Autor
passou por Porto Alegre nesta semana, para aula magna na UFRGS,
em uma
homenagem do Fronteiras do Pensamento
aos 80 anos da universidade
Foto:
Fernando Gomes / Agencia RBS
Um dos mais premiados autores da língua portuguesa, escritor moçambicano fala sobre literatura e sociedade, defendendo que a sociedade precisa ir além dos estereótipos raciais para ser capaz de respeitar cada ser humano
Em voz baixa, o escritor moçambicano Mia Couto grita. O tom
sereno de um dos mais premiados autores da língua portuguesa contrasta
com a intensidade de seu discurso, que critica desde a onda do
politicamente correto até a ilusão salvacionista em relação à África.
Em passagem pela Capital para uma aula magna na UFRGS, o
escritor conversou com o PrOA. Na entrevista, o vencedor de
prestigiados prêmios como o Neustadt e o Camões, conhecido pela arte de
esculpir palavras, explica como faz de suas histórias um espaço de
resistência — e convoca a sociedade a ir além do estreito estereótipo de
raça para ser capaz de respeitar cada indivíduo.
Leia a entrevista:
O senhor vem de um dos 10 países mais pobres do mundo, e essa
temática dos desvalidos é marcante em sua obra. Ao mesmo tempo, a
esperança também é recorrente. Mesmo em Terra Sonâmbula, o seu livro que
retrata o contexto da guerra civil em Moçambique, isso aparece. Na
obra, o senhor escreve que o que faz andar a estrada é o sonho. Como
cultivar a esperança em meio à aspereza da realidade?
De uma forma coletiva temos dificuldade em encontrar um caminho. No
Brasil, no Moçambique, no mundo, nós nos sentimos um pouco perdidos,
porque as forças que hoje comandam o mundo são pouco visíveis, não têm
um rosto concreto. Como operar a mudança sem entender é muito
complicado. Mas a resposta começa a partir de cada um. Não podemos
abdicar desse outro modo de viver em que os outros são importantes, e é
preciso perceber que esse sentido coletivo, essa negação do mundo sem
lugar, de um mundo sem história, tem de ser feita em cada um de nós. Não
só contar e receber histórias, mas vivermos uma história. E essa
história tem que ser produzida por nós, não pode ser consumida. Não pode
ser algo como a gente vai ao cinema, lê um livro, e assimilamos as
histórias dos outros, que os outros fazem para nós. Temos de ser
produtores de histórias. Assim conservamos o papel de sujeitos.
O senhor critica a visão arrogante do Ocidente, que imagina
ter a receita para salvar o continente africano, sem considerar toda a
complexidade cultural. Qual o primeiro passo para que os ocidentais
possam ter uma visão mais realista do continente africano?
É preciso dizer que essa arrogância não é só da cultura ocidental.
Todas as culturas que se querem hegemônicas têm a mesma arrogância. Mas,
uma vez que essa cultura ocidental se tornou tão hegemônica, não se
pode pedir a essa outra cultura que tenha atenção. É preciso impor a
partir de dentro. São os africanos que têm que contar a sua história, e
ter a sua própria voz, como a voz que importa e que é respeitada. Em
lugar de pedir aos outros, a África tem que fazer isso a partir de
dentro. Isso já começou. Não se pode esquecer que um dos únicos
políticos do mundo que devolveu esperança ao mundo e resgatou a nobreza
de fazer política foi um africano, Nelson Mandela. É um grande orgulho
para a África ter esse caso singular no mundo, de alguém que fez
política para servir, no sentido de sua abdicação pessoal.
O racismo é uma realidade no Brasil, e tem aparecido
especialmente nos estádios de futebol, com casos de torcedores jogando
banana para um árbitro negro e gritando "macaco" para jogadores negros.
Já quando eu morava em Moçambique, tinha a sensação de que o branco era
visto como alguém rico e mais estudado, que deveria dar dinheiro aos
africanos. Como fugir dessa armadilha da "raça"?
