terça-feira, 3 de setembro de 2024

A segunda morte do passarinho

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A segunda morte do passarinho     
Elon Musk | Foto: Trevor Cokley/US Air Force

A derrubada do X, antigo Twitter, por ordem do ministro Alexandre de Moraes jogou parte do Brasil na escuridão. Há muitas redes sociais. Cada uma, como os bares, tem suas características e públicos. O Facebook, para porto-alegrenses, é como a churrascaria Giovanaz. Tem carne boa a bom preço, serve à família toda, fornecendo de notícia de aniversário a participação de falecimento. Se não tem picanha nem ambiente fashion, compensa com pagamento sem taxas. Até pouco tempo não aceitava nem cartão. Era no velho dinheiro vivo. A sua lógica é a do pix. O Instagram, chamado de Insta pelos frequentadores, ao contrário do Face, privilegia a imagem moderna. É bar de azaração, ostentação, corpos sarados e carros potentes. Está mais para Moinhos de Vento do que para Cidade Baixa e Bom Fim.

Já o twitter sempre foi Lancheria do Parque, Bar do Beto, Mercado Público, lugar de discutir política, futebol e outros assuntos capazes de suscitar engajamentos passionais e demandar, em tese, argumentos racionais. É verdade que depois de comprado pelo bad boy internacional Elon Musk virou um enorme almoço de domingo dominado por tiozões bolsonaristas. Existem outras semelhantes, como a Bluesky e a Threads. A Bluesky pertence ao cara que fundou o Twitter. É como esses donos de bar que montam um negócio de sucesso, vendem, sentem saudades e abrem outro sem a mesma pegada. O bar Threads tem o inconveniente de ter um nome impronunciável por bebuns brasileiros. Vai acabar sendo chamado de Trendão do Chope. Uau!

Rede social é também como Uber. Nada mais burro do que usar um aplicativo estrangeiro para pegar táxi. O motorista perde boa parte do valor da corrida para uma multinacional, que manda o dinheiro para fora do país, lesando a economia nacional. O cliente paga o preço que lhe é imposto: barato quando não precisa; caro na hora mais necessária. Um aplicativo local daria mais lucro para os motoristas e poderia ter preço mais baixo para os usuários. Como o nome Uber passou a ser como antigamente era frigidaire para geladeira, todo mundo só pensa em Uber, logo tem mais carro no Uber, mais demanda por Uber e mais eficácia Uber. E todos marcham.

O frequentador do Insta tem certeza de que só nele tem modernidade, beleza e juventude. Face e X lhe parecem coisas de velho. Musk e Moraes duelam em torno de valores contraditórios: a liberdade de expressão e a soberania nacional. A esquerda está contra Musk por ele ser um reacionário de ultradireita. A direita gosta de Musk por ele representar a liberdade de expressão das ideias conservadoras. Moraes vive no fio da navalha virtual. Se mandar bloquear algum perfil de esquerda cai do pedestal na hora. Quem tem razão? Moraes parece dispor do melhor cardápio. Musk estica a corda para faturar com a virtual tensão. Se o X desaparecesse no mundo todo, ele poderia se dividir entre o Facebook e o Instagram sem grande prejuízo.

É a segunda vez que o passarinho morre no Brasil. Na primeira, tomou uma estilingada de Elon Musk. Agora, foi alvo do STF. Eu sempre fui frequentador do Twitter. O tamanho dos posts expressa bem a dimensão do meu pensamento. Nunca fui além de um pio. Mais do que isso e já emudeço.

Tambor tribal (Falando sério)

Elon Musk é um falastrão. Enquadrá-lo é obrigação de qualquer nação que preze a sua soberania. Passou o tempo em que os deslumbrados tecnológicos garantiam que era inadmissível querer aplicar as leis do mundo comum ao virtual. O Pierre Lévy popularizou a fórmula segundo a qual o virtual não se opõe ao real, mas ao atual. O virtual é só uma dimensão atual do real. Tudo que vale em outras dimensões do real vale também no virtual. A única diferença é a prisão, que só pode ser cumprida presencialmente. Dessa Musk está livre por viver em outra nação soberana.

*Jornalista. Escritor. Prof. Universitário.

Fonte:  https://www.matinaljornalismo.com.br/matinal/colunistas-matinal/juremir-machado/a-segunda-morte-do-passarinho/?utm_

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