Editorial, Jornal do Brasil
Ainda que não tenha dito como isto se transformará em política pública, deve ser elogiada a prioridade ao ensino pré-escolar que o ministro da Educação, Fernando Haddad, revelou na entrevista concedida com exclusividade ao Jornal do Brasil, na edição de ontem. Isso mostra que o ocupante da pasta está atento a uma das maiores lacunas da educação no país. Estudos internacionais indicam que investimentos nesta fase da formação da vida do ser humano são fundamentais e que grande parte das desigualdades que surgirão mais tarde entre os indivíduos pode ser evitada no nascedouro.
No recém-publicado livro Educação básica no Brasil (Campus/Elsevier), um interessante artigo escrito pelos brasileiros Aloisio Pessoa de Araújo, Flávio Cunha e Rodrigo Moura e pelo americano James Heckman, Nobel de economia de 2000, mostra a importância da criação de programas educacionais voltados para crianças em idade pré-escolar que vivem em condições desfavoráveis. É comprovado que crianças nascidas num ambiente marcado por famílias desestruturadas, por pais que não têm boa escolaridade ou não dão incentivo aos estudos têm suas oportunidades comprometidas para o resto da vida. Os primeiros anos são determinantes no desenvolvimento da cognição – que está praticamente formada antes da entrada na escola.
A consequência deste achado é simples. A sociedade teria muito a ganhar com investimentos de educação na primeira infância. A atuação precoce seria uma forma de reduzir a repetência, combater preventivamente a violência e diminuir as desigualdades sociais. Programas educacionais voltados para a pré-escola chegam a diminuir as taxas de criminalidade no futuro em até 30%.
Dados como esses foram obtidos por meio da observação da vida de alunos que passaram por programas experimentais iniciados, nos Estados Unidos, nas décadas de 1960 e 70. Em alguns casos, as trajetórias das crianças (divididas em dois grupos, as que participaram e as que ficaram de fora, formando um grupo de controle com alunos de nível socioeconômico semelhante) foram acompanhadas até que elas chegassem aos 40 anos de idade.
Em um dos programas, constatou-se que, enquanto 45% das crianças que não tiveram a educação pré-escolar concluíram o ensino médio, esse percentual subiu para 66% entre aquelas que receberam o ensino adequado na primeira infância. Em outro programa, o número de crianças nascidas em ambientes desfavoráveis que concluíram o ensino superior foi três vezes maior que o daquelas que ficaram de fora.
São números mais do que contundentes e que mostram valer a pena o investimento. Há uma ligação inequívoca entre o pleno desenvolvimento da cognição da criança nos primeiros anos de vida e o aumento na probabilidade de conclusão do ensino médio, de chegada à universidade, algo que os gestores estão buscando por outras políticas, mas que é incompleto sem o trabalho de base. Não só por uma questão quantitativa, de universalização, mas qualitativa, de oferecer aos filhos das camadas mais pobres oportunidades mais equânimes de competição, contribuindo para a riqueza do país. O objetivo, segundo Haddad, é universalizar o atendimento a partir dos 4 anos. Os recursos serão facilitados pelo fim da Desvinculação de Receitas da União (DRU), que incidia sobre o orçamento da educação.
FONTE: Jornal do Brasil - online - EDITORIAL - 30/11/2009
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