quinta-feira, 20 de novembro de 2008

A ESTUPIDEZ CONSENTIDA



Paulo Gaiger *

O futebol e a religião compartem modos de fé e paixão mais assegurados na irracionalidade, desconhecimento e, portanto, no preconceito, e menos na compreensão e reflexão que são indispensáveis à evolução humana. Se pais e mães evangélicos, católicos, kardecistas, judeus ou islâmicos, por exemplo, buscam inculcar nos filhos e filhas, desde a primeira infância, a sua religião ou profissão de fé, excluindo todas as demais, impedem aos filhos e filhas a possibilidade do conhecimento e reflexão que lhes permitiriam eleger, livre e criticamente, ter ou não uma religião. A ação dos pais, normalmente vítimas de semelhante processo de coação, se revela prepotente, estreita e vazia de discernimento, gerando este fenômeno que se chama fanatismo, tal como seguir um forte facho de luz que, sem que se perceba, ao invés de iluminar, cega. Ao contrário dos caminhos marcados, aos pais lhes deveria seduzir a idéia de educar seus filhos e filhas para que sejam pessoas boas, críticas, solidárias e éticas. Assim fosse, nenhuma fé e paixão seria mais importante que o ser humano e a vida.
No entanto, há um elo de gozo selvagem entre os provedores dos conflitos e disputas religiosas e os fanáticos das torcidas de equipes de futebol. O fenômeno boçal segue trajetória similar: muito antes de aprenderem o que é o futebol, de conhecer para compreendê-lo e desfrutá-lo, as crianças se vêem metidas dentro de uma camiseta do Inter ou do Grêmio, obrigadas a recitar trechos da Bíblia ou do Alcorão, execrando todos os diferentes. Se gostassem mesmo do futebol, admirariam as qualidades da outra equipe. A prepotência dos pais ao impor seus modelos subtrai a liberdade e o direito dos próprios filhos e filhas. Uma das conseqüências é a violência travestida de paixão.
O neonazismo, o racismo, a homofobia e a discriminação contra a mulher, bandeiras de imbecilizados do Grêmio e de qualquer fanático, revelam um extremo da vacuidade humana cujo ponto final se desconhece.
Sem dúvida, as instituições futebolísticas e o Estado devem atuar e punir a selvageria. Contudo, são os pais os mais responsáveis, os que devem mudar substancialmente os modelos de pensamento e suas condutas. A vivência democrática, ética e responsável, deve começar em casa.

* Professor da Unisinos, cantor, ator e diretor teatral -20/11/2008
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