Floriano Serra*
Se há alguém no mundo com todos os motivos para estar sempre ocupado e apressado, certamente seria Deus, pela quantidade de pessoas que recorre a Ele, todos os dias e a todo instante, pelos mais variados motivos. Desde gente que pede para ganhar na mega-sena, até aqueles que pedem para tal candidato ser eleito, para chover, para fazer sol, para sair aquela promoção, para o chefe ser mandado embora, para a namorada ou namorado voltar, para o guarda rodoviário não usar o bafômetro, para o teste de gravidez dar negativo ou positivo... Uma loucura. Já perceberam o que ocorre nas partidas decisivas de futebol? No último segundo, o jogador vai cobrar um pênalti que dará o título ao time. De um lado, uma equipe se dá as mãos e, orando, pede a Deus para a bola ir para fora ou o goleiro defendê-la. Do outro, a equipe adversária, também de mãos dadas, reza e pede a Deus para a bola entrar. Ou seja, a divergente expectativa de todos, inclusive torcedores, é de que Deus pare de fazer tud o o que está realizando pelo mundo inteiro para fazer o atacante marcar o gol ou o goleiro pegar o chute. Pode? Essa introdução descontraída é para nos fazer lembrar daquele profissional que repete a todo instante:
- Agora não dá! Estou superocupado!
- Depois, depois! Agora não dá! Estou superatrasado!
Uma vez que esse profissional não é Deus – porque Ele sempre dá um jeito de atender todo mundo – conclui-se que o acelerado amigo não tem a menor ideia do que seja administração do tempo.
A exceção das disfunções comportamentais, certamente há quem aja assim por achar que tal postura passa a imagem de um sujeito muito trabalhador e indispensável à firma. Pelos muitos anos que convivi com o mundo corporativo, posso assegurar que metade das atividades que fazem aquele herói correr tanto e estar sempre ocupado, poderia ser facilmente delegada aos membros da equipe. Mas, fazer o que se o homem é centralizador? Estes parecem nunca ter ouvido ou lido nada também sobre delegação.
No frigir dos ovos, o primeiro prejudicado é o próprio, pois lhe falta tempo para participar de programas de integração com os pares e colegas e, sobretudo, de atualização – aliás, é característica sua nunca ter tempo para comparecer aos programas de treinamento e sempre chegar atrasado e bufando às reuniões. Nem na hora do almoço nosso elétrico profissional relaxa. Quando não come apressadamente um sanduíche na sua mesa de trabalho, ele corre ao refeitório e rápida e literalmente joga a comida mal mastigada na boca. Sem muita conversa, levanta-se e sai quase correndo, pois “tem muita coisa pra fazer e já está atrasado”.
É provável que esse profissional alimente a fantasia de que a empresa parará se ele diminuir seu ritmo. Se este for o caso, trata-se de um candidato potencial a um trauma depressivo se um dia for demitido.
Nessas pessoas, preocupa-me muito o comprometimento da sua qualidade de vida. Um tempo precioso a ser curtido com a família e amigos está deixando de ser utilizado e no futuro é mais do que provável que isso traga sérias consequências afetivas, psicológicas e sociais. Claro que isso tem solução. Uma adequada reflexão, uma revisão do estilo de vida, um claro entendimento do que é urgente e do que é importante (nem sempre estas condições caminham juntas) poderiam ajudar o nosso amigo e estruturar melhor o uso do seu tempo, controlar sua ansiedade e ser mais feliz. Todos ganhariam com essa mudança, inclusive a própria empresa.
Pena que geralmente esse profissional não tem tempo para pensar nessas coisas – muito menos em Deus. Certamente ele nem lerá este artigo: afinal, como sempre, tem um monte de coisas à sua espera e ele já está muito atrasado...
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* Diretor-executivo da SOMMA4 Gestão de Pessoas, autor de vários livros e inúmeros artigos sobre comportamento humano. Ex-diretor de Recursos Humanos de empresas nacionais e multinacionais.
E-mail: florianoserra@somma4.com.br
Fonte: Jornal Virtual Mestre - 12/11/2010
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