quarta-feira, 3 de junho de 2015

Daniel Richman, advogado e especialista em crimes federais: ‘Corruptos e corruptores ficam felizes’


Richman e suas ideias: há um código quase inquebrantável entre corrupto e corruptor, o que torna o crime de colarinho branco o mais difícil de desvendar. - Guito Moreto / Agência O Globo

Professor da Universidade de Columbia, em Nova York, americano veio ao Rio para seminário da Associação Internacional de Direito Penal e da FVG


“Nasci em Manhattan e tenho 56 anos. Sou bacharel em Direito pela Universidade Yale e fui procurador federal para o Distrito Sul de Nova York entre 1987 e 1992. Vim ao Rio para falar sobre Direito penal americano, mas também para ter uma linda oportunidade de ver a cidade pela primeira vez” 

Conte algo que não sei.
A corrupção é um crime muito difícil de se identificar e de se processar, porque ambos os lados que melhor sabem dos esquemas — os que pagam subornos e os que os recebem — tendem a ficar quietos. Há exceções, mas, na maioria dos casos, corruptos e corruptores ficam felizes com a combinação deles, e a vítima nem sabe o motivo pelo qual o crime ocorreu. 

No Brasil, por causa de casos recentes, alguns dizem que a corrupção cresceu. Outros falam que, na verdade, foi a punição que aumentou. O que acha que houve?
É possível que as duas coisas estejam acontecendo. Eu não conheço bem o sistema brasileiro, mas não é inconsistente dizer que esse tipo de crime, particularmente difícil de se identificar, cresce ao mesmo tempo em que pessoas envolvidas em corrupção são flagradas. E é importante dizer que a corrupção não é um problema específico do Brasil. 

Embora a população carcerária ainda seja composta significativamente por pobres, no Brasil e nos EUA, a punição a ricos que praticam crimes está aumentando?
Ao menos nos EUA, está, sim, havendo um processo de mudança. A nossa legislação federal não focava realmente em crimes de colarinho branco, até os anos 1970. E estamos comprometidos com esse projeto de mudança. Meus amigos que são promotores federais ou que trabalham para agências federais ficam satisfeitos em desmantelar esquemas políticos. Eles encaram isso como uma das suas principais missões. 

Quais as formas de identificar a corrupção?
Algumas vezes é possível provar a existência de uma relação corrupta pelo registro de operações financeiras, mas, geralmente, não. Em geral, é preciso fazer mais que isso, já que as pessoas não costumam deixar rastros documentais. Em certos casos, são necessários colaboradores: pessoas contra quem há provas, o que pode incentivá-las a dar informações.


No Brasil, a chamada delação premiada já foi criticada. Como confiar nas informações de alguém diretamente envolvido no crime?
Essa é uma pergunta na qual promotores pensam constantemente. A meta deles é acessar o testemunho do colaborador por meio de procedimentos que assegurem que ele se sinta pressionado a falar a verdade. É preciso ter certeza de que todos, inclusive quem julga, sabem qual é o acordo. Assim, é possível refletir sobre as razões que se tem para mentir. Ninguém está fingindo que essa pessoa mudou e virou um anjo. Ela está testemunhando porque tem de testemunhar. Incentivamos a traição pelo bem público. 

Então a traição pode ser algo bom?
A lealdade não é um bem em si mesmo. Ela é boa na medida em que se dá entre pessoas que querem fazer o bem ou, ao menos, não querem fazer o mal.

Alguns juízes que atuam em casos de grande exposição se tornam celebridades no Brasil. O que acha disso?
Nos EUA, acontece algo parecido com certos promotores. Acho que isso não é de todo ruim. O trabalho do promotor não é só encarcerar pessoas, mas também mandar uma mensagem, especialmente em casos de colarinho branco e corrupção. Essa mensagem tem a ver com explicar às pessoas como devem se educar mais como eleitores e como cidadãos no futuro.
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Reportagem  por Dandara Tinoco

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