O hábito de ficar sempre conectado expõe adolescentes a um excesso de
estímulos que pode interferir no desenvolvimento mental e social
Karime Xavier/Folhapress | |||
Maria Luiza Mendonça Silva e Alice de Mello Castanho, 8, participam de aula com projetor interativo no Colégio Pentágono, em SP |
Pesquisar no Google, mandar um torpedo pelo celular, atualizar o Twitter
e postar fotos no Facebook são algumas atividades que crianças e
adolescentes são capazes de executar -todas praticamente ao mesmo tempo.
Até aí, nada de surpreendente, afinal estamos falando dos nativos da
"geração digital" para quem o e-mail já é uma antiguidade. Mas nem mesmo
esses seres multitarefa passam incólumes por tanta conectividade e
tanta informação.
O impacto dessa avalanche se reflete não apenas em aumento de riscos
para a segurança dos jovens, temidos pelos pais, como também pode afetar
seu desenvolvimento social e psicológico.
Ao lado de ameaças que são velhas conhecidas, como pedofilia e
obesidade, surgem outras: ciberbullying, "sexting", "grooming" e
tecnoestresse.
O tal do tecnoestresse é causado pelo uso excessivo da tecnologia e
provoca dificuldade de concentração e ansiedade. O jovem tecnoestressado
também pode tornar-se agressivo ao ficar longe do computador.
Segundo o neurologista pediátrico Eduardo Jorge, professor da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, pesquisas já associam overdose
de tecnologia com problemas neurológicos e psiquiátricos.
"Estão aumentando os casos de doenças relacionadas ao isolamento. A depressão é a que mais cresce."
O neurologista também diz que há uma incidência maior do transtorno de
deficit de atenção entre adolescentes aficionados por computador.
"Não é fácil de diagnosticar. Os pais não acham que o filho tem
dificuldade de concentração porque ele fica parado no computador."
Outro risco é a enxaqueca. "Essas novas telas de LED são um espetáculo,
mas têm um brilho e uma luminosidade que fazem com que aumentem tanto o
número de crises de enxaqueca como a intensidade delas", alerta.
IMPACTO SOCIAL
Para o pediatra americano Michael Rich, professor da Universidade
Harvard, o impacto das mídias digitais tem efeitos de ordem física e
social. "Do ponto de vista da saúde, o principal risco é o da obesidade;
do social, o fato é que, quanto mais conectados, mais isolados os
jovens ficam no sentido das relações pessoais. É comum ver casais de
mãos dadas e falando ao celular com outras pessoas."
Opinião parecida tem o psicólogo Cristiano Nabuco, do Instituto de
Psiquiatria da USP. Segundo ele, a tecnologia invadiu tanto o cotidiano
que as pessoas se perdem no seu uso. "É mais preocupante em crianças e
adolescentes porque nessa faixa etária o cérebro ainda não atingiu sua
maturidade, não exerce plenamente a função de controle de impulsos",
diz.
A internet arrebata ainda mais dependentes quando se torna móvel:
estatísticas internacionais apontam que 20% da população mundial de
usuários de smartphones não consegue exercer um uso equilibrado da
internet, de acordo com Nabuco.
Mas é claro que nem tudo são pedras no mundo virtual, como explica
Eduardo Jorge. "Pesquisas também mostram que crianças usuárias de
tecnologias da informação são mais ágeis, mais inventivas e têm uma
capacidade maior de raciocínio em alguns testes de QI. A tecnologia não é
um bicho de sete cabeças do qual elas tenham que ficar afastadas",
afirma. "Devem ser estimuladas a fazer bom uso, com limites."
Rich considera que os próprios pais são os principais responsáveis por
esse quadro "cibercaótico". Segundo ele, por falta de intimidade com as
novas mídias, os adultos deixam de preparar as crianças para o mundo
virtual.
"Muitas vezes, eles apenas dão o laptop e pensam que, desde que os
filhos estejam no quarto, não vão se meter em confusão, o que é um
erro", afirma. "Os adultos precisam se tornar aprendizes dos jovens na
parte técnica para que possam ser seus professores na parte humana.
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Reportagem por ANNETTE SCHWARTSMAN COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Fonte: Folha on line, 15/05/2012
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