domingo, 7 de junho de 2015

‘É possível estar sozinho, sem sentir-se solitário’


 

m busca do silêncio: escritora Sara Maitland investiga as revelações por trás da solidão - Divulgação

Escritora Sara Maitland se interessa pela ausência de ruídos como um fenômeno cultural e transformou sua vida num laboratório


Após crescer numa família com seis irmãos, casar-se e ter dois filhos, a escritora britânica Sara Maitland descobriu-se fascinada pelo silêncio. Ela, então, juntou suas coisas e mudou-se para uma casa estrategicamente construída numa região da Escócia onde há uma das menores densidades populacionais da Europa. Ela vive a 16 quilômetros do supermercado mais próximo, não conta com sinal de celular e passa o dia inteiro sem ver uma única pessoa (fato que ela adora). Mas a escritora garante nada disso significa uma vida de solidão, já que a amizade permanece como um dos valores centrais de sua vida. Toda essa experiência permitiu que escrevesse o livro “Como ficar sozinho”, que integra a série “The school of life”, lançada no Brasil pela Objetiva.

Você diz que estar sozinho é diferente de ser solitário. Qual é, de fato, essa diferença?
Quando alguém está no chuveiro, geralmente está sozinho, mas praticamente nunca solitário. Quase todo mundo possui atividades que gosta de fazer só. É o caso da maioria dos escritores. Durante o trabalho, sentiriam a chegada de outra pessoa, mesmo que um ser amado, como uma interrupção. Seria absurdo chamá-los de solitários. É possível estar sozinho, mas não solitário, porque a pessoa gosta de estar assim. E a palavra “solitário” implica em não ser feliz.

Por que as pessoas têm tanta dificuldade em ficar sozinhas?
Vivemos em uma sociedade que diz que quem está sozinho é, de alguma forma, uma pessoa que falhou como humano. Também diz que está sentindo falta de alguém cuja presença anseia, como uma condição de luto e separação. Você também corre o risco de descobrir que não gosta de si mesmo o quanto esperava ou ter medo, por exemplo, de sofrer um estupro e até cair e precisar de ajuda. Além disso, ninguém nunca lhe ensinou a gostar de estar sozinho. Afinal, gastamos um tempo enorme ensinando as crianças a serem sociáveis, mas raramente as deixamos experimentar como é estar sozinho.

Vivemos em um mundo que exclui quem opta por viver sozinho?
Excluir pode ser um termo muito forte. Mas, certamente, desencoraja. Hotéis geralmente têm poucos quartos individuais e cobram das pessoas que estão sozinhas custos extras para o uso de um quarto duplo. Pequenas embalagens de alimentos são mais caras do que as grandes e assim por diante...

Mas, por outro lado, este mesmo mundo está conduzindo as pessoas à solidão em alguns aspectos?
Essa é uma grande questão. Temos comunidades fragmentadas pela alta mobilidade. As pessoas tendem a viver longe de suas famílias e comunidades originais. Isso impõe àqueles com menos mobilidade, muitas vezes os mais velhos, o isolamento. Também temos uma nova realidade em que estamos conectados 24 horas por dia, na qual pessoas que não tenham 500 amigos no Facebook podem sentir-se solitárias, de uma forma que não acontecia há 50 anos.

Pesquisas em diferentes países mostram o aumento no número de pessoas que moram sozinhas. O que está por trás disso?
Sabemos com bastante precisão, no Reino Unido, que os dois grupos que mais crescem neste sentido são mulheres com mais de 70 anos, em função do luto, e homens entre 30 e 45, devido à ruptura conjugal, já que as crianças ainda tendem a ficar com a mãe. E como estas são duas causas infelizes, que independem da escolha pessoal, acabam levando ao sentimento de solidão. Mas não tenho ideia do que isso significa realmente. É um fenômeno muito novo.

Que tipo de revelações experiências solitárias podem proporcionar?
Estar só nutre trabalhos artísticos de vários tipos, especialmente literários. Tal condição proporciona espiritualidade e experiências místicas. Há um forte indicativo de que isso aprofunda o amor e a apreciação da natureza. É algo que, obviamente, permite o desenvolvimento de gostos pessoais, da originalidade, da gestão do tempo e da independência de pensamento e ação. Suspeito que aumenta a autoestima, além do senso de competência e capacidade. Na verdade, acaba por ser muito boa para a saúde, pois reduz o estresse e, portanto, a frequência cardíaca e a pressão arterial. Dormir sozinho melhora a qualidade do sono e dos sonhos. Mas a maior surpresa é a descoberta de que sozinho você é, de fato, uma pessoa interessante, com muitos recursos inesperados.
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Reportagem por Eduardo Vanini

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