quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Bebês de 15 meses têm senso de justiça

Crianças tendiam a ficar surpresas
quando presenciavam divisão desigual de biscoitos
ou leite entre dois adultos

Os pequenos que mais se 'chocavam'
com a 'injustiça' tinham mais tendência
a dividir um brinquedo com outros


Pais que sofrem para impedir que seu bebê arranque brinquedos das mãos dos amiguinhos podem não acreditar, mas crianças de apenas 15 meses já parecem ter um senso rudimentar de justiça, afirma um novo estudo.

Experimentos feitos com cerca de 50 crianças na Universidade de Washington, em Seattle (Costa Oeste dos EUA), mostraram que os pequenos ficam "chocados" quando presenciam uma divisão desigual de guloseimas. E, apesar do berreiro que às vezes acontece quando bebês disputam brinquedos, as crianças do estudo, em quase dois terços dos testes, topavam dividir os seus com adultos desconhecidos.

Publicada na revista científica de acesso livre "PLoS One" (www.plosone.org), a pesquisa se junta a uma série de trabalhos recentes que indicam a existência de um instinto moral aguçado nos filhotes da nossa espécie.

PRECOCE

Aliás, o estudo atual é o que revela evidências de comportamento "ético" mais cedo no desenvolvimento humano -os trabalhos anteriores só tinham demonstrado isso em meninos e meninas de dois anos de idade. Um resumo do design experimental usado pelos psicólogos Marco Schmidt e Jessica Sommerville, autores do estudo, pode ser visto no infográfico acima.

Sempre no colo de um dos pais, para ficarem relaxados, os bebês primeiro assistiam a vídeos que mostravam a divisão igualitária ou desigual de comida (biscoitos ou leite) entre dois adultos.

Como os talentos linguísticos das crianças dessa idade ainda são limitados, os psicólogos usavam algo mais simples para saber o que os bebês tinham achado dos vídeos: o tempo que eles gastavam olhando para a tela.

Trata-se de uma ferramenta já estabelecida em outros estudos do tipo. Em geral, quanto mais uma situação surpreende os bebês, mais tempo eles ficam olhando para a cena. E, nesse caso, em média, a cena em que a divisão é desigual surpreendeu bem mais os pequenos. Depois, os mesmos bebês podiam escolher entre dois brinquedos, ambos ofertados por um pesquisador que eles já conheciam. O cientista esperava a criança escolher seu brinquedo favorito e, depois, deixava os dois com ela.

Entrava então em cena um outro pesquisador, que a criança ainda não tinha visto. O sujeito perguntava: "Posso pegar um [dos brinquedos]?". A maioria dos bebês dava um dos brinquedos para a pessoa, e um terço deles emprestava até o brinquedo considerado o preferido.

Aliás, havia uma correlação: as crianças mais "chocadas" com a divisão injusta do leite ou dos biscoitos eram justamente as que tinham mais tendência a compartilhar seus brinquedos com os estranhos, sugerindo que tendências parecidas explicam os comportamentos.

Cérebro infantil já teria módulos 'de fábrica'


DO EDITOR DE CIÊNCIA E SAÚDE

A investigação do senso moral aparentemente inato de bebês e crianças pequenas floresceu nos últimos anos, com uma série de descobertas intrigantes.
Bebês de dois a três anos, por exemplo, tendem a preferir personagens de desenho animado que ajudam os outros aos personagens que estorvam os demais, mesmo quando esses seres são simples formas geométricas, como quadrados, retângulos e círculos. As crianças também parecem vir "de fábrica" com algum conhecimento básico sobre física: olham mais tempo, surpresas, para vídeos em que objetos ficam suspensos no ar quando deveriam cair, por exemplo.
A explicação mais óbvia (e provavelmente mais sólida) para essas capacidades é evolutiva: seria custoso demais para o cérebro dos pequenos aprender tudo do zero, especialmente as regras básicas sobre o funcionamento do mundo e da vida social humana. Nascer com instintos morais e intuições sobre física facilitariam o aprendizado de informações mais complexas e ajudariam as crianças a sobreviver. (RJL)
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Reportagem por REINALDO JOSÉ LOPES - EDITOR DE CIÊNCIA E SAÚDE

Fonte: Folha on line, 10/10/2011

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