Joaquim Zailton Bueno Motta*
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Na história da literatura, o diálogo aparece como uma das mais antigas e eficientes formas de apresentação de uma ideologia, uma tese, um enredo.
Desde a Antiguidade Clássica, na Grécia, vem a mais importante referência dos trabalhos filosóficos apresentados nesse estilo, os Diálogos de Platão, escritos há quase 25 séculos, entre 385 e 380 a.C.
Na história da medicina, do século 16 ao 18, vários livros foram produzidos dessa maneira. Um dos mais importantes, em português, foi Colóquios, de Garcia de Orta, publicado no século 16.
Os primórdios da psicoterapia se sustentaram na possibilidade de se conseguir um tratamento através da conversa. Antes de se compreender isso, os remédios desenvolvidos pela prática clínica cobriam a parte física das doenças e a subjetividade emocional era atendida pelo curandeirismo.
Freud desenvolveu grande parte da teoria e da técnica psicanalíticas dialogando com seus pacientes, bem como todos os seus sucedâneos e dissidentes. Lacan reviu toda a interpretação que se faz da linguagem, questionando em profundidade os vários significados das palavras.
O mundo globalizado quase hegemonicamente capitalista, aberto, diante dos poucos núcleos socialistas, fechados, sente falta de acordos bem conversados, que permitissem uma articulação de paz mais consistente e estável.
Os pontos de discórdia permanente e focos de guerra eventuais são insistentemente solicitados, pelos organismos de política internacional, para diálogos diplomáticos.
Dos dois últimos séculos até agora, percebe-se cada vez mais claramente a enorme importância que a comunicação social representa. Ela passou a ser reconhecida informalmente como o quarto poder, nas nações democráticas, onde vigoram os três poderes constitucionais: Executivo, Legislativo e Judiciário.
Essa etiqueta exuberante foi imaginada pelo historiador escocês Thomas Carlyle, ainda nos meados do século XIX, como decorrência da função primária da comunicação: é um elemento de estruturação da sociedade, ou seja, formador de uma opinião pública crítica.
Os meios de comunicação têm a grande responsabilidade de, segundo Carlyle, “viabilizar uma participação política ativa, informada e contínua dos cidadãos”, em formulação de projetos e tomada de decisões, quanto à avaliação do desempenho dos candidatos e eleitos, influenciando assim um dos mais decisivos princípios democráticos: a alternância no exercício dos governos.
Os princípios da democracia chegaram também aos casais e famílias. O pai autoritário, assemelhado ao tirano, dono da verdade, de opiniões indiscutíveis está desaparecendo, bem como o filho rebelde que desobedece a toda ordem e não dirige a palavra aos ascendentes.
A missão clínica na prática das terapias de casais e famílias tem confirmado que os pares e filhos do mesmo núcleo que se comunicam mal causam grandes dificuldades para a harmonia conjugal e familiar.
As estatísticas apontam para a enorme importância patogênica da má comunicação na psicodinâmica da família, sugerindo ser esta a maior causa do desentrosamento de esposos, pais e filhos.
Pares e familiares que conversam, por outro lado, capacitam-se para lidar melhor com as frustrações e dificuldades diárias. Eles exercitam em suas casas uma espécie de quarto poder bem orientado, permitindo interações e decisões construtivas, éticas e democráticas.
Pessoas mais habituadas à convivência dialogada tendem a interagir melhor, com espontaneidade e alma livre.
Na intimidade do casal, a liberdade espiritual abre os recados eróticos e engrena os corpos para o aproveitamento crescente da excitação e o enlevo do orgasmo.
A boa comunicação estimula outras iniciativas, compartilhando desejos, fantasias, massagens — inclusive falhas e críticas — e diversas maneiras dos parceiros se tocarem, provocarem, posicionarem e fruírem do prazer carnal e da entrega anímica.
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*Joaquim Zailton Bueno Motta é psiquiatra e sexólogo
Fonte: Correio Popular online, 13/03/201
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