segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Caminhos e descaminhos da educação

Paulo Nathanael Pereira de Souza*

Esse é o título do mais recente livro, que publiquei pela Editora Integrare, de São Paulo, e que busca refletir sobre os aspectos mais graves que, desde sempre, se vêm abatendo sobre o setor. A educação do povo é fenômeno recente no Brasil, abordado pelas constituições democráticas do país, isto é, a de 1946 e de 1988 (sem falar no breve arejamento trazido pela de 1934, logo substituída pelo monstrengo da "polaca" de 1937), visto que, nos tempos coloniais, imperiais e republicanos (nesse caso, até o fim da 2ª Guerra Mundial) voltou-se a educação brasileira apenas para o atendimento das elites econômico-sociais do País: o povo mesmo permaneceu à margem do processo. Foi preciso haver urbanização, industrialização e inserção do Brasil no concerto internacional, para que a escolaridade do povo se impusesse como preocupação inadiável. Alguém poderá indagar: e os jesuítas não educaram índios e colonos nos séculos 16 e 17? De fato, mas não se o fez como direito dos educandos, e sim, como política de preservação do catolicismo nos trópicos, tanto que a aprendizagem inaciana de então foi sinônimo de catequese.
No livro, que dá título a estes comentários, os caminhos tratam da natureza da educação moderna, seu potencial em relação ao preparo das novas gerações para viverem na era do conhecimento, e com isso, assegurar a inclusão das massas na prática ativa da cidadania. Quanto aos descaminhos, procura-se demonstrar quais as dificuldades todas que, ao longo do tempo, se vêm antepondo ao sucesso do ato de educar o povo: obsolescência dos modelos pedagógicos, insuficiência da formação dos docentes, ausência de modernidade e pertinência nos processos didáticos, limitação de recursos financeiros, planos educacionais que são mais declarações de intenções, do que outra cousa qualquer. Os apagões da educação se localizam, de preferência, nesses e noutros fatores, que são amplamente analisados na referida obra.
"Porque a escola brasileira não alcançou
 ainda qualidade suficiente para oferecer
aos alunos educação dotada de pertinência.
No caso, pertinência significa ensino,
de tal forma qualificado, que satisfaça
os anseios dos estudantes, em particular,
 e os da nação como um todo,
por um preparo capaz de a todos
incluir nos padrões da modernidade,
a saber, da era do conhecimento."
Ainda recentemente, a mídia publicou e comentou os resultados de duas avaliações sucessivas: a Prova Brasil, que verificou o grau de aproveitamento das crianças matriculadas no terço inicial do curso fundamental, e o Enem, que mediu o desempenho de jovens matriculados nos cursos médios. Em ambos os casos, o resultado mostrou-se bastante precário. Na Prova Brasil, constatou-se que a metade dos alunos de oito anos não aprende o mínimo necessário para justificar a sua presença na escola. E, no caso do Enem, a maioria dos concluintes do ensino médio tem nota abaixo do índice desejável. Nas avaliações internacionais da Unesco e da OCDE, de cujas provas o Brasil participa, o fiasco não é menor. E por que isso acontece? Porque a escola brasileira não alcançou ainda qualidade suficiente para oferecer aos alunos educação dotada de pertinência. No caso, pertinência significa ensino, de tal forma qualificado, que satisfaça os anseios dos estudantes, em particular, e os da nação como um todo, por um preparo capaz de a todos incluir nos padrões da modernidade, a saber, da era do conhecimento.
Para fazer uma piada, que soa como sendo de mau gosto, costumo dizer que a educação brasileira obedece, hoje, a duas leis, concomitantemente: a LDB, que traduz o que de melhor se deva fazer nos diversos graus de ensino, e não tem sido aplicada no seu potencial mais avançado; e a lei dos comboios, segundo a qual a velocidade de uma frota naval é determinada pela velocidade da unidade mais lenta. Infelizmente tem essa última presidido o regime de funcionamento de nossas redes escolares. A grande reforma a fazer na educação nacional está em engavetar definitivamente a segunda dessas leis e assegurar ampla utilização dos aspectos mais progressistas (claro que pedagogicamente falando) da primeira. Só assim poderá o ensino formal alavancar o preparo dos jovens e, com isso, estabelecer o maior dos prerrequisitos ligados ao desenvolvimento brasileiro, a saber, uma educação pertinente.
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*Paulo Nathanael Pereira de Souza é doutor em educação, foi presidente do Conselho Federal de Educação.
Fontes:  Correio Braziliense on line, 03/10/2011 reproduzido por:http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=79526

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