sábado, 15 de janeiro de 2011

Ego Executivo


O Ego pode ser definido como a soma dos pensamentos, idéias, sentimentos, lembranças e percepções sensoriais. Faz parte de todos nós e, na medida certa, é arma poderosa nas relações humanas.Porém, há limites a serem respeitados, sob o risco de o ego virar uma armadilha contra nós mesmos. No meio executivo, onde há uma concentração de poder, e as tomadas de decisões podem interferir na vida de muitos, essa exacerbação é particularmente danosa. Os profissionais precisam ficar alertas para não incorrer no erro de pensarem ser maiores do que as próprias companhias que representam.
Um exemplo emblemático é o de Kenneth Lay. O gigantesco ego do superexecutivo norte-americano, como reportou a revista "Veja" e outras publicações ao redor do mundo, ajudou a desintegrar a mais poderosa distribuidora de energia elétrica do planeta, a Enron. A empresa, após 16 anos de operação, quebrou. Lay, que morreu em 2006, respondendo a processos de fraude, geriu sozinho o conglomerado, sem partilhar com a alta cúpula os resultados financeiros que culminaram em sua concordata.
O caso de Lay ganhou os holofotes porque provocou a derrocada um gigante mundial, mas os problemas que levaram a isso são mais comuns do que se imagina nas organizações, sejam elas de qual porte for. "O modelo social que o capitalismo constrói favorece o autocentramento, porque preconiza um acúmulo individual de capital (material e cultural) em detrimento de relações de solidariedade, incentivando comportamentos mais narcisistas", explica Marcelo Ribeiro, professor doutor do Departamento de Psicologia da USP.
E quanto mais em evidência a organização, maior a armadilha do ego. O diretor-geral da Rede Globo, Jorge Fernando, de 53 anos, dos quais 30 de carreira, e com 30 novelas no currículo, fala com tranqüilidade sobre as muitas crises de ego no passado. Gritava desnecessariamente com a equipe, por exemplo, na hora de solicitar alguma tarefa (leia entrevista na página 21). Mas ao longo do tempo percebeu que essa postura o deixava infeliz. "Era um "nervosinho de merda". Na verdade, eu estava inseguro", lembra. Quando assumiu o cargo mais almejado da sua área, Jorge Fernando tinha apenas 30 anos.
No mundo corporativo, a ânsia de controle, muitas vezes exigida como estratégia de gestão, prioriza estilos autocráticos, que tendem a valorizar líderes mais narcisistas: se estabelece uma relação de dependência, em que o líder passa a impressão de extrair o máximo de si, ao mesmo tempo em que exige o máximo de seus subordinados - o que garantiria produtividade e controle, pretensamente tomados como metas inquestionáveis para uma organização. "Se pensarmos que a concepção do que é um transtorno é uma construção psicossocial, e não uma essência constitutiva, ou seja, varia de acordo com o contexto e o momento histórico, podemos dizer que o narcisista está mais adaptado ao que parece ser requisitado pelo mercado de trabalho atualmente, comenta o professor Marcelo Ribeiro.
Priscila Oliveira, psicóloga pós-graduada pelo Mackenzie, que atua há 11 anos na área de Recursos Humanos, admite que o mercado acolhe bem os egocêntricos: "O egocêntrico chega a altos patamares nas empresas; são profissionais destemidos, ousados". Mas, pondera que esses profissionais tendem a perder a noção do todo, e também de se autoavaliar.
QUANDO O EGO ATRAPALHA

Um case para ilustrar é o de um executivo brasileiro que trabalhava na sede inglesa de uma grande organização, e tinha reporte duplo - um chefe nos EUA e um chefe na Alemanha. Seu chefe na Alemanha, muito centralizador, queria que todas as informações passassem por ele em primeira mão, e tomou providências: solicitou à companhia que transferisse o executivo para a Alemanha. A mudança criou transtornos. A família do executivo, já adaptada à Inglaterra, não o acompanhou. Ele percebeu que não seria inteligente ser "rebelde" nessa hora; o mais sensato a fazer era mudar-se sozinho.
O profissional foi alocado em uma sala ao lado de seu chefe alemão. Mesmo assim, tomava a precaução de informar por escrito tudo o que ocorria, para que o chefe tivesse a sensação de que todas as idéias e resultados da área tivessem partido dele. Essa era uma necessidade do chefe narcisista. Foi preciso tempo, paciência e muito trabalho até que o executivo fosse reconhecido por seus méritos e recompensado, alcançando altos postos na organização.
ÍCONES