Há várias maneiras. Um componente do racismo é que ele olha a raça
para não ver a pessoa. É preciso fazer valer as histórias de cada um,
acima da identidade racial. Não é a raça que produz o racismo, é o
racismo que produz a raça. E às vezes a resposta que damos ao
preconceito racial é fundada na raça, como, por exemplo, as políticas
sociais afirmativas, de cotas. Não sou contra, mas além disso tem que
haver a afirmação da individualidade. Porque, no fundo, o grande crime
do racismo é que anula, em nome da raça, o indivíduo.
O senhor também critica o politicamente correto, que nos
coloca a reboque de preocupações cosméticas, como se as palavras por si
só fossem mudar a realidade. Na sua visão esse é um recurso hipócrita?
Sem dúvida, sou muito contra isso. Em alguns casos, obviamente a
palavra também está mal. Mas, no geral, essa ideia do politicamente
correto, de pensar que a palavra vai alterar o conceito e o preconceito é
uma coisa importada, que vem de um mundo anglo-saxônico, com uma
postura religiosa, fundada no protestantismo. Lembro a primeira vez que
eu visitei os Estados Unidos, e um colega meu, escritor como eu, de raça
negra, fez uma palestra. E ele fez uma série de gafes, sem saber,
porque usou termos que não eram "corretos" ao designar sua própria raça.
E a seguir nos entregaram uma espécie de pequeno dicionário, com uma
pequena lista, com o que se devia dizer. Eu recordo bem que já não se
poderia se dizer "cego". Dizia-se "visually challenged", o que é uma coisa extraordinária. Eu acho que nunca conseguiria dizer, mesmo sendo escritor (risos).
O senhor se define como uma criatura de fronteira — que é
biólogo e escritor, tem origem europeia mas é africano, trabalha com a
ciência e a arte. Num mundo tão intolerante como o nosso, essa visitação
a diferentes realidades é cada vez mais rara. Por que nossa sociedade
teme tanto ultrapassar suas fronteiras?
Essas sociedades são fundadas no medo. Temos hoje uma forma de
governo que é administrar uma espécie de caos produzido pelo próprio
sistema. Isso envolve sempre um aparato policial, policiamento das
ideias, de anulação da criatividade, tudo feito em nome do medo, de uma
ameaça que não sabemos bem o que é. Então é preciso essa aceitação de
que esse outro está dentro de nós. Aqui no Brasil é uma coisa muito
notória: 90% dos brasileiros nem sabem bem como se combinaram histórias,
continentes, raças, dentro de si mesmos. E essa mestiçagem é o lugar
certo: a aceitação profunda de que o outro existe dentro de nós. Em vez
de a África ser procurada em África, provavelmente os brasileiros
encontram a África fazendo essa viagem interior, em sua própria
história.
Em seus textos, o senhor reafirma que a língua portuguesa é
um espaço de resistência. E que na periferia a palavra precisa lutar
para não ser silêncio. Em que medida escrever é uma forma de militância?
Escrever em qualquer língua é sempre uma forma de militância.
Escrever no sentido de fazer literatura, porque hoje há muito livro que
se edita que não parece que seja exatamente literatura. E a militância
existe em toda língua porque o que o escritor faz é dizer assim: eu
produzo pensamento, eu produzo arte, num universo em que não se espera
que as pessoas produzam desta maneira, como afirmação de sua própria
interioridade. Espera-se que se consuma. E fazer isso em português, num
mundo em que a língua inglesa é a língua global, é uma afirmação de
diversidade quase subversiva.
Seu próximo romance será sobre um imperador que resistiu à colônia... tem previsão de publicação?
Está em andamento. Mas sempre que me proponho a escrever um romance, sou atropelado pela poesia (risos).
Em vez de escrever esse livro, começam-me a nascer versos. É um momento
que eu quase odeio poesia... não queria. E já percebi que meu processo
de escrita é assim. É como se a poesia me ajudasse a entender o que eu
quero, o que é importante. No fundo, acho que sou um poeta que está
tendo a ousadia de escrever em prosa. Mesmo quando escrevo em prosa
estou fazendo poesia. E essa é a briga minha em caminhar pelo que seria
pelo romance histórico, por via de uma aproximação poética.
Esse livro de poesias está nascendo?
