segunda-feira, 16 de novembro de 2009

A viagem sem mapa


Da Índia: em visita a Campinas, professora de raja ioga fala da organização Brahma Kumaris
e ensina a administrar melhor o tempo


Vestida com um sári branco, Usha Ramanlal, de 49 anos, que nasceu na Zâmbia, África, mas há três décadas vive na Índia, chegou à sede da Brahma Kumaris de Campinas, uma Organização Não-Governamental (ONG), com mais de 8 mil escolas em 129 países ao redor do mundo. Sorriso meigo, ela escolheu como moradia a sede internacional da Brahma Kumaris, em Mont Abu, no território indiano.

Professora de raja ioga, Usha pesquisou sobre os grandes épicos e textos sagrados da Índia, o Ramayana e o Shrimat Bhagwat Gita, e tem percorrido o mundo para divulgar a atualidade dessa sabedoria para a vida moderna.

Pela primeira vez no Brasil, a professora diz que teve uma recepção muito calorosa. Em Campinas, a coordenadora do programa de qualidade de vida, de autogestão e controle do estresse da ONG discorreu sobre meditação e desenvolveu o tema “Estratégia de Administração do Tempo”. Segundo Usha, primeiro é preciso entender o tempo e o momento em que se vive.

E sobre esse momento, Usha Ramanlal faz um paralelo com uma aventura em alto-mar, como na situação vivida pelos grandes navegadores há mais de 500 anos, quando saíam para descobrir novos territórios sem mapas, sem saber exatamente dos perigos de enfrentar tempestades, correntes marítimas e animais. Eles tinham apenas intuição e dedução que lhes indicavam aonde deveriam ir. “Nossa vida é mais ou menos assim. Vivemos numa era de incertezas e não temos mapas definitivos. Estamos numa viagem sem direção para um futuro incerto e sem bússola. E queremos ter estratégias para trabalhar o tempo.”

Para a professora, é necessário ter um roteiro, desde o momento em que se levanta da cama. E é preciso acordar de bom humor, com pensamentos positivos e sem deixar que as notícias ruins criem estresse. “O importante é ter estrutura o tempo todo para tomar decisões importantes e, assim, conseguir administrar nosso tempo.” Nessa entrevista, Usha fala do poder interior que cada ser humano tem para administrar o tempo de forma mais eficaz.

Metrópole - Pela sua experiência, existe alguma fórmula para administrar melhor o tempo?
Usha Ramanlal - A fórmula é básica: acordar mais cedo, listar atividades, priorizar as mais importantes e, assim, administrar melhor o tempo. No decorrer do dia, no entanto, ocorrem imprevistos e o que foi planejado não é cumprido.

A senhora se irrita com o planejado e o não cumprido?
Se fico irritada, gero emoções negativas que influenciam o meu comportamento. Essa emoção pode se manifestar em forma de raiva. Quando tenho raiva, alimento ainda mais uma situação não resolvida. Isso vai se complicando significativamente em novas situações sem respostas e gera um ciclo de negatividades vicioso.

Como fazer, então, para transformar as situações e ter mais tempo?
O tempo é poderoso e exige que nos transformemos. Se num momento complexo, somos gentis e suaves e não agimos com raiva, não criamos complexidade.

Todos têm capacidade para enfrentar os desafios da mesma forma?
Para as pessoas com clareza interna para tomar decisões, os desafios são oportunidades. Mas há pessoas com a mente confusa... A mente confusa leva à tomada de decisões erradas. Estas geralmente permanecem estanques e o ego as impede de pedir ajuda.

Como o ego acaba desempenhando esse papel?
Temos que aprender a lidar com o ego para ter controle do tempo. Estamos sempre pensando. E conforme os nossos pensamentos, são os nossos sentimentos. De acordo com nossos sentimentos, são as nossas atitudes e as nossas ações. Essa será a personalidade que guiará o nosso destino. Ou seja, nosso destino depende de nossos pensamentos, segundo a psicologia. Espiritualmente, damos um passo à frente para moldar nossos pensamentos positivos.

Como é este processo?
A percepção vem de nossas experiências e elas devem estar concentradas em qualidades, e não em defeitos. Se tivermos experiências e valores positivos, teremos toda uma cadeia positiva. Para isso, temos que desafiar nossas crenças, que são as que definem nossos relacionamentos. As crenças bloqueiam nossa visão. A espiritualidade nos ajuda a desafiá-las e afia nosso intelecto.

Os épicos indianos são povoados de simbologia. Certa vez, a senhora disse em uma entrevista que há um campo de batalha dentro de cada ser humano. O que isso significa exatamente?


A vida é como se fosse uma luta, e o ser humano luta contra o bem e o mal. Quando é influenciado pelas negatividades, acaba perdendo a batalha. Positivamente, ganha a luta. A vida é influenciada pelos bons valores e essa batalha é mencionada em todas as escrituras. Na religião hindu é a batalha interna. É daí que vem a sabedoria de Gita, a escritura indiana, compartilhada por Deus como ser vitorioso nessa luta.

Todo ser humano é poderoso interiormente?
Todos têm poder. Mas é preciso ter percepção desse poder e, com a prática da conscientização e da meditação, atingir essa canalização. Isso vale para todas as fases da vida e em todas as áreas. É a nossa identidade. A maior crise atual é a de identidade porque o ser humano não se conhece.

O que é ser sábio, tendo-se como parâmetro a vida moderna que valoriza indistintamente e indiscriminadamente os bens materiais?
A sabedoria é algo que está além do materialismo, da religiosidade, das crenças. Com sabedoria amadurecemos a vamos alcançando diferentes níveis de sucesso.

A partir de que momento a senhora passou a fazer parte da Brahma Kumaris?
Quando terminei meus estudos na área de comércio decidi viver uma vida de espiritualidade.

Qual a atuação da Brahma Kumaris, levando-se em consideração que a organização mantém mais de 8 mil escolas em 129 países?
Nestes 35 anos de dedicação, minha meta é tornar o ser humano consciente de seu poder interno, e que pode elevar a vida a outro nível. Percebo que não é preciso vaguear pelo mundo buscando paz e felicidade. Nós nos sentimos orgulhosos de ter vida e paz nesse mundo. As pessoas querem tudo em bens materiais e não experimentam a qualidade de vida. E objetos não podem dar qualidade de vida, e sim os valores e as qualidades internas.

Reportagem de VILMA GASQUES -  vilma@rac.com.br Revista Metrópole, Jornal Correio Popular,  15/11/2009

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