Michael Kepp*
[...] MUITA GENTE PROCURA PLATEIA PORQUE SER O CENTRO DAS ATENÇÕES MELHORA NOSSA AUTOIMAGEM, O QUE É GRATIFICANTE
O que mais queremos dos outros é atenção.
Por ela, bebês choram e crianças aprontam. Os adultos subestimam sua necessidade de atenção. Quando pedi a brasileiros que descrevessem, em uma palavra, o que mais querem dos outros, quase todas as respostas começavam com "c": carinho, cuidado, compaixão, confiança, cumplicidade, compreensão e consideração. Respeito também foi popular. Mas todos esses desejos têm um denominador comum: a atenção.
Nós a buscamos porque só pela visão dos outros podemos conhecer a nós mesmos. Como diz "Diferentemente", de Caetano Veloso: "É você quem me olhando detona a explosão de seu saber quem eu sou".
Esses espelhos humanos nos tornam visíveis a nós mesmos, revelam nossas virtudes e vícios, permitem que aprimoremos quem somos. O adesivo "Deus, me ajude a ser a pessoa que meu cachorro pensa que eu sou" reflete esse desejo e a importância do olhar alheio.
Muita gente procura plateia porque ser o centro das atenções melhora nossa autoimagem, o que é gratificante. Palestrantes aqui dizem ao público "obrigado pela atenção" para expressar essa gratidão.
Ter a total atenção de alguém também é lisonjeiro. Quando não estava murmurando ao microfone, Sinatra seduzia as mulheres com o ouvido atento e o olhar penetrante, sorvendo cada palavra delas. Ele comparou uma mulher a uma plateia, dizendo: "Se você se mostra indiferente, é o fim da linha".
No corre-corre diário, também queremos o tempo das pessoas. Mas não tanto quanto sua atenção. O tempo é parte do pacote, mas não garante a atenção. Pergunte a uma mulher que sai com um homem que só fala da ex e ela lhe dirá que ele precisa aprender com Sinatra.
Mesmo na cultura do "tempo é dinheiro" dos EUA, a atenção é muito valorizada. Por isso, os americanos diferenciam o tempo normal do de qualidade, períodos curtos em que dão àqueles que amam total atenção.
Eu e minha mulher tiramos férias no interior do Brasil, onde as pessoas nos dão mais atenção e têm mais tempo para nos receber do que os urbanos.
Por que isso acontece? Não sobrevivem galgando escadas corporativas, mas criando comunidades interdependentes.
Prisioneiros se unem a facções não só para sobreviver mas para reduzir o isolamento social. Estudos mostram que a pessoa na cela solitária prefere o pior companheiro à solidão, que qualquer atenção é melhor do que nenhuma.
O que mais molda nossa identidade é a interação social.
Por isso, precisamos de atenção desde o nascimento. Quando crescemos, uma forma de atenção, o reconhecimento, torna-se crucial. Quanto mais cientes ficamos de nossa finitude, mais precisamos de testemunhas que digam: "Ele é assim e isso é o que tem a oferecer". Vão manter nosso nome vivo até a última delas partir. E, apesar de não estarmos mais aqui para saborear essa atenção, é um conforto saber que a teremos bem depois do último suspiro.
--------------------------------------------------------------------------------*MICHAEL KEPP , jornalista norte-americano radicado há 26 anos no Brasil, é autor do livro de crônicas "Sonhando com Sotaque - Confissões e Desabafos de um Gringo Brasileiro" (ed. Record)
www.michaelkepp.com.br
mkepp@terra.com.br
FONTE: Folha online, 26/11/2009
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