segunda-feira, 10 de maio de 2010

José Gomes Temporão - Entrevista

‘Sexo? eu tento cumprir à risca’

Temporão assume a polêmica e analisa a saúde do País

A primeira pergunta para José Gomes Temporão não podia ser outra: “O sr. segue sua recomendação de fazer sexo cinco vezes por semana?”. Ele sorri e despista: “Eu tento e me esforço…”. Casado há 35 anos e pai de quatro filhos, o ministro da Saúde conta que a famosa sugestão, dada na semana passada, não veio por acaso. A ideia era mesmo chamar a atenção para a campanha preventiva do governo contra a hipertensão. “E sim, sexo faz bem a saúde, e isso é científico.”
Durante almoço com a coluna, em uma churrascaria de São Paulo, o ministro se mostrou disciplinado: comeu pouca carne vermelha e muita salada. “Estou no meu peso. Não fumo e bebo um vinhozinho. Tento ter uma alimentação equilibrada. Tenho uma cabeça muito boa. Durmo como um anjo, sem tomar remédio.”
Nascido em Portugal, filho de um casal de imigrantes, Temporão chegou ao Rio com um ano de vida. Ex-comunista, hoje no PMDB, o ministro jamais disputou cargo eletivo. Nessa entrevista, ele fala sobre vida saudável, faz um diagnóstico do SUS e elogia seu antecessor, José Serra.

O sr. segue própria sua recomendação de fazer sexo cinco vezes por semana?
Eu tento, me esforço para seguir à risca (risos). Perguntaram à minha mulher se ela segue e a resposta foi ótima. “Ele é assim, animado com a vida.” É claro que cinco vezes por semana não é uma receita prescritiva, mas uma maneira de chamar atenção. Cada casal tem seu ritmo.

Então a recomendação é para valer?
Não estou brincando, sexo faz bem, sim. Depois do riso, todo mundo saiu atrás da parte cientifica. A repercussão foi fantástica. Muita gente na rua me diz que está seguindo a prescrição. Alguns meses atrás, o Ministério da Saúde da Grã-Bretanha colocou em seu sítio na internet: “Sexo faz bem à saúde”.

De que morrem os brasileiros hoje?
De doença crônica. Pela ordem: enfarte agudo no miocárdio, AVC , câncer e causas externas, como homicídios e acidentes de trânsito. Houve uma mudança profunda no perfil das doenças no Brasil. Os brasileiros, hoje, adoecem e morrem da mesma coisa que os americanos, franceses e suecos.

Acha que a rotina do brasileiro é saudável?
A organização da família brasileira também está mudando. A mulher está trabalhando mais e não tem mais tempo para cozinhar. Tanto é que o consumo de feijão está caindo. Para fazer feijão tem que catar, limpar, temperar e cozinhar. Por outro lado, aumenta o consumo de comida semipronta, que tem alta concentração de sal e gordura. Aumentou também o sedentarismo. Essa equação é o grande desafio. A população precisa ficar consciente de que precisa fazer exercício, manter o peso, não fumar, beber moderadamente.

O sr. adota esses cuidados?
Eu corro desde 1973. Eu corria depois que terminava a minha sessão de análise, para ficar trabalhando aquele material todo. Continuo assim até hoje.

Por que o sistema de saúde no Brasil ainda é tão sofrível?
O IBGE informa, no PNAD, que 86,4 % dos entrevistados consideram o atendimento bom ou muito bom. Mas existem fragilidades, é claro.

Quais?
São estruturais e de financiamento. O sistema de saúde público brasileiro está correndo sério risco de se inviabilizar. Sua participação no gasto total País é de 40%. Quem financia a saúde no Brasil são as famílias e as empresas. O Estado só entra com 40% do gasto. Na Inglaterra, 80% do gasto total é público. Isso entra em conflito com o que está na Constituição brasileira. Se o SUS não tiver uma solução urgente de financiamento, vamos ter um colapso no sistema público. O que seria mau para a classe média, que usa o SUS e nem sabe.

Como assim?
Se você precisar de um transplante, os planos só cobrem os de rim e de córnea. O resto é tudo SUS. Se tiver uma doença crônica grave, que custa R$ 10 mil, é o SUS que garante. Vacinas também. E tem o atendimento de emergência, o SAMU. Aids é outro bom exemplo.

Por que falta dinheiro no SUS?
É uma conta simples. Enquanto o gasto anual per capita do SUS em 2007 foi de R$ 650, as famílias de classe média gastaram R$ 1.450, em média, pagando plano. Além disso, os gastos das famílias com assistência médica podem ser abatidos do imposto de renda. Há um forte subsídio para a classe media. A receita federal autorizou que cirurgia plástica e estética podem ser abatidas. Foi na semana passada. O pobre está financiando a correção do nariz da mulher de classe média.

De quanto é essa renúncia?
A renúncia fiscal com abatimento autorizado de despesa médica vai a R$ 10 bilhões por ano.

Pensou em sair candidato?
Muita gente especulou isso, mas estou aqui, me transformando em um dos ministros da saúde mais longevos do Brasil. Nos últimos 20 anos, a média foi menos de um ano no cargo.

É preciso ser médico para ser ministro da Saúde?
Não necessariamente. Olhe o exemplo do Serra. Ele não é médico, mas montou uma boa equipe e foi um bom ministro. Outro exemplo é o Palocci. É um sanitarista que, na Fazenda, foi muito bem avaliado.

Acha boa a relação atual entre médicos e pacientes?
Essa relação está se complicando com a especialização dos cursos. O médico está virando um tecnólogo – e isso é muito ruim, empobrece a medicina. Por isso o sucesso das práticas ditas alternativas, como acupuntura e homeopatia.

Fala-se muito em investir em prevenção. É uma boa solução?
Essa coisa de que, se investir em prevenção, sobra dinheiro para o resto é romântica e estereotipada. O fato é que a Medicina é cada vez mais cara.

O que acha da eutanásia?
É uma decisão que, ao meu ver, não compete ao Estado, mas à família e ao doente. O Estado não tem que se meter nisso.

O sr. está empenhado em criar um complexo industrial da saúde no Brasil. Não estaria invadindo um espaço do Ministério do Desenvolvimento?
Com certeza. E isso foi bom. Há duas indústrias na fronteira do conhecimento: a bélica e a da saúde. E a da saúde significa entre 8% e 10% do PIB – 10 milhões de empregos diretos e indiretos. O Brasil, por uma série de questões históricas, a partir dos anos 80 destruiu sua capacidade de desenvolver tecnologia. Inviabilizou seu parque produtivo e hoje importa praticamente tudo. O que me preocupa é a dependência de conhecimento cada vez maior. Nosso objetivo é colocar a saúde como uma área estratégica da política de desenvolvimento.
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por Direto da fonte

Por Sonia Racy com Pedro Venceslau
Fonte: Estadão online, 10/05/2010

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