Alan Levinovitz - filósofo
Como transformaram alimentos em um indicador de superioridade moral
Chesterton dizia que o problema não era deixar de acreditar em Deus, e sim o que colocariam
nesse lugar. De fato, quando olhamos para as seitas religiosas
modernas, entendemos sua preocupação: milhões de pessoas são
moderninhas, vanguardistas, esclarecidas demais para acreditar em Papai
do Céu. Tudo bem. Mas em que elas acreditam? Muitas criaram verdadeiras
religiões de onde menos se espera. Os alimentos, por exemplo.
Há inúmeros modismos alimentares por aí.
Mas em certos casos, não estamos mais falando apenas de modismos, e sim
de seita religiosa mesmo. Se o outro não compartilha de sua visão
alimentar, então só pode ser um bárbaro, um herege, um pecador. Como
ousa não ser um vegano? Como pode comer algum produto que leva
agrotóxicos? E por aí vai.
Em entrevista às páginas amarelas da VEJA
desta semana, o professor de religião e filosofia na Universidade James
Madison, Alan Levinovitz, fala sobre esse componente de fé nos hábitos
alimentares modernos. Ele pesquisou por dois anos o assunto, e concluiu
que muitos embarcaram nessas seitas alimentares para se sentir seres
humanos melhores, superiores, a típica sedução de muitas crenças
religiosas. Diz ele:
Como negar a paranoia que tomou conta de
tantas vidas em relação ao que se come? Como fingir que isso não se
tornou uma verdadeira doença, escravizando essas vítimas de forma
impressionante? Os alimentos, numa época de busca obcecada pela “vida
eterna” aqui mesmo, já que a outra foi para o beleléu, tornaram-se como
remédios purificadores. O prazer de desfrutar de uma boa comida com os
amigos sem tanta culpa se perde a cada dia. Os alimentos ingeridos
passaram a representar a identidade de cada um. Não é estranho? E claro,
toda seita tem seus gurus:
Um paralelo que pode parecer sem sentido à
primeira vista, mas que depois começa a se tornar mais claro é o ataque
que tais seitas costumam fazer ao capitalismo. Sim, da mesma forma que o
ambientalismo se transformou em ecoterrorismo e passou a demonizar o
capitalismo, o simples hábito alimentar de muitos passou a ser uma forma
de protesto contra o “sistema”, contra as “grandes empresas” que só
querem lucrar. Levinovitz reconhece o fenômeno:
Pois é, caro leitor, você não vai
“condenar o sistema” só porque cortou carne de seu cardápio, tampouco é
uma pessoa moralmente superior só por comer comida orgânica. Bons eram
os tempos em que um bife era apenas um bife, algo gostoso e que ainda
oferecia proteína para as pessoas. O Jardim do Éden não era uma
maravilha e ser um coletor de frutos não deve ser nada legal. Talvez
tenha chegado o momento de questionar certas crenças, e se perguntar se
não houve exageros em relação ao que se coloca no prato, algo que
deveria ser apenas gostoso e nutritivo.
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Reportagem Por Rodrigo Constantino
Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/rodrigo-constantino/religiao/modismo-alimentar-ou-seita-religiosa/
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