sábado, 13 de março de 2010

O gabinete espiritual de Obama


Perto do final de um primeiro ano cheio de solavancos no governo, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, passou as férias de Natal no Havaí, mas antes de viajar telefonou para um grupo de cinco ministros religiosos para uma recarga espiritual.
Assim como as anteriores orações por telefone, esta foi mais pessoal do que política.
A reportagem é de Daniel Burke, publicada nos sítios Religion News Service e National Catholic Reporter, 10-03-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

"Ele certamente não nos pergunta como nós governaríamos o país ou qual questão deve ser buscada ou não", disse o bispo Charles Blake, da Church of God in Christ, com sede em Los Angeles, que participou do telefonema em dezembro.
Durante 10 minutos, o presidente e os pastores rezaram pela paz, pela recuperação econômica, pela proteção dos soldados norte-americano e para que Obama seja guiado por uma sabedoria e um poder além dele.
Sinais da vida espiritual de Obama têm sido raros desde que ele se tornou presidente. Ele rompeu com o seu antigo pastor de Chicago, o Rev. Jeremiah Wright, depois que o feroz ministro quase descarrilou a campanha de Obama. O presidente norte-americano também não se uniu a nenhum Igreja de Washington.
"Por ter sido queimado – na falta de uma palavra melhor – durante a campanha e em seus primeiros dias de governo, eu não ficaria surpreso se ele fosse discreto a respeito de qualquer revelação de sua vida religiosa", disse Blake.
Mesmo assim, Obama continua defendendo o papel da fé na vida pública, invocando frequentemente o espírito do Rev. Martin Luther King Jr., do teólogo protestante Reinhold Niebuhr e até de São Tomás de Aquino para enquadrar suas políticas em termos morais.
Como os presidentes anteriores, ele busca regularmente o conselho de antigos informantes de Washington, incluindo o fundador da Sojourners [publicação cristã sobre fé e política], Jim Wallis, o rabino reformado David Saperstein e o cardeal aposentado Theodore McCarrick, para dar forma às decisões sobre a guerra do Iraque, a reforma do sistema de saúde e a economia.
Mas Obama também se voltou para um grupos de novos – e relativamente desconhecidos – rostos para lidar com as questões religiosas do seu governo. Eles estão recalibrando o engajamento dos EUA com os muçulmanos, reformando o escritório religioso da Casa Branca e zelando pela alma do próprio presidente. Em um ano de presidência de Obama, cada uma das sete pessoas seguintes se tornou um membro essencial do que se poderia chamar de seu "gabinete espiritual".

Joshua DuBois
Seu cargo oficial é diretor do Office of Faith-based and Neighborhood Partnerships da Casa Branca. Não oficialmente, Joshua DuBois é o office-boy do governo para quase todas os assuntos religiosos. Ele viaja como embaixador itinerante de Obama aos encontros religiosos, faz as conexões entre o presidente e os líderes espirituais para aconselhamento espiritual, ajuda a descobrir Igrejas em Washington para a família presidencial e lida com as frequentes dúvidas da imprensa com relação à fé de Obama.
Antes de entrar na política, DuBois, 27, foi pastor em uma pequena igreja pentecostal em Massachusetts, e sua relação com o presidente guarda vestígios de seu chamado anterior. DuBois envia devocionais diários ao Blackberry de Obama – geralmente um versículo da Bíblia ou um trecho do Livro de Oração Comum da Igreja Episcopal, ou um trecho das palavras dos teólogos Richard e Reinhold Niebuhr, favoritos do presidente.
Mais publicamente, DuBois é o encarregado de supervisionar o escritório religioso da Casa Branca e lidar com seus ramos em 12 agências federais. Com Obama, DuBois está levando o escritório para longe da política do governo Bush de financiar diretamente as ações de caridade religiosas, tentando resgatá-lo das acusações de misturar impropriamente Igreja e Estado.

