sexta-feira, 12 de março de 2010

O celibato dos suspeitos

Filippo Di Giacomo* 
"Existe uma latente e obscura veia fascista nessa persistente tentativa de querer exorcizar no mundo clerical um problema, o do uso e do abuso de crianças, que, em nível global, está vulgarmente estruturado em toda categoria profissional e abraça a pedofilia assim como a pornografia, o turismo sexual, a prostituição, a exploração do trabalho infantil, a mendicância escravista."


Segundo o jornalista, "nos mais de 80 casos de abusos denunciados na diocese de Boston, a primeira circunscrição católica a ter chegado à mídia por causa da pedofilia difundida, só quatro foram reconhecidos culpados. Na Irlanda, as duas comissões governamentais que investigaram os cerca de 2.800 casos denunciados, só 10% foram consideraram com fundamento. Isso quer dizer que 90% das acusações, mesmo que fortemente midiatizadas, eram falsas".

Eis o texto.

Também na Alemanha, assim como nos EUA e em outros países europeus, os bispos católicos objetaram sobre o desmantelamento do estado social. A uma Merkel intencionada a vender o welfare por trinta moedas pagas pelos liberais à atual coalizão de governo, os bispos recordaram o significado que a locução "cristão-social" sempre representou para a identidade e as políticas do partido em nome do qual ela foi eleita.

Muito rapidamente, chegou a resposta dos "liberais" alemães: seria melhor que a Igreja se ocupasse dos seus problemas internos. E qual problema, midiaticamente falando, é mais conveniente do que as intemperanças sexuais do clero? Circula pelo mundo um par de advogados norte-americanos especializados na questão, e o seu desembarque na Itália já está programado para os próximos meses. É provável, portanto, que, depois do episódio irlandês, alemão, austríaco e holandês, teremos direito a um episódio italiano sobre os lugares comuns do já pouco original debate sobre o que a Igreja é e sobre o que deveria fazer.

Nestes dias, já se leem argumentações inclinadas a demonstrar como os atos de pedofilia clerical estariam relacionados ao celibato dos padres, a uma regressão sexual induzida, referente à formação oferecida nos seminários menores (praticamente desaparecidos há 40 anos), segundo um modelo imposto pelo Concílio de Trento, na segunda metade do século XV.

Na realidade, o celibato existe desde 306, desde o Concílio de Elvira (nome de Granada na Hispânia romana), na Igreja do Ocidente tornou-se regra indiscutível ainda no século IV, quando Agostinho sugeriu a adoção da disciplina monástica a todos os seus padres. O celibato deu prova de poder garantir uma estrutura psíquica que favorece a independência e a disponibilidade existencial e continua representando um dos carismas que a Igreja Católica testemunha no cristianismo global.

E também no sacerdócio célibe, os homens sadios nunca conheceram o desenvolvimento de atrações eróticas com relação a crianças como resultado da abstinência. Nos mais de 80 casos de abusos denunciados na diocese de Boston, a primeira circunscrição católica a ter chegado à mídia por causa da pedofilia difundida, só quatro foram reconhecidos culpados. Na Irlanda, as duas comissões governamentais que investigaram os cerca de 2.800 casos denunciados, só 10% foram consideraram com fundamento. Isso quer dizer que 90% das acusações, mesmo que fortemente midiatizadas, eram falsas.

Existe uma latente e obscura veia fascista nessa persistente tentativa de querer exorcizar no mundo clerical um problema, o do uso e do abuso de crianças, que, em nível global, está vulgarmente estruturado em toda categoria profissional e abraça a pedofilia assim como a pornografia, o turismo sexual, a prostituição, a exploração do trabalho infantil, a mendicância escravista.

Não é por nada que, nesta terça-feira, o padre Federico Lombardi lembrou que: "Na Áustria, em um mesmo período de tempo, os casos confirmados em instituições ligadas à Igreja foram 17, enquanto houve 510 em outros ambientes. Também é bom se preocupar com esses".

Pode-se notar como a onda europeia de midiatização de massa dos abusos católicos ocorra em um contexto ambíguo. De um lado, é quase certo que Bento XVI manifestou sobre o assunto uma firmeza disciplinar que não deixa dúvidas nem dentro, nem fora da Igreja. De outro, a virulência dos ataques anticatólicos são enfatizados pela imagem de isolamento do Pontífice, devida verdadeiramente a uma máquina curial e administrativa que não lhe parece fiel e que é descrita à opinião pública como não controlada por ele.

No jornalismo eclesiológico e canonístico fora da Itália, desde o final dos anos 60, se questiona (é famoso o artigo que significativamente tinha o título "L'Eglise à l'heure du management", A Igreja na época do 'management') se o catolicismo ainda precisa de uma Cúria que ocupa cerca de 2.800 pessoas, impermeável às voluntariosas tentativas de Paulo VI e João Paulo II para torná-la eclesialmente compatível com a Igreja real, capaz (como demonstram os casos de certos "cavalheiros" do Papa) só de internacionalizar os atávicos privilégios e vícios.

No editorial de setembro de 1997, o então diretor de Jesus (revista mensal dos padres paulinos italianos), fez ricochetear na Itália uma proposta muito séria, levada adiante por alguns bispos norte-americanos: abolir a Cúria sem mais demora. Então, o diretor perdeu seu posto. Agora, se o seu sonho se tornasse realidade, quem bateria palmas seria, provavelmente, a Igreja inteira.
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*Filippo Di Giacomo, padre, jornalista e juiz canônico que viveu durante 11 anos como missionário no Congo, publicada no jornal L'Unità, 10-03-2010.
A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Reproduzida por IHU online, 12/03/2010

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