terça-feira, 11 de outubro de 2011

Paternidades estranhas. O caso de Jobs, Lennon e Lula

Paulo Moreira Leite*

Estudiosos de várias correntes tem uma explicação padronizada para problemas modernos com adolescentes problemáticos e adultos complicados: ausencia do pai, da célebre autoridade masculina de que falam psicólogos e psicanalistas.
A tese é que a evolução dos costumes, o divórcio e a liberdade sexual retirou os homens de casa, privando muitos filhos foram privados daquela autoridade capaz de garantir uma formação adequada para o mundo.
Será mesmo?
Como tantas pessoas, tive um pai maravilhoso e inesquecível. Devo a ele muito do que sei e também uma vontade de aprender que não termina. Ele me preparou para ser pai com boas palavras mas especialmente pelo exemplo.
Mas outras pessoas tiveram pais diferentes. Ou eram pessoas ausentes. Ou eram completos desconhecidos. Luiz Inácio Lula da Silva descreve seu pai como um mau pai. Violento, mesquinho, mulherengo e beberrão. Não consegue ter uma palavra de gratidão por ele. Diz que só poderia agradecer por ter fornecido o espermatozóide que permitiu sua chegada à vida.
A biografia de Lula mostra a distancia que ele percorreu na vida para chegar onde chegou — do interior de Pernambuco até a Siences Pô francesa, onde recebe condecorações que são motivo de tanta crítica no Brasil, rsrsrsrs.
Responda rápido: este pai atrapalhou ou ajudou?
Para ficar em outros exemplos conhecidos. Steve Jobs jamais conheceu pessoalmente o pai biológico, que tampouco fez questão de procurá-lo ao longo da vida. Nos anos finais da vida de Steve Jobs, quando a notícia da doença tornou-se pública, o pai biológico chegou a lhe mandar emails que não tiveram resposta — ou apenas palavras breves, conforme reportagem do Wall Street Journal publicada pelo Valor, ontem.
Abdulfattah Jandali era um acadêmico nascido na Síria, que chegou a estudar Ciencia Política nos EUA com a ambição de tornar-se diplomata. Teve um relacionamento prolongado mas irrregular com a mãe de Jobs, uma convivencia sempre complicada, feita de idas e voltas, com forte oposição da família dela.
Eles não estavam juntos quando Steve nasceu e sua mãe entregou-o para adoção. (Estudante universitária, queria que ele fosse educado por um casal com curso superior. O casal que criou Jobs não preenchia tais requisitos. O pai adotivo era operário, operador de máquinas. Sua mãe adotiva não tinha curso superior).
Outro caso conhecido é o de John Lennon. Seu pai era um ausente completo. Criado por uma mãe que possuia uma vida emocional difícil, só apareceu no fim da vida de Lennon, que não queria mais saber dele.
Tenho amigos que são pais ausentes. Outros, presentes. Não acho que a maternidade seja uma condição automática. Não faltam mães que abandonam crianças na maternidade e nunca mais aparecem. Outras abandonam filhos na infancia e na adolescencia, sem a menor culpa.
Mas está na cara que a paternidade envolve um outro aspecto. Tem um caráter optativo, digamos assim. Participar do crescimento e da formação de uma criança é um plantão permanente, que envolve tarefas e responsabilidades para a vida inteira. Por isso muitos homens somem.
Não é fácil ser pai nem ser mãe. Entre as duas funções, uma diferença é que a paternidade é uma responsabilidade da qual um número maior de pessoas tem menor dificuldade para fugir.
E este é ponto. Às vezes o sujeito foge e anos mais tarde descobre que não fez a menor falta. Ou, quem sabe, conclui que sua ausência talvez tenha sido muito útil para o filho. Estranho, não?
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* Jornalista desde os 17 anos, foi diretor de redação de ÉPOCA e do Diário de S. Paulo. Foi redator chefe da Veja, correspondente em Paris e em Washington.
Fonte: http://colunas.epoca.globo.com/paulomoreiraleite/2011/10/11/

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