segunda-feira, 28 de julho de 2014

Crises na idade adulta...

José Ramón F. de la Cigoña*
 
A vida adulta tem fases que se não forem bem vivenciadas, podem frustrar. Lembro de um amigo carioca e igrejeiro que, na sabedoria dos seus sessenta anos, dizia-me com picardia: O senhor sabe que já casei três vezes?... Percebendo meu espanto, acrescentou: Três vezes, mas com a mesma mulher!

Numa sociedade hipermoderna como a nossa os pais perdem facilmente os seus referenciais e não desempenham satisfatoriamente o seu papel com os filhos. Com a exacerbação do individualismo, encontramos gerações sem compromisso com a tradição e incapazes de reconhecer o exercício da autoridade. Tudo e em pouco tempo é descartável!

O Qohélet, aquele pregador do Antigo Testamento que viveu crise semelhante, quando a cultura grega invadiu a fé judia, dizia: “Tudo tem o seu momento e cada coisa o seu tempo...” Este homem pessimista viu desmoronar por todo lado os valores que pregara e praticara.

Toda autoridade seja política, familiar ou Transcendente, não é bem aceita. Somos muito individualistas! As pessoas se sentem livres, mas lhes faltam códigos validos que facilitem a convivência. Quando tudo é valido, então nada é importante.

Dividamos a vida adulta em 3 fases. Em qual delas você se encontra e como a vive?

· Vida adulta jovem (20 a 40 anos)

· Vida adulta média (40 a 65 anos)

· Vida adulta avançada (65 em diante)

Como você define sua idade? Partilha com alguém a sua intimidade?... Na idade adulta, cada fase tem sua especificidade positiva e negativa. Lembra dos “três casamentos” do meu amigo carioca? Finalizou uma fase? Comece outra!

Quando jovem você sonhou com uma felicidade completa, que provavelmente ficou distante e inalcançável. Dificuldades encontradas, relacionamentos frustrados trouxeram cansaço e decepção.

Lembro da tristeza de um pai ao me confidenciar que os filhos não o amavam! 

Nesse meio-dia realístico da vida, quando a luz é mais intensa e o conhecimento mais objetivo, precisamos de novas formas de relacionamento, para que o encantamento não termine.

1. Primeira fase da vida adulta (dos 20 aos 40 anos aproximadamente). Quando começa a fase adulta: No casamento?... Quando se tem um trabalho bem remunerado?... Não há um tempo certo nem um rito próprio que indiquem o início desta etapa: Uns a antecipam; outros a postergam, mas para muitos ela começa quando se deixa o lar familiar.

Esta primeira fase da vida adulta é a de tomar decisões. As fantasias se burilam com os relacionamentos reais e, estes desafiam e educam. É tempo de buscas, discernimento e decisão. Momento de paixão e encantamento. Tempo de felicidade e força vital que permitem o risco e a tomada de decisões importantes: “Com quem estarei e partilharei a minha vida?...” Surge o peso da responsabilidade familiar e profissional, pois algumas escolhas são para o resto da vida!

As crianças nunca tomam decisões importantes, pois outros o fazem por elas. O adulto, pelo contrário, define o que e como fazer ou as circunstâncias, por desgraça, o farão por ele. Os compromissos de matrimônio ou de vida consagrada se concretizam. Nesta fase somos capazes de abraçar por inteiro uma vocação, uma causa ou uma pessoa, pois somos movidos pelo Amor.

Aprendemos muito, com o passar do tempo e alguns sofrimentos. Descobrimos que as pessoas nem sempre são maravilhosas e que os relacionamentos, muitas vezes, não suportam o desgaste do tempo.

 Os conflitos surgem e por vezes fazem duvidar. Incompreensão, abandono ou traição fazem parte da vida de alguns. Estupidamente desencantamos e, de repente voltamos a nos encantar. As feridas dos relacionamentos frustrados se curam quando o amor e a compreensão voltam a renascer.

2. Idade adulta média (dos 40 aos 65 anos). Nesta fase, o tempo passa com maior rapidez. A vida, provavelmente, não foi como a sonhamos. Será que o marido se parece mais com o príncipe encantado ou com aquele sapo nojento dos contos de fadas? E a esposa será que é aquela mulher maravilha sedutora e encantadora ou uma simples cinderela a serviço da casa? A realidade é bem mais pobre do que a fantasia, contudo o viver sem máscaras possibilita uma maior intimidade. Dizia-me uma velha senhora: Os desamores só se curam com outros amores!

A realidade se impõe. Crises e decepções surgem por toda parte e os entendidos a definem como “Idade da loba” ou “Crise do demônio meridiano”. Provavelmente, os valores religiosos de outrora foram deixados de lado ou, quem sabe, se purificaram. É tempo de crescimento!

Se na primeira metade da vida nos preocupamos sobre tudo pelo mundo exterior (profissão, moradia, etc.) nesta outra metade nos orientamos mais para o mundo interior, buscando maior qualidade nos relacionamentos e significados verdadeiros naquilo que somos e fazemos.

Nessa fase nada parece extraordinário ou maravilhoso, contudo é na constância que o importante se consolida e o transitório desaparece.

Quando se chega aos 40 anos, os preconceitos ficaram mais objetivos. Sabemos quão frágil é a amizade e pesada a solidão! É tempo de se reconciliar com a vida, pois nada é eterno... Quem tem fé provavelmente enfrenta melhor a morte de seres queridos.

3. Vida adulta avançada (dos 65 anos em diante...). Entramos na Terceira Idade com a consciência de que “não podemos viver o entardecer da vida com o programa do amanhecer”. A aposentadoria permite se centrar mais nos relacionamentos significativos familiares e sociais. A vida saudável e os exames médicos retrasaram positivamente os efeitos negativos desta fase.
Uma das experiências mais completas da vida adulta é a de ser dono do próprio nariz. Contudo, essa plenitude experi6encia é novamente confrontada com os contratempos que aparecem.
A idade adulta avançada é uma oportunidade para lembrar e nomear com carinho e gratidão as nossas perdas. Muitas coisas e pessoas foram ficando pelo caminho! Essa memória histórica cura velhas feridas e sentimentos do passado. Viver positivamente o presente, liberta de culpas passadas. A terceira idade é a melhor idade para experimentar a ternura e a compaixão. “No entardecer da vida seremos julgados sobre o amor...”

Algumas perguntas: 1. Como mudaram suas respostas às grandes perguntas com o decorrer dos anos? 2. Você realmente cortou o cordão umbilical ou ainda está preso a coisas e pessoas do passado? 3. Há perdas inevitáveis “necessárias” e outras “desnecessárias”... Como você elaborou as primeiras e se enrolou nas últimas?
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* Nasceu em Vigo, Espanha em 01/AGO/1942. Estudou no Colégio Apóstol Santiago/Vigo. Aos 22 anos foi para o Brasil como jesuíta. Estudou: Filosofia e Pedagogia em São Paulo, e Teologia em Roma. É sacerdote desde 1972. Naturalizou-se brasileiro em 1989. Hobbies: Ler e escrever.
Fonte:  http://blogs.periodistadigital.com/terra-boa.php/2013/12/18/acerca-de-jose-ramon-f-de-la-cigona

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