sábado, 9 de outubro de 2010

Yang Lian - Entrevista

“O massacre foi o ponto de virada”

Arquivo pessoal

Na década de 1970, Yang Lian fazia parte do primeiro grupo clandestino de escritores da China que publicou a revista literária Jiantian (“Hoje”, em mandarim). Em várias ocasiões, o poeta de 55 anos encontrou-se com Liu Xiaobo. “Ele não fazia parte do grupo, mas éramos da mesma geração e nos reuníamos em eventos diferentes”, contou ao Correio, por telefone, de Londres. “Liu mostrava-se como uma espécie de crítico e filósofo, enquanto eu era um poeta”, lembra. Em junho de 1989, após o governo chinês reprimir o movimento pela democracia na Praça da Paz Celestial, em Pequim, e executar 2,6 mil manifestantes, Yang Lian refugiou-se na Austrália e na Nova Zelândia. Na década de 1990, foi indicado ao Nobel de Literatura. Membro da diretoria da International PEN — organização fundada em 1921 para lutar pela liberdade de expressão —, ele considera o Nobel da Paz uma “ótima” notícia para pensadores independentes da China.

Como o senhor recebe a notícia do prêmio, e o que deve mudar na China com esse Nobel?
Eu creio que essa é uma notícia ótima para os pensadores independentes na China, que ainda estão em situação difícil, ainda que a economia chinesa esteja crescendo muito mais que antes. Os intelectuais chineses que falam sobre a situação política estão vivendo uma realidade muito difícil. O Nobel da Paz é uma espécie de apoio a esses pensadores.

Existe a possibilidade de Pequim libertar Liu nos próximos dias? O senhor teme pela integridade física de Liu?
Não creio que a China colocará a vida de Liu em perigo, porque ele é a base desse prêmio. Está preso e impedido de deixar a prisão. Esse Nobel da Paz será de grande ajuda para o próprio Liu. Tenho certeza de que o prêmio apoiará a confiança dele em sua luta. De alguma forma, o Nobel deixará o governo chinês em uma situação muito embaraçosa e difícil. A China não se renderá e não o libertará apenas por causa do prêmio. No entanto, como o Nobel foi dado a Liu, cada dia de sua prisão será como um dia de punição a Pequim.

A China reagiu convocando o embaixador da Noruega e detendo dissidentes. Como vê isso?
A reforma econômica foi muito boa para a China e para o mundo, porque Pequim agora pode desempenhar um papel mais ativo. O Partido Comunista pretendia comprar o apoio internacional à candidatura de Liu. Ceder à pressão seria o mesmo que desistir dos direitos humanos e da democracia. Seria o mesmo que trocar princípios espirituais por dinheiro. A China tenta separar-se do Ocidente, evitando intromissão em seus assuntos e mudanças em sua cultura política.

De que modo o senhor definiria Liu, enquanto pessoa e intelectual?
Ele é um jovem nervoso, um contestador, tenta criticar e atacar a todos. Uma das melhores coisas em Liu é seu foco na realidade chinesa, especialmente em relação à política. Ele gradualmente construiu seu pensamento, voltado para a compreensão das dificuldades alheias. Liu está escrevendo e pensando de uma forma muito mais profunda, especialmente após o massacre da Praça da Paz Celestial, quando foi preso. A chacina representou o ponto de virada para que ele entendesse os processo de mudanças que ocorria na China. Ele voltou a ser um pensador real, uma verdadeira voz independente, um organizador da liberdade de expressão. Fiquei muito feliz com a notícia. No dia em que assumi a diretoria do International PEN, ele me telefonou e conversamos bastante. (RC)

"Como o Nobel foi dado a Liu, cada dia de sua prisão
será como um dia de punição a Pequim”
Yang Lian, poeta chinês exilado

Eu acho...

Denise Applewhite/Princeton University/Divulgação

“Convocar o embaixador da Noruega em Pequim apenas mostra que a China não entende as sociedades livres. E, se eles não entendem as sociedades livres, trancafiarão as pessoas que expressarem sua alegria pelo prêmio. As autoridades chinesas serão lembradas como gente que fracassou em fazer seu país mover-se adiante. Xiaobo e seus simpatizantes sempre serão celebrados como heróis”
Anthony Akroma-Ampim Kusi Appiah, professor de filosofia da Princeton University


ICPC/Divulgação


“O Nobel da Paz é um alerta ao governo da China de que ele não pode reprimir pessoas que têm opiniões diferentes — especialmente, jornalistas, intelectuais e advogados. A concessão desse prêmio a Xiaobo tem um significado simbólico muito profundo, de encorajamento aos intelectuais chineses”
Tienchi Liao, presidenta da ONG Independent Chinese PEN Centre, sediada em Hong Kong
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Reportagem por Rodrigo Craveiro
Fonte: Correio Braziliense online, 09/10/2010

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