Antonio Delfim Netto*
O problema da taxa de juros acompanha a sociedade há ao menos 4.000
anos! Já no Código de Hamurabi, quase 2.000 anos antes da nossa era,
encontramos taxas fixadas porque registravam grande variabilidade:
33,33% para empréstimos de cereais e 20% para empréstimos de prata
-ambos, naquele tempo, exercendo a função de meio de pagamentos.
Quinze séculos depois o juro foi estigmatizado por Aristóteles, que o
condenou duramente porque ele era "moeda parida pela própria moeda", um
fato contra a natureza...
Apesar de condenado pelos canonistas medievais, nunca deixou de existir.
O laxismo da igreja em relação à contradição de condenar o juro, mas
aceitar que seus amigos, os banqueiros florentinos, enriquecessem com
ele, levou Lutero a atacá-los para atingir o papa.
Foi só nos meados do século 19 que se reconheceu explicitamente -com o
apoio da economia política nascente, que acreditava em leis naturais-
que a lei dos homens é impotente para impor limite fixo permanente à
taxa de juros.
O nível da taxa de juros real não é uma constante da natureza. Ela
depende fundamentalmente das instituições que garantem a segurança do
credor, da política monetária e do comportamento fiscal do governo.
O Brasil construiu condições para deixar de ter a taxa de juro real
teratológica produzida pelo desespero de alguns momentos e que se
perpetuou pela cômoda política monetária equivocada que a seguiu.
É por isso que devemos apoiar a firme decisão do governo de enfrentar o
problema do juro real. Primeiro, com a mudança da política monetária e,
agora, pela correção dos fatores impeditivos de sua livre determinação
pelo mercado.
Ter como objetivo uma taxa de juro real parecida com a internacional é
mais do que saudável, é absolutamente necessário para uma melhor e mais
eficiente organização produtiva geradora do crescimento econômico. Isso
não tem nada a ver com "guerra" contra banqueiro. Tem a ver com as
restrições institucionais construídas pelo próprio governo e que hoje
vão sendo superadas.
A coragem de enfrentar com firmeza o falso dilema das cadernetas de
poupança com medidas cuidadosas e sem traumas, depois de ter resolvido o
grave problema da aposentadoria do setor público, sugere a disposição
do governo de prosseguir na superação das outras "amarras".
Entre esses entraves estão: o aperfeiçoamento do sistema tributário, a
efetiva criação de um mercado de capitais, a ampliação das concessões, o
fortalecimento da liberdade dos trabalhadores para que a livre
negociação de acordos coletivos prevaleça acima das leis sem violar os
seus direitos constitucionais etc.
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* Economista. Colunista da Folha
contatodelfimnetto@terra.com.brFonte: Folha on line, 16/05/2012
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