FÁBIO TOLEDO*
Em campanha publicitária de preservativos, veiculada na África do
Sul, bebês gigantes são apresentados como grandes vilões. Eles destroem
escritórios, esmagam carros de luxo e acabam com as férias dos pais. Os
anúncios trazem ainda como slogan uma frase de impacto: “Proteja seus
sonhos”. Mas será que os filhos são ou podem se transformar em meros
destruidores de sonhos?
Se essa campanha publicitária tem algo de positivo é a coragem e a
ousadia de expor de maneira contundente aquilo que muitos pensam mas não
ousam dizer tão claramente. De fato, as crianças são vistas muitas
vezes como um empecilho para se poder galgar uma carreira profissional
atraente, fazer viagens, ter carros do ano etc.
No entanto, a decisão de ter ou não filhos é uma das mais relevantes em nossas vidas. Por isso, penso que a questão não pode ser analisada superficialmente. Ao contrário, essa opção deve ser coerente com a concepção de vida assumida.
No entanto, a decisão de ter ou não filhos é uma das mais relevantes em nossas vidas. Por isso, penso que a questão não pode ser analisada superficialmente. Ao contrário, essa opção deve ser coerente com a concepção de vida assumida.
Convém, portanto, retomar aqueles grandes questionamentos que tocam
na razão mais profunda da nossa existência: quem sou eu? De onde vim?
Para onde vou? Qual é o sentido desta vida?
Acontece que, por não termos ou por temermos a resposta a esses
questionamentos, é comum abafá-los, calando essa voz interior que, no
entanto, vez por outra insiste em nos incomodar. E a maneira que
frequentemente encontramos para não enfrentar essa questão de fundo é
perdermo-nos em sonhos, no mais das vezes irreais e que não saciam a
ânsia de felicidade e eternidade que inunda o coração humano. E é assim
que construímos o protótipo de felicidade sobre o ter (carros etc.) e o
fazer (viajar, comprar etc.) e não no ser (pai, mãe, cidadãos e
trabalhadores honrados etc.).
Já se afirmou — e na minha opinião com razão — que a procriação é
uma necessidade da espécie e não do indivíduo. De fato, não são todas as
mulheres e todos os homens chamados à maternidade ou à paternidade. Mas
cada ser humano vem a essa existência com uma missão. E essa se traduz
sempre em algo de bom a ser realizado no mundo em favor ou outro, da
sociedade em que está inserido e da própria humanidade.
Não há absolutamente nenhuma vida humana lançada à própria sorte ou
relegada a viver sem sentido. Ninguém nasce com a missão de “curtir a
vida”. É evidente que há muitas coisas boas no mundo que podem
legitimamente ser desfrutadas. O grande erro e a grande tragédia humana,
porém, está em colocar nisso toda a esperança de felicidade.
Há muitas pessoas que renunciam à maternidade e à paternidade e o
fazem por saberem chamados a uma missão especial e sublime. A história
da humanidade e o nosso tempo é repleto de exemplos disso. E então
experimentam a felicidade profunda e verdadeira de quem encontrou um
sentido para a sua existência. Alguém conseguiria, por exemplo,
encontrar mais paz e alegria do que se vislumbrava abundantemente na
face serena da Madre Teresa de Calcutá?
Outras pessoas, porém, decidem exercer a maternidade e a
paternidade livremente. Também isso é fonte de imensa felicidade e
alegria, ainda que não poucos sejam os dissabores e as preocupações.
Não há sonhos e anseios de felicidade verdadeiros que possam ser
destruídos pelos filhos. De fato, a maternidade e a paternidade é
incompatível com o egoísmo, com o comodismo e com o hedonismo. No
entanto, pode-se viajar com eles, pode-se obter sucesso profissional por
eles, pode-se desfrutar dos bens deste mundo sobriamente com eles. Além
disso, ao fim de uma vida fecunda e bem vivida, poderemos dizer
realizados: “Tive filhos. Transmiti a muitas criaturas o legado do nosso
amor e da nossa esperança”.
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* Fábio Henrique Prado de Toledo é Juiz de Direito em Campinas. Bacharel
em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. E-mail: fabiohtoledo@gmail.com
Fonte: Correio Popular online, 27/07/2014
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