domingo, 6 de novembro de 2016

“Inimizade educada é sinal de maturação”

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5 PERGUNTAS PARA VALTER HUGO MÃE

Viver aos pés do Monte Fuji e cercado por um bosque nativo pode não ser tão calmo e idílico quanto parece. Ainda mais quando você considera seu vizinho um inimigo, e o bosque é conhecido como Floresta dos Suicidas, atraindo, além de homens que pretendem tirar a vida, demônios e espíritos. É para esse cenário que o escritor português Valter Hugo Mãe transporta os leitores em seu sétimo romance, Homens imprudentemente poéticos.

Valter Hugo Mãe estará neste domingo, às 14h30min, no Auditório Barbosa Lessa para conversar sobre o livro com a patrona do evento, Cíntia Moscovich, e o escritor Luiz Paulo Faccioli. Mais tarde, às 16h, o convidado recebe os leitores na Praça de Autógrafos.

Homens imprudentemente poéticos se passa no Japão antigo. Como se deu a escolha desse cenário?

Estive pela primeira vez no Japão quando ainda escrevia A Desumanização. Sabia, no entanto, que escrever sobre o Japão aconteceria um dia. Talvez não o fizesse imediatamente, mas a vida vai criando livros possíveis, livros que são ideias guardadas, e voltamos a eles a cada vez que ficamos disponíveis para começar a escrever. O Japão é fascínio puro, um cúmulo de livros e discos, filmes e história. A vida inteira fui acrescentando pequenas e grandes referências. O difícil foi mesmo limpar. Para que o romance não se tornasse um compêndio de curiosidades.

O senhor aborda no livro o tema do suicídio. Como foi enfrentar esse assunto tabu?

A literatura tem de ser coragem. Não pode ser mediana nem medrosa. Ela é intensidade e profundidade. Escrevo livros exatamente para chegar ao mais difícil da vida, ao mais difícil de todos os assuntos. Há uma candura, aqui e ali, no meu modo de escrever, mas sei sempre que estou procurando solucionar o lado mais duro da existência.

Qual foi a principal lição aprendida em Homens Imprudentemente Poéticos?

A cordialidade entre inimigos. Creio ser urgente aprendermos o respeito pelas pessoas de quem não gostamos, pelas pessoas que se opõem às nossas ideias. Uma inimizade educada é sinal de maturação da premissa democrática.

A cordialidade à qual o senhor se refere é bastante distinta da popularizada por Sérgio Buarque de Holanda.

Sim, não falo dessa cosmética que parece ser aquilo a que o grande Sérgio Buarque de Holanda se refere. Falo num sentido efetivo do termo. Uma endêmica relação com o coletivo, um compromisso sincero e definidor. O japonês concebe-se primeiro como peça de um todo, cidadão de um plural, só depois atende às suas necessidades individuais, que diria serem do foro mais egoísta. No Ocidente fazemos o contrário. Partimos da individualização quase psicótica para tolerarmos a contingência de vivermos em sociedade. A cordialidade para a tradição japonesa é estrita natureza, para o ocidental, é construção social.

Como o tempo afetou seu modo de escrever?

Depois de 20 anos, sinto que estou mais perto de encontrar o meu livro utópico. Aquele que arrumaria de vez com minha necessidade de escrever. Por ser utópico, é provável que não aconteça. Mas a sensação de saber melhor encontrar o caminho para essa plenitude é muito grata. Essa conquista é o apaziguamento possível com o tempo passado. Saber como fazer o caminho, no entanto, não significa ser mais fácil. Porque não se trata de facilidade. Trata-se de uma afinação de pensamento. Alguma coisa que nos limpa as ideias e coloca uma lucidez maior no lugar da confusão que existia outrora. Deve ser o que se chama o conhecimento dos velhos. Estou ficando velho. O envelhecimento, para a literatura, é patrimônio de ouro.

ALEXANDRE LUCCHESE | alexandre.lucchese@zerohora.com.br
Imagem da Internet
Fonte:  http://www.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a8154942.xml&template=3898.dwt&edition=30037&section=3593

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