sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Steve Jobs: a morte de um deus tecno-humano?

Elizabeth Drescher*

 

Steve Jobs (1955-2011) tornou os dispositivos tecnológicos
em extensões da experiência humana, assim como Marshall McLuhan
mostrou que eles eram, enquanto a era digital estava surgindo.
Ele ajudou a tornar o nosso mundo maior,
 aproximando-nos.
Steve Jobs morreu hoje aos 56 anos de idade.
Ainda em 1994 – alguns anos antes que Steve Jobs fizesse a sua própria ressurreição completa retornando à então vacilante Apple –, Umberto Eco postulou que o mundo estava dividido por "uma nova guerra religiosa subterrânea" opondo os usuários de Macintosh contra os da Microsoft. Além disso, Eco afirmou:
"Minha profunda persuasão é de o Macintosh é católico e o DOS [sistema operacional da Microsoft] é protestante". E continuou:
Na verdade, o Macintosh é católico contrarreformista e revela a influência da "ratio studiorum" dos jesuítas. É festivo, amigável, conciliador, diz ao fiel como deve proceder passo a passo para alcançar – se não o reino dos céus – o momento da impressão final do documento. É catequético, a essência da revelação é resolvida em fórmulas compreensíveis e em ícones suntuosos. Todos têm direito à salvação.
O DOS é protestante, ou até calvinista. Prevê uma livre interpretação das escrituras, pede decisões pessoais e sofridas, impõe uma hermenêutica sutil, dá por descontado que a salvação não está ao alcance de todos. Para fazem com que o sistema funcione, exigem-se atos pessoais de interpretação dos programas: longe da comunidade barroca dos foliões, o usuário está encerrado na solidão do seu próprio tormento interior.
Eco não foi nem o primeiro nem o último a destacar as dimensões religiosas ou espirituais das nossas afeições tecnológicas. De fato, uma verdadeira indústria artesanal de estudiosos surgiu para rastrear a religiosidade dos usuários da Apple em particular, grande parte deles se focando em Steve Jobs como a pedra rejeitada que se tornou a pedra angular, não apenas do tremendo sucesso da Apple, mas também de uma nova cultura tecnológica que colocou as pessoas, suas necessidades e desejos no centro, em vez dos geeks [pessoas obcecadas por tecnologia] e suas ideias por demais “legais” e tecnológicas.
Jobs tornou os dispositivos tecnológicos em extensões da experiência humana, assim como Marshall McLuhan mostrou que eles eram, enquanto a era digital estava surgindo. Ele elevou seu status de modestas ferramentas a conectores digitais, fazedores de relacionamentos, cruzadores de fronteiras globais. Jobs ajudou a tornar o nosso mundo maior, aproximando-nos.
Com relação a tudo o que se diz da Apple enquanto culto e de Jobs enquanto seu deus perfeccionista, é bom lembrarmos que ele teve uma morte muito humana, depois de viver uma vida notavelmente humana e inspiradora. De fato, são as falhas humanas, os retrocessos e as perdas de Jobs que tornaram as suas contribuições e seus triunfos tão extraordinários. Que os pixels brilhem perpetuamente sobre ele.
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*Teóloga norte-americana Elizabeth Drescher, professora da Santa Clara University, em artigo publicado no sítio Religion Dispatches, 05-10-2011.
A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Fonte: IHU on line, 07/10/2011
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