca antes tivemos que enfrentar”. E, o autor especifica, “o paradoxo de que fala o título do livro não diz respeito à pessoa do Papa Bergoglio, mas reflete as dinâmicas que ocorrem neste tempo”.
Livro da Diotalevi: O paradoxo do Papa Francisco, a secularização entre o boom religioso
e a crise do cristianismo / Rubbettino Editore
Na sociedade atual, as grandes organizações têm enormes problemas. Quanto mais uma realidade social quer ser grande, mais ela deve ser “feita” por muitas organizações, muitas instituições, muita cultura, e assim por diante, porém não podem ser colocadas aleatoriamente lado a lado para buscar sua própria vantagem. Os paladinos da velha Igreja não querem e talvez nem mesmo entendam isso. O Vaticano II e Paulo VI, precisamente afundando suas próprias raízes em toda a tradição da Igreja e não só naquela dos últimos séculos, tinham encontrado ideias para aceitar esse desafio. Tudo isso e o paradoxo de Francisco, que não pode ser explicado à luz da teoria clássica da secularização.
Depois do Concílio Vaticano II, a Igreja havia assumido com Paulo VI,“um caminho de renovação profética que previa vários custos, mas tinha um grande futuro” – Tweet
“Precisamos de uma reflexão crítica sobre aquela teoria e uma nova compreensão do processo de secularização”, destaca Diotallevi. “Nos dois primeiros capítulos do livro, pouco se fala de Francisco e se trata de autores e fenômenos que mantêm relação entre religião e modernidade hoje.”
Depois do Concílio Vaticano II, a Igreja havia assumido com Paulo VI, segundo o autor,- “um caminho de renovação profética que previa vários custos, mas tinha um grande futuro”. Então, continua Diotallevi, “nos pontificados sucessivos ao de Paulo VI,
- considerou-se que fosse possível tomar atalhos que garantissem a renovação da Igreja sem ter que pagar os elevados custos que o Concílio e Paulo VI haviam embutido na conta”.
“o testemunho mais sincero e credível de que o caminho dos atalhos era e é impraticável”.
Diotallevi, para o abandono do pontificado por Bento XVI, utiliza uma imagem sugestiva:
“O adeus de Ratzinger ao exercício do ministério petrino é uma brecha da Porta Pia ao
inverso, no sentido de que não são os bersaglieri que derrubam as
muralhas e invadem a Roma da Igreja “papal”, que estava atrasada e em oposição à modernidade, mas é a própria Igreja e o Papa que demolem a partir de dentro os bastiões em que a Igreja tinha se aprisionado”.
Sabemos o quanto Francisco se inspira em Paulo VI, o problema é saber se ele e a Igreja atual estão à altura desse desafio: quando o mar está mais agitado e o nadador mais cansado, tudo fica mais difícil – Tweet
“a modernização avançou muito, enquanto a Igreja perdeu muitas energias”, portanto “aquela renovação que Paulo VI tinha iniciado e que durante quatro décadas foi atrasada ou apenas parcialmente continuada, hoje Francisco se vê obrigado a enfrentar com uma Igreja mais pobre e mais cansada”.
Diotallevi especifica que
“em uma visão de fé, a renovação é sempre possível, mas, vista da perspectiva da sociologia, a tarefa de Francisco é realmente extenuante”.
E acrescenta: “Sabemos o quanto Francisco se inspira em Paulo VI, o problema é saber se ele e a Igreja atual estão à altura desse desafio: quando o mar está mais agitado e o nadador mais cansado, tudo fica mais difícil”.
A secularização é “um processo que continua, não se interromper”, assinala Diotallevi, e
“Francisco não
precisa se ater a saudosas reconquistas de espaços para a Igreja,
inclusive porque, em um mundo tão complexo, ninguém está em condições de
conquistá-lo. A ideia de uma reconquista seria uma loucura sob qualquer
ponto de vista e para qualquer um”.
No máximo, o Papa está diante de uma encruzilhada. O momento atual- “não é o tempo da crise da religião, aliás, está em curso um boom religioso”,
- então “o problema é que a religião que hoje é bem-sucedida é a religião banalizada. O paradoxo de Francisco é uma aparência, é o fruto do presente visto com velhas “lentes”.
- O drama de Francisco é, ao contrário, a encruzilhada dramática diante da qual ele, a Igreja e o cristianismo se encontram”.
O momento atual “não é o tempo da crise da religião, aliás, está em curso um boom religioso”, então “o problema é que a religião que hoje é bem-sucedida é a religião banalizada” – Tweet
- “um cristianismo reduzido a uma religião banal
- ou um cristianismo que preserva sua complexidade e sua adaptabilidade não infinita,
- um cristianismo que mantém a liberdade e a consciência em seu centro”.
“há muito a ser reformado dentro e muito a ser combatido fora”.
Um exemplo, segundo Diotallevi, é a relação entre a Santa Sé e a China.- “Se reduzirmos o cristianismo a uma religião inofensiva, para o cristianismo há espaço também na China.
- Se, por outro lado, não o separamos da liberdade, da justiça e da luta por uma sociedade aberta,
- a relação com um regime como o chinês pode não ser de hostilidade, mas não pode ser de serena aceitação”.
- “Deve-se perseguir toda forma de religião popular ou simplesmente pop,
- ou conservar um cristianismo que não ature qualquer forma de religião
- e especialmente aquelas ‘de baixa intensidade’ hoje tão na moda, mesmo entre os eclesiásticos e na Igreja?”
Domenico Agasso Jr
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