Já acabou, está pronto. Chama-se Vagas e Lumes. Será o quarto livro
de poesias que eu tenho, e no Brasil devem juntar todos em um volume
único. Porque é uma coisa trágica que está a acontecer, já não se
publica poesia. Só publica poesia quem tem um certo nome e portanto
assegura-se quem venda. Mas um jovem poeta hoje está praticamente
liquidado. É uma coisa terrível. Um grave sintoma. Estamos abdicando de
uma forma de nós. Porque a poesia não é um gênero literário, a poesia é
um saber, um olhar. O Vagas e Lumes deve sair em outubro em Moçambique e
em Portugal, e no Brasil ainda não tem sei.
E o romance, tem previsão de publicação?
Até o início do próximo ano devo acabar. A dificuldade ali é os
personagens me aceitarem, gostarem de mim. Porque o segredo é esse,
criar uma intimidade com aquela gente, que de partida parece que nasceu
de mim, mas eles terem vida própria, autonomia, para me chamarem. Estou
esperando que eles me chamem.
Seu processo de escrita é sempre assim, de se sentir convocado pelas histórias?
Só houve um livro em que o processo foi outro, e doloroso. Normalmente eu não sofro, não sou masoquista (risos).
Mas Terra Sonâmbula foi um processo diferente, sofrido, porque eu
escrevi durante a guerra. E a ideia que eu tinha era que a guerra não
terminaria nunca. Pensava que só depois de acabar a guerra faria um
livro sobre a guerra, mas o livro começou-me a nascer. E era doloroso
mesmo, porque à noite era visitado não por personagens, mas por
fantasmas quase, gente que morreu, amigos meus que desapareceram na
guerra... e eu ia para o computador e, depois de duas horas, estava
cansado, queria voltar à cama. Deitava-me cinco minutos e estava a ser
convocado outra vez. Foi um processo doloroso mesmo, não estou
romantizando. Percebi que não estava só a escrever, estava lutando
contra aquela asfixia que a guerra nos trazia.
E isso vinha como sonhos?
Eram como sonhos. A partir dessas pessoas que eu conheci, dessas
vozes. Eu era jornalista àquela altura. Lembro-me que um dos meus
colegas, que era chefe da redação do jornal e era uma pessoa mais doce,
cheia de esperança, anunciou que ia fazer uma viagem para um ritual de
família. Eu insisti tanto que ele não fosse, porque a guerra estava ali
na estrada... e ele foi morto. Ele, a mulher e os filhos foram queimados
dentro do carro. Então essa relação com essa memória, com essa perda,
era algo que me pedia uma história. Eu não sabia lidar com aquela
ausência.
"Eu fico
espantado como amigos meus às vezes dizem
que não querem ver um filme
porque
é um filme para pensar, como se pensar
não fosse uma coisa
prazerosa.
Pensar é um grande prazer.
E esse gosto está dentro de nós."
Isso me lembra uma frase do livro Um Rio chamado Tempo, uma Casa chamada Terra: "Morto amado nunca para de morrer"...
É. Mas ao mesmo tempo a África dá-te um conforto, que te ajuda a
resolver esse luto. Que é a uma convicção de que os mortos estão aqui,
estão vivos, e não só estão vivos como comandam a nossa vida também.
Acho que eu interiorizei mesmo isso. Meu pai morreu no ano passado, e
foi a primeira morte de alguém do meu sangue, e eu fiz esse teste em
mim. Nunca pensei que pudesse enfrentar essa dor como alguma coisa que
eu atravessei sem a necessidade de ter que ele findou... ele está dentro
de mim, eu sou ele. Não é só um pequeno conforto, uma pequena mentira,
acho que é uma verdade profunda.
A sua escrita cheia de invenções, que mescla registros da
fala popular de Moçambique, onde se falam 25 línguas, e também tem
influência de escritores brasileiros, é muito celebrada. Como o senhor
vê essa questão da linguagem?
