Thomaz Wood Jr.*
Consta que Oliver Stone dirige uma sequência de Wall Street. O filme original, lançado em 1987, surgiu na esteira dos escândalos financeiros dos anos 1980. Tornou-se obra emblemática dos excessos e extravagâncias de uma era que, comprovamos estarrecidos, foi apenas o prenúncio de mais excessos e mais extravagâncias. O filme atual segue a crise financeira de 2008, que tem se revelado mais um marco na escalada das finanças rumo à construção de uma hecatombe total. Os filmes de Stone não costumam justificar a ida ao cinema, mas não se pode negar sua capacidade de capturar o espírito da época. Então, vale a pena ficar atento aos passos do diretor nova-iorquino.
Wall Street tinha nos papéis principais Michael Douglas, como o icônico Gordon Gekko, um agressivo investidor, e Martin Sheen, como Bud Fox, um jovem e ambicioso corretor. Para chamar a atenção de Gekko e atraí-lo como cliente, Fox lhe passa uma informação privilegiada, obtida em uma conversa casual com seu pai, um sindicalista que trabalha em uma pequena empresa de transporte aéreo. Gekko cai no estratagema e investe na empresa, faturando alto. Fox ganha sua confiança e se torna seu protegido. Segue-se uma espiral de grandes negociatas e muito dinheiro, temperado com os símbolos usuais de status e as extravagâncias kitsch do mundo das finanças.
O filme de Stone ficou notório por um discurso em que o engomado Gekko desfila seu credo para uma plateia admirada: “...a cobiça, na falta de palavra melhor, é boa, a cobiça é certa, a cobiça funciona...” Para o investidor, a cobiça, ou ganância, está na essência do que move as pessoas à frente: a cobiça por dinheiro, por conhecimento, por amor. A cobiça, para Gekko, pode salvar empresas mal geridas da indolência e da inércia. E ele, com seus métodos impiedosos, se vê como o grande libertador.
Wall Street foi concebido como uma fábula moral: mocinhos são mocinhos, bandidos são bandidos, e, obviamente, os vilões devem ser castigados. Fox termina processado e Gekko é preso. Já na vida real, para cada Gekko colocado atrás das grades, há cem, quiçá mil, que continuam livres. Gekko é apenas a ponta visível de um iceberg cuja linha de superfície parece ter sido, até aqui, administrada pela própria indústria financeira. Por enquanto, sacrificar alguns Gekkos parece ser suficiente para aplacar a ira do populacho e de seus representantes. Passado um ano da crise que fez vítimas em todo o planeta, a grande máquina que move a ciranda financeira vai retomando seu ritmo original.
Já há algumas informações sobre o novo filme de Stone. A crise econômica atual fornecerá o cenário, o economista Nouriel Roubini talvez faça um pequeno papel e Gekko deixará a prisão em busca de uma nova chance. Mas o que acontecerá ao combalido ex-investidor? Não faltam especula-ções. A seguir, algumas hipóteses (cínicas) levantadas pela- mídia, transmutadas e adaptadas especialmente para os fiéis leitores de CartaCapital.
Roteiro 1:
Gekko deixa a prisão e depara-se, entusiasmado, com o caos financeiro. Imediatamente, percebe que o momento apresenta grandes oportunidades. Então retoma contatos, mobiliza recursos e rapidamente consegue se apropriar de verbas do fabuloso pacote oferecido do governo norte-americano. Seis meses depois de solto, compra um apartamento no Upper East Side e volta a usar um jato particular para deslocamentos. Abandona definitivamente, porém, os suspensórios e o cabelo engomado. Sinal dos tempos!
Roteiro 2:
Gekko deixa a prisão e depara-se, assustado, com o caos financeiro. Ele percebe as oportunidades. Mas depois de vinte anos fora de circulação, sente-se um peixe fora d’água, incapaz de seguir o novo ritmo das altas (e baixas) finanças. Então coloca sua imaculada cobiça a serviço de novas causas sociais: torna-se um campeão das energias alternativas e das microfinanças. Em menos de um ano, acumula impressionante fortuna, fazendo vítimas na Alemanha, na Dinamarca, nas Filipinas e na Índia.
Roteiro 3:
Gekko deixa a prisão como um novo homem, depois de vinte anos estudando os escritos sagrados de Peter Drucker, Ram Charan, Jack Welch e Átila, o Huno. Escreve um livro de grande sucesso, Investidores Ricos, Acionistas Pobres, e torna-se um guru de gestão. Roda o mundo espalhando seu novo credo: “A cobiça é boa, mas só um pouquinho”. Em visita ao Brasil, faz palestra para 3 mil executivos, na ExpoManagement, sai na capa da revista Exame e revela, em Você S.A., por que as cuecas de seda ainda são essenciais para o sucesso de um executivo.
*Colunista da CARTA CAPITAL - 14/10/2009, p.99
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