MICHAEL J. WARGO
Entrevista
A descoberta, revelada na última sexta-feira, é considerada uma das mais fantásticas da história da ciência espacial. Em 9 de outubro passado, o foguete Centauro e o Satélite de Sensoreamento e Observação da Cratera Lunar (LCross) espatifaram-se contra a cratera Cabeus, perto do polo sul da Lua. A missão possibilitou o estudo da nuvem de poeira formada, permitindo a detecção de água no local. Em entrevista exclusiva ao Correio, por e-mail, Michael J. Wargo — cientista-chefe lunar dos Sistemas de Exploração da Nasa (agência espacial dos Estados Unidos) — explicou que somente no campo de visão da Lcross foram identificados 100kg do líquido em estado congelado. De acordo com ele, o gelo da Lua pode conter pistas sobre a formação do sistema solar, além de ser um indicativo muito forte da possibilidade de vida em outras regiões do universo.
Em que condições e quantidade a água está presente na Lua?
O impacto da nave Centauro ocorreu em uma cratera permanentemente escura, perto do polo sul da Lua. Por causa da sombra permanente, ali é muito escuro e frio, pelo menos 230 graus Celsius negativos. As medições indicam a presença de vapor d’água e gelo. De qualquer modo, acreditamos que, em sua forma original, a água seja congelada e que parte dela se transformou em vapor d’água. Nós estimamos que houve mais de 100kg de água em nosso campo de visão quando observamos o impacto. Se a água existir no resto da Cratera Cabeus, bem como em outras áreas permanentemente escuras, haveria de fato muita água. A dificuldade seria que a água está presa em locais muito inóspitos. Nunca trabalhamos em um ambiente tão áspero na Terra ou em qualquer outro lugar, com robôs ou humanos.
De que modo essa descoberta causa impacto na ciência espacial, em sua opinião?
A identificação de água nessas crateras muito frias e escuras é uma grande descoberta científica. Também sabemos que há outros componentes que estão presentes na água, ainda que não os tenhamos identificado totalmente. Eles podem estar preservados há muito tempo. Por isso, a água poderia conter pistas do início da formação do Sistema Solar.
Quando a sonda colidiu com a Lua, como se deu a detecção de água?
Tecnicamente, a água foi detectada quando o foguete Centauro colidiu com a Lua. A nave serviu como um estágio superior do foguete que lançou as sondas Lunar Reconnaissance Orbiter e LCross. A Lcross guiou o Centauro para dentro da cratera Cabeus e observou o material do solo lançado para fora durante o impacto. Os instrumentos científicos estavam a bordo da LCross. As medições feitas pelos espectrômetros mostraram evidências de vapor d’água, gelo e hidroxila (OH). A evidência de água surgiu em fração de um minuto após o impacto.
O achado pode mudar os planos da Nasa de exploração do espaço?
A Nasa agora tem uma importante informação adicional sobre a Lua. Aqueles que estão planejando o futuro da exploração espacial humana têm nossos resultados. Nós esperamos que isso os ajude a tomar suas decisões.
A água encontrada na Lua é totalmente similar à terrestre? Poderia ser processada e usada para consumo?
Quimicamente, a água que detectamos é o mesmo composto de duas moléculas de hidrogênio e uma de oxigênio que conhecemos na Terra. Com base em nossa análise, esperamos que haja outros compostos semelhantes, mas ainda não temos certeza de quais são. Por isso, é difícil dizer se seria fácil processar e purificar a água. Como eu já disse, a água está localizada em um ambiente muito escuro e frio, diferente de qualquer um na Terra. E isso representa um problema para o processamento.
Nos últimos anos, a Nasa descobriu água em Marte, em Enceladus (uma das luas de Saturno) e na Lua. Isso poderia ser um sinal de que o universo pode abrigar algum tipo de vida?
Nós sabemos que há muita água no Sistema Solar. Os cometas contêm muita água. Eles podem ter sido uma das maneiras pela qual a água foi levada à Lua. Um grande número de cometas tem certamente atingido a Lua desde sua formação. A água nessas crateras frias e escuras pode conter pistas sobre a vida em qualquer lugar.
"A Nasa agora tem uma importante
informação adicional sobre a Lua.
Aqueles que estão planejando o futuro da exploração espacial humana
têm nossos resultados.
Nós esperamos que isso os ajude a
tomar suas decisões.”
Reportagem de Rodrigo Craveiro para CORREIO BRAZILIENSE, 19/11/2009
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