Affonso Romano de Sant’Anna*
1
Deus
não precisa da autorização de Nietszche
para existir
nem de fanáticos que declaram guerra
aos infiéis.
Deus
— ou que nome se lhe dê —
não necessita de preces, lágrimas, promessas.
Deus sequer lê poemas.
Na melhor das hipóteses
— os escreve
mas não assina
nem os divulga.
Na verdade, não necessita sequer
de nossa leitura.
Ele está em todas as partes
e acha vã nossa procura.
E quando lê livros de filosofia, ri,
soberano
— de nossa loucura.
2
Quando Deus tomou conhecimento
das teorias de Nietzsche sobre a “ morte de Deus”
estava, como sempre, ocupado
em fazer e refazer galáxias
pelo elementar prazer divino
de recriar-se eternamente.
Desconsolado, então,
Nietzsche se matou.
Pesaroso,
Deus
foi ao seu enterro
como não podia deixar de ser.
3
Ele vai ao Grande Mercado Nietzsche
adquirir artefatos para seu discurso.
Há ferramentas para multiuso
abrem e fecham qualquer porta
e conceito.
Na entrada
deve-se pegar um cestinho
para colher o que se pode das prateleiras.
Se não se acha o que se procura
basta ir um quarteirão mais adiante
em duas lojas tudo se encontrará
— uma se chama Foucault
— a outra Derrida.
*Affonso Romano de Sant’Anna escreve quinzenalmente neste espaço
FONTE: Correio Braziliense online, 29/11/2009
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