O narcisismo é um problema recorrente em cargos de liderança. Além de Kenneth Lay, da Enron, há outros ícones incontestes. Há uma piada que circula no meio empresarial, e pergunta: qual a diferença entre Deus e Larry Ellison? A resposta: Deus não pensa que é Ellison. Principal executivo e maior acionista da Oracle, empresa de softwares, Ellison é mundialmente conhecido por ter um ego maior que sua fortuna. Há relatos de que o bilionário tem acessos de fúria quando um subordinado aparece mais do que ele.
Lay, Ellison e o chefe do executivo citado expõem uma realidade que vem se evidenciando nos últimos anos: o mercado incentiva o narcisismo e o individualismo nas organizações.
Diretora-presidente da Samcil Solidária, braço de responsabilidade social da Samcil Planos de Saúde, Dirce Chagas da Costa, 77 anos, já passou por cargos executivos ao longo de sua carreira e, com toda sua experiência, avalia que o egocentrismo, no final das contas, é uma barreira para o crescimento profissional. "Alguém que pensa que sabe tudo não vai chegar a lugar nenhum, de fato". Para ela, o ego elevado até pode ser uma ferramenta para um executivo atingir altos postos, o problema está na sustentabilidade desta posição.
Além de não se sustentar por si só, o executivo de ego elevado pode estar escondendo algo que esta pessoa não tem: talento. Essa é a opinião de Roberto Tranjan, diretor da Cempre - Educação nos Negócios. "Quem tem talento, sabe fazer a conexão entre o mundo de dentro [o ego] e o mundo de fora [os demais executivos e a empresa], passando por cima do egocentrismo", explica. "E as grandes corporações demandam, cada vez mais, descentralização e maior participação."
LADO POSITIVO

Embora o ego exacerbado seja visto por muitos como algo que atrapalha o desenvolvimento profissional, gestores de RH enxergam alguns pontos positivos nessa característica. "Depende da orientação que essa pessoa vai receber e também do estilo da empresa", avalia Maíra Montezel, gerente de Comunicação e RH para América Latina da Edwards Lifesciences, empresa da área de saúde. "O que um gestor de RH deve fazer é orientar o profissional a tirar benefícios dessa qualidade, deixando claro que há limites dentro da corporação." Segundo Maíra, a melhor característica de um líder com ego exacerbado é a autoconfiança, que pode ajudar a pessoa a conquistar seus objetivos, também auxiliando a empresa a alcançar suas metas.
Com mais de 3.000 colaboradores, o hospital Sírio-Libanês é o tipo de instituição que procura evitar a exacerbação dos egos de seus profissionais. Seu superintendente de gestão de pessoas e qualidade da instituição, Fábio Patrus, destaca que o trabalho em equipe cria uma situação inevitável de competição. "Procuramos combinar valores, agregando ao modelo empresarial nossas características históricas de filantropia, diferentemente de corporações que só pensam na competição."

