sábado, 1 de outubro de 2011

Divorciados que novamente casam. Um problema de urgência pastoral

Jean Rigal*

O problema dos católicos, divorciados e que casam novamente, é um problema de urgência pastoral que reemerge na discussão católica. Propomos este texto, publicado pela revista Témoignage Chrétien (Paris, 19 de setembro de 2011), de Jean Rigal, docente de eclesiologia no Institute Catholique de Toulouse, França. A tradução é de Benno Dischinger.
O autor é conhecido como um dos mais importantes eclesiólogos de língua francesa da segunda metade do século vinte. Entre suas obras “L’Église, obstacle et chemin vers Dieu [A Igreja, obstáculo e caminho para Deus] (1983) ; - «L’Église em chantier” [A Igreja em canteiro de obras](1994); - é também autor de uma grande obra, “L’Ecclésiologie de communion. Son évolution historique et sés fondements” [A Eclesiologia em comunhão. Sua evolução histórica e seus fundamentos] (1997): esta obra constitui um verdadeiro tratado sobre a igreja, que põe no centro a categoria de comunhão”.

Eis o artigo.

Muitos católicos, incluindo certos bispos (pelo menos privadamente) dizem não se sentirem bem relativamente à posição da Igreja católica referente aos casais de divorciados que se casam novamente. O problema não foi enfrentado pelo Concílio Vaticano II, mas desde então continua a representar-se de muitos modos, e por vezes de maneira oficial. E eis que retorna à baila, nestes dias, a propósito de uma entrevista de D. Robert Zollitsch, presidente da Conferência episcopal alemã e ao “manifesto” de mais de 300 padres austríacos.
Não é de se admirar. Embora sufocadas e retomadas por certo período, as verdadeiras questões voltam à baila. Tanto mais que o número dos divorciados aumentou; na França há 50% de divórcios relativamente aos matrimônios.
Os divorciados que casam novamente são sempre mais numerosos nas assembléias litúrgicas e entre os responsáveis eclesiais. Muitos padres não se consideram autorizados, em consciência, a falar-lhes a propósito da comunhão eucarística: “Vinde à mesa... mas não comei”.
Não se trata de banalizar uma situação que compreende o seu peso de feridas e sofrimentos, nem de considerar tudo em função daquela realidade.
São pessoas diversas por sua origem e por sua história, mas também pela prova conjugal que tiveram que viver e que os marca, como nos casos de abandono da parte do marido ou da mulher. Com freqüência, o segundo matrimônio dá uma estabilidade e uma maturação que permitem construir um novo projeto na confiança.
"Acolher, dar prova de misericórdia,
 convidar ao discernimento,
 situar esta dificuldade em sua dimensão eclesial,
não seria mais evangélico
do que despejar proibições?"
Em suas prescrições, a Igreja não toma em conta esta diversidade. Deveria ser um primeiro ponto de atenção, antes que afastar os divorciados que casam novamente da comunhão, se não até mesmo do sacramento do Perdão.
Muitos que casam novamente no civil não se preocupam com isto, mas alguns sofrem profundamente em sua vida de crentes. Solicitar-lhes, diante de todos, para uma comunhão somente “espiritual” os torna mais ainda diferetes acrescentando-lhes ainda mais dor ao sofrimento ou à falência.
Em 1980 o Sínodo dos Bispos sobre a família solicitava, com 179 votos contra 20, “que se lhe dedicasse uma nova pesquisa sobre o mérito, tendo em conta também Igrejas do Oriente, de modo a colocar melhor em evidência a misericórdia pastoral”. Esta solicitação explícita não produziu nenhum resultado.
No ano subsequente, após haver recordado que “a Igreja é uma mãe misericordiosa”, João Paulo II, em sua exortação apostólica sobre a família, justificava o ensinamento tradicional: “Os divorciados redesposados se tornaram eles próprios incapazes de serem admitidos à comunhão eucarística, porque o seu status e sua condição de vida está em contradição objetiva com a comunhão de amor entre Cristo e a Igreja, que se exprime e está presente na Eucaristia”.
Muitos bispos expressaram, mais ou menos explicitamente, o seu distanciamento ou também o seu desacordo. Citamos na França D. Le Bourgeois, bispo emérito de Autun, e três bispos alemães, Kasper, Lehmann e Saïer, conhecidos por sua grande competência teológica universitária e pastoral. Mas, suas intervenções não tiveram consequências.
Sem recolocar em discussão o princípio da indissolubilidade do matrimônio, muitas vozes solicitam hoje, com insistência, que se ponha fim à discriminação atual e que se admitam à comunhão eucarística, em casos determinados e sob certas condições, divorciados que novamente casaram que o solicitarem. Retomar o problema em sua base seria, de resto, necessário para evitar que se encorajem decisões individuais sempre mais numerosas.
Em 1992, num documento intitulado “Les divorciés remariés”, os divorciados redesposados, a Comissão da família do episcopado francês propõe: “Quando os divorciados redesposados desejam sinceramente avançar no caminho da santidade, mas não podem aceitar a idéia de separar-se, especialmente por causa dos filhos, a Igreja não poderia, sem impor-lhes viver na continência, dar-lhes a absolvição e admiti-los à comunhão eucarística? Não poderia, pelo menos, reconhecer-lhes o direito de decidir em consciência o que devem fazer?”.
Acolher, dar prova de misericórdia, convidar ao discernimento, situar esta dificuldade em sua dimensão eclesial, não seria mais evangélico do que despejar proibições?
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*Eclesiólogo francês.
Fonte: IHU on line, 01/10/2011

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