quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Constituição dos EUA é exemplo para o mundo

Antonio Delfim Netto*




FILE - In this Wednesday, Nov. 9, 2016 file photo, President-elect Donald Trump speaks during an election night rally, in New York. A federal judge in San Diego will consider arguments on President-elect Trump's latest request to delay a civil fraud trial involving his now-defunct Trump University until after his inauguration on Jan. 20, 2017. Trump's attorneys said in a court filing ahead of the hearing to be held Friday, Nov. 18, 2016, that preparations for the White House were "critical and all-consuming." (AP Photo/Evan Vucci, File) ORG XMIT: CAET493
O presidente eleito dos EUA, Donal Trump, fala em Nova York um dia depois da vitória

O grande estadista Benjamin Franklin (1706-1790) ajudou Jefferson na Declaração da Independência dos EUA (4 de julho de 1776) e teve importante papel na acomodação dos interesses dos Estados na Convenção Constitucional de setembro de 1787, da qual resultou a atual Constituição dos EUA. 

Quando lhe perguntaram se ela iria durar, respondeu: "Ela está funcionando. Tudo parece sugerir que continuará a fazê-lo". Hoje sabemos que se trata da mais bem-sucedida Constituição do mundo: dura há quase 250 anos, com poucas emendas. 

É o exemplo de como deve ser o conjunto de fundamentos que presidirá a governança de um país com membros subnacionais. Tem pouco mais de duas páginas (8.000 e poucas palavras), é absolutamente genérica e tem um cinturão defensivo à prova de maiorias eventuais. Para comparar: a nossa ocupa 140 páginas, com 250 artigos e regula até transplante de órgãos! 

O sistema de colégio eleitoral que elegeu Trump (que teve menos votos populares do que Hillary ) não está na Constituição. Foi acertado na Convenção e faz parte do cinturão que visa proteger a "minoria" da eventual ditadura da "maioria". 

Funcionou! Trump teve um olho certeiro nos "esquecidos perdedores" de quatro Estados (em três dos quais os republicanos não venciam desde os anos 1980) que os intelectuais gostam de chamar de "cinturão da ferrugem". São habitados por trabalhadores de uma indústria pujante que a globalização tornou obsoleta. 

A globalização tem, a longo prazo, benefícios econômicos importantes. Gera externalidades preciosas: é promotora da paz e mitigadora dos preconceitos entre os homens. O problema é que, a curto prazo, se não for adequadamente pensada e compensada por políticas públicas, impõe custos sociais insuportáveis aos "esquecidos" e "maltratados". Estes, quando encontram uma voz que parece ouvi-los, vêm nela a oportunidade de manifestar-se nas urnas. Foi exatamente para isso que os empoderaram o colégio eleitoral e o sufrágio universal. 

O fato de ninguém ter percebido (alguns intuíram, mas não explicitaram) a possibilidade da vitória de Trump é a prova mais cabal da insensibilidade social de analistas, pesquisadores, cientistas e "tutti quanti" com relação à necessidade de políticas públicas compensatórias nas democracias. 

Afinal, o que se espera que faça um trabalhador de 50 anos, no "cinturão da ferrugem", que não pode deslocar-se com sua família porque não encontra quem queria comprar a sua casa? Que lhe dê formicida e se suicide? Ou que vote em quem o "descobriu" e prometeu-lhe uma esperança, ainda que vã? 
-----------
* Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
de São Paulo.
 Fonte: https://www.blogger.com/blogger.g?blogID=1573693655200632246#editor/target=post;postID=6241427557088593268

Nenhum comentário:

Postar um comentário