POR FALAR EM EGO

O ego pode ser entendido como uma autoimagem, que construímos ao longo da vida, por meio de nossas relações com o outro e com o mundo. "Essa representação do eu é marcada pela psicodinâmica das relações entre um ego real (necessidades reais - o que eu sou), um ego ideal (necessidades impostas socialmente - o que outro gostaria que eu fosse) e um ideal de ego (desejos construídos na relação com o mundo - o que eu gostaria de ser)", ensina o professor Marcelo Ribeiro. O ego seria a resultante dessas três dimensões em contato com a realidade externa e com o mundo interno de cada um. Ele permeia nosso comportamento e nossas formas de relação com o mundo, nosso grau de autoconfiança, de satisfação e de tolerância à frustração.
Em nosso desenvolvimento subjetivo e cognitivo, cons-truirmos gradativamente nossas formas de assimilação dos objetos do mundo e nossas estratégias para lidar com esse mundo. Percebemos que nossa vida depende de nós e dos outros. O egocentrismo e o narcisismo são importantes processos de aprendizagem, que tendem a ser superados em nosso desenvolvimento psíquico. "Quando a pessoa tem dificuldade para superar o egocentrismo, terá também dificuldades de comunicação, cooperação e de lidar com os conflitos oriundos da relação com os outros, ficando mais fragilizada e suscetível às frustrações", informa o professor.
A principal característica de gestores narcisistas é a paixão por projetos grandiosos. São profissionais ousados e criativos, e, quando acertam, costumam apresentar resultados espetaculares. Quando tomam a decisão errada, porém, o impacto também é grande. Como o Narciso do mito, são apaixonados pela própria imagem, isto é, gostam de visibilidade. Mas perseguir decisões de impacto é uma escolha arriscada e pode ruir profissionalmente um executivo - como Narciso, que de tanto contemplar sua imagem, definha até morrer. SEM
CHILIQUE

É o que ensina o diretor Jorge Fernando para quem os tempos de chiliques e de superegos nas gravações foram substituídos pela boa educação e pelo respeito às equipes
O diretor-geral da Globo, Jorge Fernando, falou com a nossa reportagem em um sábado, dia 29 de março, quando fez 53 anos. À noite, comemorou no palco, cercado de amigos, depois de mais uma apresentação da comédia Boom, que ele protagoniza e que estava em cartaz no Rio. Ao mesmo tempo, os cinemas exibiam o seu primeira longa, Sexo Amor e Traição, com Malu Mader, Fábio Assunção, Reynaldo Gianecchini. Em outubro já estréia o segundo, Guerra dos Rocha, com Ary Fontoura, Marcello Antony, Diogo Vilela, Taís Araújo.
Jorge Fernando também prepara a estréia de Escândalo, um novo espetáculo que, Segundo ele, será o show da sua vida. A última novela das 7 da Globo, Sete Pecados, era deste dono de uma carreira marcada pela irreverência. Jorginho, como os atores o chamam, está acostumado com o sucesso nesses mais de 30 anos de carreira, mais de 30 novelas, mais de 20 peças de teatro, grandes shows, programas etc. Na entrevista que segue, ele fala sobre o ego na profissão - o dele, inclusive. Conta que a espiritualidade o levou ao doce sabor do sucesso mas que, no passado, este já teve um gosto amargo. "Eu chegava em casa e não estava feliz." Confira o papo:

Canal Rh: O ego é uma das questões mais difíceis de lidar no meio artístico?
Jorge Fernando: Claro que é. Tem gente que fica a vida toda na análise por causa dele. É preciso aprender a lidar com o ego, porque ele pode ser destrutivo, mas também pode ser evolutivo. Quando eu tinha 15 anos, sonhava ser o que eu sou hoje. Sou muito feliz, mas eu não ponho o meu ego na frente de qualquer decisão que tenha de tomar. Se fizer isso, serei um ego besta, egoísta, que se acha melhor do que os outros e aí eu não vou evoluir. O ego posi-tivo tem consciência do seu ofício e sabe que é preciso melhorar sempre.

Canal Rh: Você já viu muitos bons artistas terem a carreira destruída por causa do ego?
Jorge Fernando: Todos nós já vimos isso acontecer com carreiras de pessoas brilhantes, não só no meio artístico, mas no meio político, no meio dos negócios, em todas as áreas. Pessoas que a gente admirava, gostava de ouvir e que hoje nos decepcionam com seus gestos.

Canal Rh: Quando você está dirigindo um ator, quando é que o ego dele atrapalha?
Jorge Fernando: Quando eu dou um toque sobre alguma coisa que ele esteja fazendo e ele não ouve porque tem certeza absoluta de que o certo é aquilo que ele quer. O cara vive no mundo dele, sem ouvir o outro. Ele trava a engrenagem e as próprias chances de encontrar seu caminho. Ninguém quer saber do ator que é chato, metido e não gosta de nada. Ele mesmo impede a criação da equipe. A figurinista, o maquiador, todo mundo vai fazer qualquer coisa que ele queira só para se livrar dele logo.