Isso tem de ser visto do ponto de vista de que Moçambique percebia
que o português de Portugal servia, mas não bastava. Nós precisávamos
introduzir nesse português uma marca de mudança, de identidade própria. É
muito complicado fazer na língua do outro uma afirmação de nós
próprios. O Brasil ajudou muito, não só do ponto de vista literário.
Antes de nós, vocês já tinham percorrido um processo, de autonomia, de
fazer uma espécie de identidade brasileira dentro da língua portuguesa.
Quando africanos de língua portuguesa tomaram contato com a literatura
brasileira foi uma catarse, principalmente Jorge Amado. Foi uma espécie
de caução literária. Meus grandes mestres estão aqui.
Seria uma espécie de retroalimentação?
O Brasil é um grande produtor e exportador de língua portuguesa. E
não só por causa da dimensão da população, mas também das novelas.
Infelizmente, o livro não chega tanto, mas as novelas produzem grande
influência. Eu recordo que fui uma vez a Tete (província na região central de Moçambique) — e a (companhia) Vale do Rio Doce tem uma grande presença por lá. Eu entrei no hotel e os empregados moçambicanos cumprimentavam-me com Namastê, Namastê!
E eu não percebia o era aquilo. Vim a saber mais tarde que havia uma
novela, Caminho das Índias, e aquilo alterou a maneira das pessoas se
cumprimentarem, entre os próprios moçambicanos.
Em uma de suas palestras ao Fronteiras do Pensamento o senhor
disse que "Não podemos confundir informação nova com informação
recente. Muitas vezes as ideias que temos nos impedem de ter ideias
novas. E nos tornamos aquilo que já fomos. Como evitar que isso
aconteça, de virar refém das nossas ideias?
Acho que é pelo gosto, pela sedução que o pensamento tem. Eu fico
espantado como amigos meus às vezes dizem que não querem ver um filme
porque é um filme para pensar, como se pensar não fosse uma coisa
prazerosa. Pensar é um grande prazer. E esse gosto está dentro de nós. O
escritor também não pode ser algo que junto das novas gerações se faz
por imposição. Aquela pergunta clássica: você já leu James Joyce ou
Thomas Mann? E o fulano fica envergonhadíssimo, porque não leu. Não pode
ser por aí. Tem que ser uma ideia de cultura que se faz pelo usufruto,
pelo prazer, que o contato com esse mundo nos faz sonhar.
Entrando na sua outra área de trabalho, a biologia: o senhor
afirma que muita gente tem uma visão distorcida do ambiente, como se as
pessoas não fizessem parte dele. Qual dever ser, na sua avaliação, o
foco da discussão ambiental?
É preciso não cair nessa armadilha de pensar que o meio ambiente é
algo que se possa isolar. O meio ambiente é tudo. Sou muito favorável a
esta concessão africana, por exemplo, em Moçambique, nem palavra tem
para designar separadamente o meio ambiente. Não existe uma palavra que
diga natureza, meio ambiente.
Qual é a palavra usada?
Por exemplo, nas línguas do sul é Ntumbuluku. É uma palavra
que quer dizer várias coisas. Em primeiro lugar, quer dizer o
antigamente, a origem do mundo. E ao mesmo tempo quer dizer sociedade,
cultura, natureza. Porque essa visão do mundo não separa essas esferas
do conhecimento. Então a atitude não pode ser conservacionista, de
proteger a espécie. Tem que ser mais do que isso. Se não mudarem as
grandes políticas, a maneira de fazer economia, que é muito predadora,
não vamos salvar o que nós pensamos ser o meio ambiente. Seria mais um
entretenimento, e não uma luta radical.
"O Brasil tem essa
aparência de primeiro mundo,
mas depois percebe-se que o modo de
funcionar e
a preparação que as pessoas têm para a função
não é
exatamente de primeiro mundo."
O senhor também já disse que a pobreza é um conceito
relativo: em algumas línguas de Moçambique, sequer existe a palavra
pobre. Pobreza não seria só a falta de bens, mas a solidão. Como o
senhor enxerga os discursos sobre a pobreza?
