domingo, 14 de novembro de 2010

O fim da pós-modernidade

Juremir Machado da Silva*


Crédito: ARTE PEDRO LOBO

Estava demorando, não? Lá venho eu com a maldita pós-modernidade. Com certeza vou citar um estrangeiro. Mas não é um francês. Um canadense. Só que ele já escreveu um livro, "Metamorfoses da Cultura Liberal" (Sulina), com o francês Gilles Lipovetsky. Consolem-se. Sébastien Charles falará amanhã, às 16h, na sala dos Jacarandás, no Memorial do Rio Grande do Sul, dentro da programação da Feira do Livro, sobre "as doenças da pós-modernidade". Serei o mediador. Haverá tradução simultânea. Aí está: Sébastien Charles anunciará o fim da pós-modernidade. Ufa!, dirão alguns. Ele anunciará também o começo da hipermodernidade. Ai, ai, dirão outros. A vida é assim. Sai um conceito, entra outro. O mercado das ideias não suporta vácuo. Pensar faz bem. Eu aconselho.
Por que trocar pós-modernidade por hipermodernidade? Sébastien Charles responde: "Porque simplesmente o conceito de pós-modernidade não corresponde mais às mutações sociais que estamos vivendo e que estão longe de indicar uma ruptura com a modernidade". Muito bem. O que caracteriza a modernidade: uma maneira de governar baseada na noção de pacto social, que faz da democracia o regime mais adequado a esse contratualismo jurídico; uma nova maneira de pensar, que faz da racionalidade e da ciência o pilar do funcionamento social; uma nova maneira de produzir e de consumir baseada nas leis do mercado e uma nova maneira de viver na qual o indivíduo prima em relação ao coletivo. Segundo nosso convidado, esses quatro fundamentos não desapareceram e, ao contrário, foram radicalizados. Tão simples assim? Os pós-modernos não se deram conta disso? Não perceberam nada disso?

"...Charles mostra que a hipermodernidade
é a aceleração da modernidade,
 medicalização da vida,
 desejo extremo de segurança e
de risco ao mesmo tempo,
crise e restauração de valores
num mesmo movimento,
desencanto com a política e exigência enfática
de comportamentos de
cidadania de uma só vez."



O que vem a ser a hipermodernidade? Sébastien Charles afirma que se trata de uma reinterpretação dos ideais e da moral de acordo com uma lógica individualista. Não é, no entender dele, um abandono dos valores ou um mergulho na falta de ética, mas uma releitura. O indivíduo é a medida de todas as coisas. Cuidar do corpo é um obsessão: "Trata-se mais de sentir prazer que de recusar o sofrimento, de manter-se em forma que de buscar novos prazeres incessantemente". Professor do departamento de Filosofia e Ética aplicada da Université de Sherbrooke, Charles mostra que a hipermodernidade é a aceleração da modernidade, medicalização da vida, desejo extremo de segurança e de risco ao mesmo tempo, crise e restauração de valores num mesmo movimento, desencanto com a política e exigência enfática de comportamentos de cidadania de uma só vez.
Paradoxos. Quem estiver cansado de ver o Internacional perder ou empatar vá ao nosso evento. Saberá que na hipermodernidade queremos mais e menos Estado. Desejamos total liberdade econômica, política, cultural, religiosa e de comunicação, mas também um Estado que regule os fluxos de capital e impeça as catástrofes como a crise financeira de 2008. Será excitante. Nada como, num domingo, entender finalmente quais são os males do nosso tempo. Depois, é só sair e tomar uma cerveja bem gelada ou um vinho para espairecer.
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* Filósofo. Escritor. Articulista do Correio do Povo
Fonte: Correio do Povo online, 13/11/2010

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