Denis McDonough

Quando Denis McDonough estava na oitava série, ele ouviu seu irmão mais velho, um padre católico, dar uma homilia toda em espanhol. McDonough em pouco tempo aprendeu espanhol e se tornou um especialista em construir pontes sobre divisões culturais.
Agora, como vice-conselheiro nacional de segurança de Obama e chefe da equipe do Conselho de Segurança Nacional, McDonough está trabalhando para fortalecer os laços internacionais tensionados pela atitude solitária na política externa do governo Bush.
Viajando ao lado do presidente em missões além-mar, McDonough, 40, natural de Minnesota, é um personagem crucial na busca de Obama para se unir aos muçulmanos, encontrar uma causa comum com o Vaticano e restaurar a autoridade moral do país.
McDonough ajudou a preparar o famoso discurso de Obama aos muçulmanos em junho passado, no Cairo, e a forte defesa da política externa norte-americana – incluindo a declaração de "guerras justas" – durante o discurso de recebimento do Prêmio Nobel da Paz concedido ao presidente, na Noruega.
Um componente chave da política externa de Obama é o conceito católico do bem comum, afirmou McDonough. "É uma postura geral para buscar o engajamento para encontrar interesses mútuos, mas ele também reconhece que existe um mal real no mundo que devemos confrontar", disse em uma entrevista no seu escritório da ala oeste da Casa Branca. "O presidente também reconhece que nós somos mais fortes quando trabalhamos junto aos nossos aliados".
Além disso, McDonough explicou a Obama a política interna da Igreja Católica, uma instituição que ele conhece intimamente. Seu irmão Kevin foi vigário-geral da Arquidiocese de St. Paul and Minneapolis, outro irmão é um padre-teólogo, e seu melhor amigo de Washington é padre redentorista. Formado pela St. John's University, de Collegeville, Minnesota, ele ajudou a fazer com que um jovem teólogo da faculdade, Miguel Diaz, se tornasse embaixador no Vaticano em maio passado.

Rashad Hussain

Como Obama busca um "novo começo" entre os EUA e os muçulmanos em todo o mundo, ele frequentemente pede o conselho de Rashad Hussain, um advogado da Casa Branca de 31 anos.
Hussain aconselhou Obama antes de sua primeira entrevista como presidente com a Al Arabiya, um canal de televisão dos Emirados Árabes Unidos. Ele também contribuiu com os dois discursos principais de Obama aos muçulmanos – em Ankara, na Turquia e no Cairo – oferecendo explicações sobre a história do Islã nos EUA e sugerindo versos adequados do Alcorão.
Hussain também viajou ao Oriente Médio com a secretária de Estado Hillary Rodham Clinton, e, mais perto de casa, ajudou a organizar um jantar de Ramadã na Casa Branca, que substituiu a usual multidão de embaixadores com jovens muçulmanos norte-americanos.
Ao nomear Hussain como seu enviado à Organização da Conferência Islâmica, Obama notou que o jovem muçulmano é um hafiz (alguém que memorizou o Alcorão). Mas Hussain e outros afirmaram que os muçulmanos de fora do país muito provavelmente podem preencher as credenciais da Casa Branca e ter acesso ao Salão Oval, já que o presidente busca parcerias na educação, na saúde, na ciência e na tecnologia.
"Por muitos anos, as comunidades muçulmanas foram vista quase que exclusivamente através das lentes do extremismo violento", disse Hussain em uma entrevista. "Não acreditamos que engajaríamos um quarto da população mundial embasados nas crenças erradas de uns poucos".

Melissa Rogers

Quando o governo Obama decidiu que o escritório de fé de Bush estava em uma base legal irregular, ele enviou Melissa Rogers para dar firmeza aos fundamentos.
Durante o último ano, a especialista em Igreja-Estado de 43 anos presidiu o Advisory Council on Faith-based and Neighborhood Partnerships.
DuBois chamou Rogers, a diretora do Centro para Assuntos Religiosos e Públicos da Wake Forest University School of Divinity, "uma das maiores especialistas em fé e política pública do país", que é "respeitada por todos", tanto por liberais quanto conservadores.
Sua perspicácia legal e política ajudou Rogers liderar os 25 membros do conselho, que abrangem uma escala teológica dos batistas aos hindus, a alcançar um consenso sobre mais de 60 recomendações para renovar o escritório religioso da Casa Branca, que foram apresentada na terça-feira 09 de março.
Doze propostas objetivam pôr o escritório sobre fé em uma base constitucional mais sólida ao clarificar suas "confusas" regras, como disse Rogers, sobre instituições de caridade que aceitam a ajuda direta do governo, ao afastar os clientes dessas instituições do proselitismo e ao fazer com que as parcerias entre o governo e os grupos locais fossem mais transparentes. Rogers disse esperar que o escritório de fé ponha em vigor muitas dessas reformas – e que consiga realizá-las.
"Quanto mais conseguimos chegar a um acordo sobre questões de Igreja-Estado, mais duráveis são as políticas", disse Rogers, "e mais tempo e energia temos para focar sobre aquilo que as pessoas têm necessidade".

