''O Papa não pode resolver esse problema sozinho''.
"A primeira coisa que preciso dizer é que me sinto próximo do Papa Ratzinger, que se encontra em uma situação verdadeiramente difícil por causa de todos esses escândalos que investem contra a Igreja Católica. E espero verdadeiramente que o Papa encontre o caminho certo para levar a Igreja para fora dessa crise que já alcançou dimensões inauditas. Mas é preciso que ele faça isso muito rapidamente. Não se pode continuar pensando em termos de séculos para sair dessa dramática situação".
Hans Küng, grande teólogo suíço, companheiro de estudos de Ratzinger, conhecido há décadas pelos seus posicionamentos muitas vezes críticos com relação à doutrina oficial da Igreja Católica, está em Milão, onde participou do programa de televisão "Che tempo che fa", de Fabio Fazio.
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Professor, o que o senhor pensa das acusações lançadas pelo arcebispo de Viena, o cardeal Christoph Schönborn, ao ex-secretário de Estado vaticano, Angelo Sodano, que remetem ao plano internacional o escândalo da pedofilia na Igreja Católica?
Eu sou o primeiro a não gostar quando leio, todos os dias, no Herald Tribune ou no New York Times, novos escândalos que investem contra a Igreja Católica e o Vaticano. Me parece que já se trata de uma crise de confiança que precisa de uma intervenção séria e rápida por parte da Santa Sé.
Segundo o cardeal Schönborn, Sodano acobertou o arcebispo de Viena Hans Hermann Groër. E essas acusações chegam justamente no dia em que a Santa Sé aceitou a renúncia do bispo de Augsburg, Walter Mixa, investigado por suspeita de abusos sexuais.
Não quero entrar no mérito das acusações e dos episódios individuais que todos os dias, há semanas, estão nas primeiras páginas da imprensa mundial. Só me pergunto se o Vaticano tem a percepção exata do que está acontecendo, das dimensões reais do problema que envolve a Igreja.
A perturbação é enorme por causa das notícias que chegam a cada dia. Muitas pessoas perderam a confiança na Igreja e nos seus ministros.
Eu penso que o Vaticano deveria pensar especialmente nos sacerdotes das paróquias que sofrem em primeira pessoa por causa das consequências dessa história. É também a eles que se deveria dirigir uma palavra de esperança.
Recentemente, o senhor pediu que o Papa fizesse um "mea culpa".
Tendo chegado a este tempo, acredito que os gestos de contrição e os pedidos de desculpas, sozinhos, não bastam mais. Mas o Papa também não pode resolver esse problema sozinho.
A quem ele deveria pedir ajuda?
Ele deveria reunir um comitê restrito de sábios que possam ajudá-lo competentemente na decisão sobre o que fazer.
O senhor pensa que isso é possível em tempos rápidos?
Infelizmente, o sistema atual de governo da Igreja, em que tudo pesa sobre um homem só, não é o mais adaptado para a situação crítica do momento. O problema central é que a Igreja romana permaneceu na época medieval, mesmo que externamente use meios modernos. Da Revolução Francesa em diante, o papado é o único sistema que restou no mundo com essa marca tão exclusivista, com esse clericalismo forçado que cria uma subordinação dos leigos ao clero. A lei do celibato na Igreja das origens também não existia.
Como o senhor vê o futuro da Igreja depois do surgimento de todos esses escândalos?
Estou na Itália para apresentar o meu livro "Ciò che credo" [Em que creio] (Ed. Rizzoli), com o qual espero conseguir lançar uma mensagem de confiança às pessoas que foram muito sacudidas pelo que está acontecendo. Gostaria de tentar explicar como é possível ser crente também na sociedade muito secularizada de hoje. É possível ter uma visão da fé cristã construtiva e cheia de esperança.
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A reportagem é de Zita Dazzi, publicada no jornal La Repubblica, 09-05-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto
Fonte: IHU online, 10/05/2010
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