As pessoas se perguntam se existe vida após a morte. Mas é claro que
existe vida após a morte. Depois que você morre, alguém pega um ônibus
do outro lado da cidade. Um senhor de idade compra um jornal. Três
amigos bebem no Centro. Um bebê que vai ser famoso nasce do outro lado
do mundo. Um avião decola com uma senhora apreensiva. Uma criança brinca
com areia na praia. Um cachorro passeia feliz. Existe vida depois da
morte. Só não pra quem morre. Pra quem morre, acabou.
Eu gostaria de estar errado, é claro. Ser ateu tem desvantagens
devastadoras: sei que não represento nada pro mundo. Sei que a minha
morte não fará diferença alguma pra história do planeta. Sei que em 150
anos todas as pessoas que eu mais amo estarão mortas. Sei que ninguém
vai se lembrar de mim. Não terei entendido a infinitude do espaço
sideral. Jamais saberei como o mundo vai ser daqui a mil anos. Essa
curiosidade me mata. Entendo quem se recusa a acreditar nisso.
Adoraria estar errado. Fechando os olhos aqui, os abriria lá do outro
lado. Diria: “Ufa! Que bom! Eu estava errado!”. Ateus entrariam no céu,
chocados. Árabes, espíritas, budistas, evangélicos, todos certos. E,
consequentemente, todos com a súbita consciência de que estavam errados
também. Depois de morto eu viveria pra sempre, acompanhando do céu as
minhas filhas crescerem. Adoraria esperá-las nas nuvens, recebê-las na
entrada do Paraíso, viver eternamente abraçado a elas. Adoraria sentar
novamente ao lado do meu vô. Conversar com grandes homens que já se
foram. É uma fantasia tão agradável, que eu entendo por que faz tanto
sucesso.
É claro que existe vida após a morte. Pessoas morrem todos os dias e
ainda assim o sol nasce no dia seguinte. Um cachorro se espreguiça. Um
homem sai pra trabalhar de moto. Uma menina de 11 anos vai pra escola a
pé. A vida que existe depois da morte é essa que você está vivendo
agora. Faça bom proveito.
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* Colunista da ZH
Fonte: ZH online, 26/06/2015
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