terça-feira, 2 de setembro de 2014

Fingir que está tudo bem

José Luis Peixoto*
 

Fingir que está tudo bem: 
o corpo rasgado 
e vestido com roupa passada a ferro, 
rastos de chamas dentro do corpo, 
gritos desesperados sob as conversas: 
fingir que está tudo bem: 
olhas-me e só tu sabes: 
na rua onde os nossos olhares se encontram é noite: 
as pessoas não imaginam: 
são tão ridículas as pessoas, 
tão desprezíveis: 
as pessoas falam e não imaginam: 
nós olhamo-nos: 
fingir que está tudo bem: 
o sangue a ferver sob a pele igual aos dias antes de tudo, 
tempestades de medo nos lábios a sorrir: 
será que vou morrer?, 
pergunto dentro de mim: será que vou morrer? 
olhas-me e só tu sabes:
ferros em brasa, 
fogo, 
silêncio 
e chuva que não se pode dizer:
amor e morte: 
fingir que está tudo bem: 
ter de sorrir: 
um oceano que nos queima, 
um incêndio que nos afoga. 
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 * Nasceu a 04 Setembro 1974 (Ponte de Sor, Portugal) é um narrador, poeta e dramaturgo português.
Fonte:  http://www.escritas.org/pt/poema/3253/fingir-que-esta-tudo-bem
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