Joel Hunter e Sharon Watkins

Quando Obama quer rezar reservadamente, ele chama seguidamente Joel Hunter, um pastor de uma mega-Igreja da Flórida, e a Rev. Sharon Watkins, presidente e ministra-geral da Christian Church (Disciples of Christ).
Politicamente, Hunter, um republicano registrado, e Watkins, que lidera uma denominação inclinada aos liberais, podem nem sempre concordar, mas, como Obama, ambos estão comprometidos em transcender as barreiras tradicionais.
Hunter, 61, é pastor da Northland Church, com 12 mil membros, nos arredores de Orlando, e lidera uma nova safra de pastores centristas que pedem um cessar-fogo nas guerras culturais. Ele também está estimulando para que haja uma ampliação da agenda evangélica, que inclua questões como a pobreza, a imigração e o meio ambiente.
Watkins, 55, que Obama deu uma ajuda para que fosse a primeira mulher a pregar no Culto de Oração Nacional após a posse no ano passado, lidera uma denominação em que a unidade cristã e a superação das divisões são centrais ao seu DNA.
Watkins chamou a atenção de Obama durante a campanha presidencial de 2008, quando ela encerrou um tenso encontro entre Obama e os líderes cristãos com uma oração que pareceu unir a mistura de liberais e conservadores presentes na sala.
"Tentar unir as pessoas está em seu sangue", disse Verity Jones, ex-editor do DisciplesWorld, jornal da denominação.
Tanto Hunter quanto Watkins se recusaram a comentar sobre seus papéis na vida espiritual de Obama, invocando o raro privilégio pastor-presidente. "Ele leva o seu papel muito a sério", disse a porta-voz de Hunter, Robert Andrescik. "Ele simplesmente não fala sobre isso. Até porque ele é o presidente".

 
Tenente Carey Cash

O pastor que mais frequentemente tem pregado para Obama desde que se tornou presidente é um capelão do Exército da Igreja Southern Baptist de quase dois metros de altura, cujo tio-avô foi o lendário músico country Johnny Cash.
Assim como o presidente George W. Bush, Obama geralmente prefere prestar culto fora da região de Washington, na privacidade e no retiro da Capela de Camp David's Evergreen, onde Cash "faz um sermão tão poderoso como eu nunca havia ouvido há um bom tempo", disse Obama.
Os oficiais da Casa Branca dizem que Obama prestou culto na privacidade de Maryland mais de seis vezes, e suas filhas, Sasha e Malia, já participaram da escola dominical lá.
Antes de seu período em Camp David, Cash, 39, era um jogador de futebol americano pelo Citadel [faculdade militar da Carolina do Sul], e capelão do 1º Batalhão dos Marines em 2003, na Guerra do Iraque, período no qual batizou 59 soldados, incluindo um no ex-palácio presidencial de Saddam Hussein, em Bagdá.
Nascido em Memphis, Cash cresceu em uma família profundamente religiosa – sua mãe é uma autora cristã – e tem duros pronunciamentos sobre os muçulmanos, tendo escrito em seu livro de 2004 que o Islã, "desde o seu surgimento, tem usado a ponta da espada como o meio para converter ou conquistar aqueles que possuem convicções religiosas diferentes".
Os três anos de Cash em Camp David iniciaram em 2009, por isso Obama tem ainda cerca de dois anos para ouvi-lo pregar, mas eles não formam a costumeira dupla pastor-paroquiano. O ex-capelão de Camp David diz que geralmente há pouca interação entre o presidente e o pastor fora dos cultos.
"Nós costumamos dizer às pessoas que o nosso trabalho é dirigir este lugar como um resort de cinco estrelas", disse Patrick McLaughlin, que foi capelão em Camp David entre 2002-2005. "Uma das coisas que você valoriza quando sai de férias é a paz e o silêncio".
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Fonte: IHU online, 13/03/2010

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