"Vivemos em uma sociedade que em grande parte marcha ´ao compasso da verdade`- ou seja, que produz e faz circular discursos que funcionam como verdade, que passam por tal e que detém, por esse motivo, poderes específicos.” (Michel Foucault, filósofo francês, 1929-1984)
Michel Foucault, ao pensar nas relações de poder que perpassam a vida dos indivíduos no seio das sociedades, principalmente a partir do século XVIII, desloca o foco de sua análise das instâncias do setor político e de suas formas de repressão para mostrar que o poder está disseminado pelos vários âmbitos da vida social.
Para analisar os micro poderes, Michel Foucault tem como objeto de estudo práticas discursivas, gramaticais, jurídicas, sexuais, religiosas, médicas e outras.
Tomando como linha de análise, que ficou conhecida como microfísica do poder, o filósofo atesta que o poder está por toda parte, não no sentido de englobar tudo, mas sim porque ele provém de todos os lugares na trama social.
Em decorrência disso, a linha de investigação desse pensador procura colocar em evidência as estruturas veladas de poder, para mostrar “que vivemos em uma sociedade que marcha ao compasso da verdade”, tendo como pano de fundo discursos que se justificam e permitem que o poder seja exercido de maneira específica.
Entre as várias questões que Foucault trabalha em seus escritos, aqui, me aterei a apenas um aspecto fundamental da análise foucultiana, a saber: os mecanismos de controle social.
A sociedade contemporânea é vista como uma sociedade disciplinar, em que se acentua cada vez mais a produção de mecanismos voltados para as práticas disciplinares de vigilância e controles frequentes, que abrangem os variados setores por onde transitam os indivíduos.
E esses mecanismos de vigilância e controle fundamentam-se através em discursos científicos, que realizam um controle detalhado do corpo – gestos, atitudes, comportamentos, hábitos, discursos. Assim, o poder é produtor de individualidade. E o indivíduo é produção do poder e do saber.
Para clarificar como esse mecanismo de controle social se faz presente na sociedade, tomemos como exemplo campanhas que o Estado promove, como programas de previdência social, de controle de natalidade, de prevenção a doenças sexualmente transmissíveis e assim por diante.
Isso ocorre porque, consolidadas as sociedades disciplinares, começa a se delinear um tipo de poder voltado não mais para o indivíduo, mas para um novo corpo político, a população. Agora, trata-se de fazer viver e deixar morrer, ou seja , a hegemonia das relações começa a ser definida pelo biopoder: uma tecnologia de poder que afirma a vida e que consiste no controle do Estado sobre a qualidade de vida de sua população.
Nesse sentido, a palavra final é das autoridades competentes, representando o papel do Estado, que, por sua vez, deve manter sob controle situações que são de sua responsabilidade. Ao mesmo tempo que exerce um poder, produz um saber.
Em suma, o poder para Foucault exerce-se. Isto é, o poder é ato; é algo que se pratica ou se sofre, não algo que se possui ou não, podendo ser transferido. Sendo assim, não podemos compreender os mecanismos do poder pela ótica simplista da relação dominador-dominado.
Por isso, o poder é intrínseco às relações humanas, mas, como a toda ação corresponde uma reação, o poder não se exerce impunemente. Se há poder, há resistência, e ninguém é apenas passivo nas relações de poder.
Por fim, para concluir com palavras do próprio autor, cito: “Por dominação eu não entendo o fato de uma dominação global de um sobre os outros, ou de um grupo sobre o outro, mas as múltiplas formas de dominação que se podem exercer na sociedade”.
*Ivo Lima é escritor e professor de FilosofiaE-mail: ivolimasantos@yahoo.com.br
Correio Popular - 18/10/2009
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