Foi
a própria equipa do presidente dos EUA a sugerir que Barack Obama fosse
entrevistado
por Marc Moran, autor de um podcast que, sobretudo,
costuma falar com humoristas
Andrew Caballero-Reynolds/AFP/Getty Image
Marc Moran, autor de um popular podcast norte-americano,
entrevistou o presidente dos EUA na garagem de sua casa.
O programa
chama-se WTF e Barack Obama falou
sobre racismo e a tragédia de
Charleston.
Vamos puxar pela imaginação. Feche os olhos e pense em Barack
Obama a receber um pedido de entrevista e a dizer que sim. Depois, o
presidente dos EUA entra num helicóptero, voa durante uns minutos,
aterra e, sem demoras, põe-se dentro de um carro. É conduzido até parar à
frente da casa onde alguém, há anos, grava na garagem um podcast — ou seja, um ficheiro de áudio que depois é publicado algures na internet. Esse podcast chama-se WTF (sim, a sigla para What The Fuck?)
e quem o gere nada tem nada a ver com jornais, televisões ou estações
de rádio. Agora fique a saber que nada disto é inventado. Tudo aconteceu
mesmo.
A realidade desta história é que nem foi Marc Maron — autor do podcast
que, todas as semanas, é ouvido por centenas de milhar de pessoas — que
teve a ideia de entrevistar o 44.º homem a ser eleito presidente
norte-americano. “Há pessoas da sua comitiva que gostam do meu programa e
alguém achou que seria uma coisa engraçada de se fazer. Mas nunca
pensei que fosse realmente acontecer”, disse, esta segunda-feira, já
depois de a conversa com Barack Obama ser publicada. E muita coisa teve
ser mobilizada para que ambos pudessem falar, frente-a-frente, durante
cerca de uma hora.
Primeiro, o telemóvel de Marc Maron tocou e, do outro lado,
alguém da equipa de Obama lhe propôs a entrevista. Marc, que costuma
entrevistar, sobretudo, comediantes, disse que sim. As semanas foram
passando até chegar o dia em que Barack Obama entrou na sua garagem em
Los Angeles. A equipa de segurança do presidente varreu a casa de antes
de Obama entrar e, depois, uma equipa de atiradores furtivos (snipers)
subiu para o telhado do vizinho e por lá ficou até o presidente sair.
Houve minúcia para inspecionar tudo, menos uma coisa — o frigorífico.
“Não servi nada. Mas eles podiam usar a minha única casa de banho”,
brincou, quando falou sobre a entrevista ao site Slate.
A casa estava repleta de agentes dos serviços secretos (FBI), da
polícia de Los Angeles e da equipa de segurança do presidente dos EUA.
Todos chegaram muitas horas antes de Obama e até cobriram a casa de Marc
com uma tenda, que se estendia até à estrada. Só assim, com este
aparato todo, é que foi possível que o líder norte-americano tenha dito o
que disse a um podcast.
Barack Obama falou de racismo,
do recente massacre de Charleston, no estado da Carolina do Sul (nove
pessoas foram assassinadas numa igreja) e até usou a suposta palavra
proibida na política norte-americana — “nigger”, ou “preto”, em tradução literal. “Não estamos curados do racismo. E não é só uma questão de não ser educado e não dizer nigger em
público. Isso não mede se o racismo ainda existe, ou não”, defendeu o
presidente dos EUA, acrescentando que “as sociedades não apagam de um
dia para o outro tudo o que aconteceu 300 anos antes”. A entrevista pode
ser ouvida aqui.
Na
conversa com Marc Maron, o presidente também falou da sua infância e de
como só perto dos 20 anos é que começou a “honrar” os dois lados das
suas raízes — Barack Obama é filho de mãe norte-americano e pai
queniano. “Não tenho de me comportar de uma certa maneira para me
afirmar como afro-americano e, ao mesmo tempo, também ser alguém que
afirma o lado branco da família. Não tenho de me afastar do amor e dos
valores que a minha mãe me passou”, argumentou.
Na sequência dos
recentes massacres nos EUA e, sobretudo, da tragédia de Charleston, a
entrevista tocou no ponto da legislação norte-americano sobre a posse de
armas. E Obama perguntou: “Sentirmo-nos mal não é suficiente. Há ações
que podiam ser tomadas para tornar estes episódios menos prováveis de
acontecer. A questão é: haverá alguma maneira de acomodar um conjunto de
tradições com um bom senso que impeça um jovem de 21 anos de, quando
estiver chateado ou confuso com alguma coisa, ou se for racista, de ir a
uma loja comprar uma arma e, de repente, ficar armado e causar danos
enormes?”
Esta não foi a primeira vez que Barack Obama concedeu
uma entrevista a um programa de humor ou a um formato não associado a
meios de comunicação social. Em 2014, por exemplo, o presidente
norte-americano foi ao programa “Between Two Ferns”, apresentado pelo
ator e comediante Zack Galifianakis (ator que participa na saga de
filmes “A Ressaca”), embora, aí, a conversa
tenha durado menos de 10 minutos. E será que Marc Moran, se pudesse,
mudava algo na entrevista que fez ao presidente dos EUA? Por enquanto,
nem ele sabe: “Não sei. Falem comigo quando tiver tempo
para pensar durante um segundo.”
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Reportagem por
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