Amy Chozick*
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Eles mal aprenderam a amarrar seus sapatos e a usar o banheiro, mas já representam um dos grupos demográficos mais importantes da televisão. As crianças em idade pré-escolar, de dois a cinco anos de idade, estão se tornando um alvo cada vez mais apetitoso para grandes empresas de comunicação.
Um estudo da Nielsen mostra que as crianças dessa faixa etária passam, em média, mais de 32 horas por semana em frente da TV nos Estados Unidos.
Armadas com estudos e estatísticas como essa, as empresas do ramo se preparam para a próxima grande batalha. Enquanto elas lutam, dois pontos de vista bastante diferentes sobre as crianças e a televisão emergem.
Enquanto preparam sua mais nova investida para conquistar esse público, executivos da Walt Disney Co. dizem que algumas das TVs para criancinhas favorecem o currículo em detrimento da narrativa. Eles argumentam que às vezes é lição demais e diversão de menos.
Eles se oferecem como uma alternativa ao canal Nick Jr. da Nickelodeon, que enfatiza o aprendizado. A Disney afirma que os pais de hoje estão prontos para uma mudança. Numa era de videogames e iPads, as crianças podem aprender o ABC em qualquer lugar. O que falta são boas historinhas à moda antiga que as crianças podem repetir umas às outras, fingirem ser as personagens e assistir inúmeras vezes.
O que está em jogo é muito mais do que os US$ 276 milhões que anunciantes gastaram no ano passado com comerciais durante os programas de TV infantil dos EUA. Estúdios de cinema e empresas de fast-food foram os que mais gastaram, segundo a Kantar Media. As vendas de brinquedos, livros e DVD de "Dora a Exploradora", do Nick Jr., geraram mais de US$ 11 bilhões em vendas ao redor do mundo desde 2002, informa a Nickelodeon. O valor da lealdade futura à marca é incalculável.
"As crianças em idade pré-escolar,
de dois a cinco anos de idade,
estão se tornando um alvo
cada vez mais apetitoso
para grandes empresas de comunicação."
A Nickelodeon, uma divisão da Viacom Inc. que sacudiu a TV para crianças mais velhas no início dos anos 90, começou a conquistar os pré-escolares alguns anos depois. No período de 30 dias até 17 de outubro, nove dos dez programas de TV paga mais vistos nos EUA entre os espectadores de dois a cinco anos eram da Nickelodeon ou Nick Jr., que no país está disponível em 77 milhões de lares. "Dora" e a série "Go Diego, Go", derivada dela, ensinam espanhol às crianças. "Team Umizoomi" acompanha os curiosos Milli, Geo e Bot enquanto eles solucionam problemas matemáticos.
Um dos programas de maior audiência entre os pré-escolares no Nick Jr. é "Ni Hao, Kai-Lan", no qual a personagem Kai-Lan Chow, uma menina de seis anos com grandes olhos e rabo-de-cavalo, ensina mandarim às crianças. A série atrai cerca de 828.000 espectadores de dois a cinco anos, em comparação com 753.000 para "A Casa do Mickey Mouse", a série da Disney de maior audiência entre os pré-escolares.
A Disney, que construiu seu império contando historinhas às crianças e quer aproveitar suas vantagens, precisa fazer algo. Para apoiar sua decisão de se concentrar em histórias simpáticas em vez de currículo básico, a empresa se baseia num estudo de seis meses com 2.200 pais de crianças em idade pré-escolar que encomendou e realizou no ano passado. Os pesquisadores da Disney constataram que, quando os pais foram perguntados o que mais queriam para seus filhos, a resposta mais comum foi que eles fossem felizes.
"Eles não querem apenas
criar crianças inteligentes
- querem filhos que sejam felizes,
que tenham habilidades sociais
e possam se dar bem
com outras crianças
e adultos."
Ellen Galinsky, autora de "Mind in the Making"
É uma grande mudança em relação a cinco ou dez anos atrás, quando habilidades escolares e cognitivas lideravam a lista dos pais, diz Nancy Kanter, diretora da Disney Junior Worldwide. "Não foi 'Quero que eles contem até 100' ou 'Quero que eles soletrem seu nome', ou 'Quero que eles falem chinês'", diz ela.
Muitas pessoas, claro, acham que as crianças nem deviam assistir à TV, muito menos ser submetidas a comerciais. O clássico "Vila Sésamo", que tem patrocínios de empresas mas não comerciais, foi baseado em educação desde o começo, com Come-Come, Garibaldo e amigos ensinando números, letras e comportamento social.
A nova iniciativa da Disney para as crianças começa em fevereiro, quando ela lançará o Disney Junior, um novo bloco de dez horas de programação diurna no Disney Channel voltado aos pré-escolares. O Disney Junior substituirá o "Playhouse Disney" e no começo de 2012 se tornará um canal de TV paga próprio, que ficará 24 horas no ar.
A Nickelodeon se negou a comentar os planos da Disney, mas afirma acreditar que a melhor maneira de engajar as crianças em idade pré-escolar é por meio de programas educativos que ofereçam oportunidades de se aprender habilidade escolar básica, principalmente por meio de jogos interativos. "Fazemos com que as crianças se sintam importantes e espertas - é nosso molho secreto, que ninguém mais descobriu", diz Brown Johnson, diretora de animação da Nickelodeon/MTV Networks Kids and Family Group. "As mamães esperam que seus filhos tenham programação vitaminada", acrescenta.
A Disney afirma que seus pesquisadores conversaram com professores de pré-escola e jardim de infância e constataram que as crianças tinham fácil acesso a fatos básicos, mas não tinham habilidades sociais como a de saber compartilhar as coisas ou saber ouvir. "Jake and the Never Land Pirates" (Jake e os Piratas da Terra do Nunca), uma nova série que será lançada em fevereiro, acompanha um grupo de crianças que se metem em aventuras com o Capitão Gancho. Embora Gancho seja um vilão, Jake o convida a brincar no fim dos episódios, uma importante lição social, afirma a Disney.
Assim como o Nick Jr. tem programas como "Backyardigans" que enfatizam a narrativa, a Disney não evita de todo o conteúdo educativo. Em "Jake", as crianças recebem dobrões de ouro como recompensa em cada episódio, recurso narrativo que ajuda as crianças a aprenderem a contar. Num episódio futuro de "A Casa do Mickey Mouse", Mickey e sua turma fazem uma dança em quadrado, seguida por uma em triângulo e outra em círculo, para ensinar formas. Outras novas séries, como "Mickey Mousekersize" e "Urso: Agente Especial", dão dicas para uma vida saudável.
Mas alguns pais dizem estar cansados de se sentir culpados pela maneira como criam os filhos. Eles ficaram céticos em relação a especialistas que dizem "Não, não, essa é a maneira errada" ou, ameaçadoramente, "Tudo está definido quando seus filhos têm três anos", diz Ellen Galinsky, autora de "Mind in the Making" (Mente em Formação) e presidente e co-fundadora do Instituto Famílias e Trabalho, um centro de pesquisa sem fins lucrativos. "Eles não querem apenas criar crianças inteligentes - querem filhos que sejam felizes, que tenham habilidades sociais e possam se dar bem com outras crianças e adultos."
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* The Wall Street Journal
Fonte: Valor Econômico online, 20/11/2010
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