Essa lição que a África pode dar é uma lição relativa. O que se está a
dizer não é que não haja pobreza. Mas a forma de medir a pobreza não é
pela falta de dinheiro só, é pela falta da rede familiar. Portanto,
quando se chama chisiwana, que é a forma para designar um
pobre, quer dizer que a pessoa começa a ser pobre quando perdeu os laços
de familiaridade, é uma espécie de desamparo, solidão. E essa é uma
maneira de medir a pobreza que pode ser aplicada também em outros
sítios. Somos pobres porque nossa vida foi empobrecida em todos os
sentidos. O quanto este mundo de hoje nos oferece de coisas que nos
encantam, que nos criam esperança e crença? Esse empobrecimento foi o
que nos ensinaram, de só ver por um critério econômico e financeiro.
Mas, desse ponto de vista, mesmo ricos hoje são pobres. Porque eles
próprios têm medo, não têm tanta esperança assim, vivem em função de
algo que é imediato, instantâneo.
No livro E se Obama fosse Africano, o senhor escreve que
nunca no nosso mundo teve tanta comunicação e nunca foi tão dramática
nossa solidão. Que nunca houve tanta estrada e nunca nos visitamos tão
pouco. Esse paradoxo tem solução?
Eu acho que tem que ter. Eu tenho fé, porque eu tenho filhos, tenho
netos, e eu reencontro essa aptência fundamental do menino de se
alimentar de histórias. Essa pergunta que o menino faz quando adormece,
que quer saber uma história, essa história não tem fim, só quando ele
adormece... E parece-me que existe um limite... Estou dizendo isso, mas
não sei se acredito no que estou a dizer. Acho que não há o limite para o
mau gosto. Quando nós pensamos que a má qualidade da televisão ou de um
órgão de informação chegou ao maus baixo, somos surpreendidos. Então
essa invasão é muito forte. Acho que essa espécie de anulação da
criatividade e do gosto de ser criativo... essa invasão hoje é total.
Fica pouco espaço para quem quer fazer algo diferente. Mas eu creio que
quem está se opondo a este mundo está muito centrado na luta política,
só. E acho que é preciso lutar em outros campos. Acredito que essa mesma
tentação de vivermos com Facebook, com redes sociais, cria uma espécie
de contraponto. Essa comunicação não é feita só no vazamento do outro,
acho que a gente se encontra também.
E o senhor usa as redes sociais?
Eu não uso, não. Mas não é pelo preconceito. Eu resisto um pouco
quando eu vou lá e perguntam: "fulano de tal quer ser seu amigo". Isso é
um grande desrespeito por aquilo que pode ser a amizade. Amizade é uma
outra coisa. Acho que não é inocente o uso da palavra amigo. Em toda
nossa vida, produzimos quantos amigos, 10? Contam-se os amigos mesmo,
nunca são muitos. E não precisam ser. Acho que há ali alguma coisa que
eu não quero entrar. Mas não sou contra, não faço guerra contra isso.
O senhor já se declarou como um apaixonado do Brasil. Qual a sua visão sobre o Brasil hoje?
Eu não sei se eu consigo ver o Brasil. Porque há tantos Brasis...
tantas hipóteses de mudança. Mas o que me parece é que o Brasil é muito
cativante. É um país que é fácil de ficar enamorado. E esse enamoramento
é uma coisa que ajuda o Brasil, mas cria uma dificuldade posterior.
Porque quem está enamorado não vê o outro, vê a construção que faz, não
vê defeitos. E depois, estando aqui, a gente começa a perceber como é
que algumas coisas que se tinha expectativa que funcionasse, não
funcionam, como os serviços públicos em geral. O Brasil tem essa
aparência de primeiro mundo, mas depois percebe-se que o modo de
funcionar e a preparação que as pessoas têm para a função não é
exatamente de primeiro mundo. Eu nem falo dos contrastes entre pobreza e
riqueza, que é muito falado e muito chocante, mas falo do contraste
entre a aparência que o Brasil tem e os outros mundos que vivem dentro
do Brasil. Apesar disso, eu prefiro isso do que um país só de primeiro
mundo. Acho que não conseguiria viver num país em que todo ele fosse de
um único mundo.
----------------Reportagem por Letícia Duarte
Fonte: ZH online, 07/09/2014
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