Canal Rh: E quando o ego ajuda?
Jorge Fernando: Quando o ator tem consciência do seu ofício, porque aí ele sabe que tem de evoluir sempre. E tem de ter o mínimo de educação, gostar das outras pessoas.

Canal Rh: Você teve muitas crises com o seu próprio ego?
Jorge Fernando: Muitas, quando eu gritava com as minhas equipes sem necessidade, por exemplo. Eu ia pedir para tirarem um fio de um determinado lugar e eu gritava, como se tivesse dando aquela ordem pela décima vez e era a primeira vez. Eu enlouquecia, parecia um monstro, mas chegava em casa e não estava feliz. Não era aquilo que eu queria.

Canal Rh: Você é conhecido como uma liderança que lida bem com várias equipes ao mesmo tempo, cada uma com características, talentos e propostas diferentes. Qual é a receita?
Jorge Fernando: Sim eu me dou bem, mas eu vivi as duas faces da moeda, as duas formas de liderar. Tive um sonho, batalhei por ele e o conquistei. Com 30 anos, eu era diretor-geral da Globo. Mas aí eu vi que não estava preparado, que era um "nervosinho de merda". Na verdade, eu estava inseguro. Eu ganhava as pessoas porque tinha uma chama positiva dentro de mim, sempre tive. Como sou absolutamente apaixonado pelo meu trabalho, tenho uma energia muito grande que me leva a ver rapidamente uma saída para qualquer problema. Isso me segurava, me fazia ganhar as pessoas, mas eu chegava em casa e não estava feliz. Daí dei uma parada, voltei a trabalhar melhor meu lado espiritual e mudei meu jeito de liderar. Hoje, eu posso dizer que estou saboreando de verdade a realização do meu sonho. Naquela época não.

Canal Rh: Qual é a importância da espiritualidade no desenvolvimento da liderança?
Jorge Fernando: A espiritualidade é fundamental, não importa qual seja a religião. Mudam-se os ritos mas a busca pelo conhecimento é o que vale. No meu caso, eu sou umbandista.

Canal Rh: Acha importante passar esses valores espirituais para seus liderados?
Jorge Fernando: Muito, e o líder faz isso mostrando que gosta das pessoas, que tem prazer em estar com elas e tratando-as com o mínimo de educação. Então, nada de ficar batendo o pé e dando ataques. Dá licença e por favor, porque não tem mais espaço para a tirania.

Canal Rh: Lidando com tantos egos, nem sempre deve ser fácil manter o controle, né?
Jorge Fernando: Não é fácil, porque você tem que contar com milhões de coisas dando certo e nem sempre tudo sai do jeito que você idealizou. Mas o líder, a chefia tem que contar com isso e estar preparada para agir em busca de solução em vez de ficar dando chilique. É muito tentador brincar de Hollywood, mas Hollywood acabou.

Canal Rh: Então, a época do diretor impiedoso que gritava e as pessoas viam nisso um glamour já era? A nova geração está chegando diferente na tevê, no cinema, no teatro?
Jorge Fernando: Cada um tem uma grife e é um processo. Eu vejo muitos novos diretores com uma índole muito boa, uma formação mais humanista. Tem o Fred Mayrink , o Pedro Vasconcelos, o Marcelo Travesso. O Fred e o Pedro trabalharam comigo em Sete Pecados e durante toda a novela tivemos um clima excelente.

Canal Rh: Você é devoto de São Jorge. Costuma seguir algum ritual?
Jorge Fernando: Aproveito a água do banho todo dia para fazer um ritual de purificação. Enquanto limpo o corpo, limpo a mente. Me desligo daquilo que estava fazendo e me concentro no que eu vou fazer para não ir para um lugar pensando no que eu deixei no outro.
___________________________________
Fonte: http://www.rhportal.com.br - 14/01/2011
Imagens da Internet

Nenhum comentário:

Postar um comentário