Para o filósofo, psicólogo e psicanalista italiano Umberto Galimberti, os idosos vivem hoje um "processo de progressiva exclusão", por nunca terem experimentado "um tempo que não é mais cíclico", proporcionado pelas novas tecnologias. Segundo ele, este tempo atual é "semelhante a uma flecha lançada em um futuro que não se repete, mas que avança com uma velocidade que a mente senil, mais acalmada pelas recordações do que pelas novidades, não consegue mais correr atrás e acompanhar".
O artigo foi publicado no jornal La Repubblica, 19-11-2009. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Não é só a pobreza que gera marginalização. Também as novas tecnologias concorrem para isso, criando esse mundo de excluídos que são as pessoas idosas, que com dificuldade acessam o computador, o celular, os caixas eletrônicos e, de acordo com as notícias destes dias, também a televisão, por conta da passagem da antiga à digital. Essas duas últimas palavras já não são de fácil compreensão, mas todos as aprendemos com a velocidade com que aprendemos a linguagem científica dos médicos quando a doença insidia a nossa vida, alarmando-nos.
As pessoas idosas, que na civilização ocidental constituem 30% da população, vivem agarradas aos seus hábitos adquiridos no passado, que é o horizonte de orientação para conduzir sua vida que precisa mais de certezas do que de novos estímulos. As novas tecnologias, ao invés, olham para o futuro e por isso investem nos jovens e não nos velhos, os quais, diante de toda novidade tecnológica, sentem progressivamente excluídos, empurrados sempre mais para lá, até a periferia do mundo social, que sempre mais reflui no mundo telemático e virtual.
Esse processo de progressiva exclusão, que os velhos nunca experimentaram quando o tempo era cíclico e consolidado pelos ritmos da sua repetição, torna-se dramático hoje, quando as novas tecnologias inauguram um tempo que não é mais cíclico, mas semelhante a uma flecha lançada em um futuro que não se repete, mas que avança com uma velocidade que a mente senil, mais acalmada pelas recordações do que pelas novidades, não consegue mais correr atrás e acompanhar.
Mas os ritmos da vida não são os ritmos da técnica.
E o descolamento que já se criou entre esses dois ritmos produz aquela marginalização que só acentua a solidão do idoso, que, deste modo, saboreia até o fundo a negligência do progresso por causa da sua condição e, em consequência, a sua insignificância social.
Todos sabemos que a televisão, por exemplo, faz companhia às pessoas idosas que a veem não porque são teledependentes, mas porque, para muitas deles, é o único contato que podem ter com o mundo que, em termos reais, em termos de pessoas físicas, em torno delas, é sempre mais rarefeito, razão pela qual o mundo teletransmitido acaba sendo o único que lhes é permitido habitar. Por que privá-las também desse mundo, por que suspendê-lo também por poucos dias? Por que nem todos os decodificadores funcionam, por que são complicados e não facilitam a ressintonização, por que as antenas que tínhamos não são idôneas para restituir o sinal digital, por que os cabos de transmissão estão corrompidos pela umidade e, enfim, por que as pessoas idosas talvez não têm dinheiro para mudar todas essas coisas?
Por que a tecnologia, quando se trata de pessoas idosas, por razões de mercado, não hesita em introduzir novidades de aparelhos acústicos ou visuais, de próteses de todo gênero e qualidade, e, ao invés, não dá importância a esses dispositivos e a essas facilitações que permitem que os velhos, muito frequentemente sós, tenham pelo menos um mundo televisivo, depois de termos criado aquelas péssimas condições, razão pela qual a televisão é o único mundo do qual podem, mesmo que passivamente, participar, para não se sentirem totalmente isolados e ignorados pelo mundo real que as novas tecnologias lhes subtraíram?
Nada de objetar às novas tecnologias. Elas já são o nosso futuro. E, se não podemos renunciar ao futuro, pelo menos vigiemo-lo para evitar que, na euforia do progresso, não nos demos conta e não cuidemos daqueles que deixamos às margens do caminho, que todos percorremos correndo, sem se dar conta deles.
FONTE: IHU/Unisinos - 20/11/2009
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