segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Pai ou amiguinho?

Fábio Toledo*


Recentemente, uma reportagem divulgou o hábito de pais e filhos fumarem maconha juntos. Afora a aberração que é o uso de entorpecente em si, isso revela uma tendência dos pais e das mães de nosso tempo de se colocarem no nível dos filhos, portando-se como verdadeiros adolescentes, pensando que com isso conquistarão a confiança e a amizade deles. Mas será que os filhos esperam isso dos pais?

Talvez nos ajude a responder a essa indagação se considerarmos como são nossas expectativas em relação a um profissional que nos presta um serviço. Quando procuramos um médico, por exemplo, almejamos dele algo que não temos, que é o conhecimento técnico necessário para a cura de uma doença. E a relação que se estabelece entre médico e paciente não é de absoluta igualdade. Ao contrário, o médico possui autoridade para propor o tratamento adequado a que o paciente deve se submeter, ou procurar outro profissional, acaso não atinja um grau suficiente de confiança.

E algo de semelhante ocorre em outras profissões: advogado, engenheiro etc. Espera-se que tenha um conhecimento de seu ofício capaz de desempenhá-lo com eficiência e competência. E imagino que um cliente não teria suficiente confiança num advogado que o atendesse em seu escritório com uma camiseta surrada, jeans rasgado, tênis sujo, mascando chiclete e se expressando por meio de gírias vulgares.

Ser pai e ser mãe é muito mais que uma profissão, mas os filhos têm direito a que essa missão seja exercida com muito mais profissionalismo, eficiência e competência que qualquer ofício.

Nossos filhos têm direito a ter um pai e uma mãe de verdade, que se ocupem da educação deles. Não precisam de mais um amiguinho ou uma amiguinha. Pais que saibam exercer a autoridade no momento e na medida certa. Que respeitem a liberdade e a intimidade dos filhos. Que não sejam autoritários nem que vivam impondo restrições aos filhos apenas na medida em que violem a comodidade e o sossego dos pais. Mas que, sobretudo, sejam fortes o suficiente para dizer não, quando o bem deles o exigir e, mais ainda, que sejam valentes para sustentar suas decisões bem pensadas até o final.

Isso não quer dizer que os pais não possam ser amigos dos filhos, no sentido de que eles se sintam à vontade para lhes abrir a intimidade, revelando seus sonhos e frustrações. Seria muito bom que o pai e a mãe conseguissem contar com a total confiança dos filhos. No entanto, essa amizade há de se estabelecer sem que o pai deixe de ser pai, nem o filho de ser genuinamente filho.

Não se trata, também, de restabelecer uma relação autoritária entre pais e filhos. O pai e a mãe sábios percebem que a melhor ordem é um simples “por favor”, dito com tal delicadeza e com elegante firmeza que se fazem obedecer. E conseguem esse resultado porque o fazem por amor, não por vaidade, comodismo ou qualquer outro motivo que não o verdadeiro bem dos filhos.

Penso que o melhor exemplo de como deve ser a relação entre pais e filhos seja a de um guia que nos conduz numa escalada por caminhos tortuosos e desconhecidos. O guia será aquele que já percorreu o caminho muitas vezes. Portanto, sabe quais são os perigos, o momento de avançar e de retroceder, o de ousar e o de se precaver. E se for um bom guia, estará sempre atento aos passos de quem conduz. Essa é a missão dos pais. Sabem respeitar a liberdade dos filhos e, por conseqüência, deixar que caminhem com os próprios pés. Porém, sabem também que têm a missão de os guiar nos caminhos dessa vida até que sejam suficientemente maduros e, portanto, que saibam guiar a si próprios. Mais ainda, que um dia sejam eles também pais e mães a guiarem eficazmente seus filhos, nesse ininterrupto e maravilhoso ciclo da vida.

*Fábio Henrique Prado de Toledo é juiz de Direito em Campinas
FONTE: Correio Popular, online - 30/11/2009

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