Antonio Delfim Netto*
O presidente eleito dos EUA, Donal Trump, fala em Nova York um dia depois da vitória |
O grande estadista Benjamin Franklin (1706-1790) ajudou Jefferson na
Declaração da Independência dos EUA (4 de julho de 1776) e teve
importante papel na acomodação dos interesses dos Estados na Convenção
Constitucional de setembro de 1787, da qual resultou a atual
Constituição dos EUA.
Quando lhe perguntaram se ela iria durar, respondeu: "Ela está
funcionando. Tudo parece sugerir que continuará a fazê-lo". Hoje sabemos
que se trata da mais bem-sucedida Constituição do mundo: dura há quase
250 anos, com poucas emendas.
É o exemplo de como deve ser o conjunto de fundamentos que presidirá a
governança de um país com membros subnacionais. Tem pouco mais de duas
páginas (8.000 e poucas palavras), é absolutamente genérica e tem um
cinturão defensivo à prova de maiorias eventuais. Para comparar: a nossa
ocupa 140 páginas, com 250 artigos e regula até transplante de órgãos!
O sistema de colégio eleitoral que elegeu Trump (que teve menos votos populares do que Hillary
) não está na Constituição. Foi acertado na Convenção e faz parte do
cinturão que visa proteger a "minoria" da eventual ditadura da
"maioria".
Funcionou! Trump teve um olho certeiro nos "esquecidos perdedores" de
quatro Estados (em três dos quais os republicanos não venciam desde os
anos 1980) que os intelectuais gostam de chamar de "cinturão da
ferrugem". São habitados por trabalhadores de uma indústria pujante que a
globalização tornou obsoleta.
A globalização tem, a longo prazo, benefícios econômicos importantes.
Gera externalidades preciosas: é promotora da paz e mitigadora dos
preconceitos entre os homens. O problema é que, a curto prazo, se não
for adequadamente pensada e compensada por políticas públicas, impõe
custos sociais insuportáveis aos "esquecidos" e "maltratados". Estes,
quando encontram uma voz que parece ouvi-los, vêm nela a oportunidade de
manifestar-se nas urnas. Foi exatamente para isso que os empoderaram o
colégio eleitoral e o sufrágio universal.
O fato de ninguém ter percebido (alguns intuíram, mas não explicitaram) a
possibilidade da vitória de Trump é a prova mais cabal da
insensibilidade social de analistas, pesquisadores, cientistas e "tutti
quanti" com relação à necessidade de políticas públicas compensatórias
nas democracias.
Afinal, o que se espera que faça um trabalhador de 50 anos, no "cinturão
da ferrugem", que não pode deslocar-se com sua família porque não
encontra quem queria comprar a sua casa? Que lhe dê formicida e se
suicide? Ou que vote em quem o "descobriu" e prometeu-lhe uma esperança,
ainda que vã?
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* Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e
ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
de São Paulo.
de São Paulo.
Fonte: https://www.blogger.com/blogger.g?blogID=1573693655200632246#editor/target=post;postID=6241427557088593268
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