quinta-feira, 5 de julho de 2012

O que significa a vitória do Corinthians na libertadores?

Michel Aires de Souza*

Vivemos numa sociedade estratificada em função da ocupação social. As diferenças entre os individuos numa sociedade surgem em função da ocupação social.  Algumas ocupações ou funções conferem prestígio, fama, poder e dinheiro. Ser um grande médico, ser um grande engenheiro, um bom jornalista ou administrador de empresas não é uma tarefa fácil. Para se adquirir uma boa formação é necessário ter capital cultural, capital financeiro e capital social. Não é possível formar um bom profissional sem o respaldo de uma familia educada e consciente da importância da cultura e do conhecimento. Também é necessário ter posses e dinheiro para pagar boas escolas e ter bons professores. Além disso, é imprescindível ter uma rede durável de relações interpessoais de conhecimento e reconhecimento mútuo.
         Em nossa sociedade se valoriza o trabalhador competente e habilidoso.  Afinal, vivemos numa sociedade do conhecimento. O mercado de trabalho está cada vez mais flexível. Hoje as empresas associam uso intensivo da tecnologia, terceirização e flexibilidade na produção.   Com isso nos últimos trinta anos o perfil do trabalhador se modificou. Ele se tornou multifuncional e polivalente. O que começou a se valorizar foi a interioridade do trabalhador, não sua força física. Devido a uma maior automação e complexidade da produção o trabalhador tornou-se mais criativo, inteligente e crítico. Exige-se dele a capacidade de mobilizar saberes, conhecimentos e esquemas mentais para resolver problemas. Para ser desejado pelo mercado de trabalho os indivíduos devem adquirir recursos, obrigações, comportamentos e trabalhos pesados que são essenciais ao mercado. Eles devem ter conhecimentos, habilidades diversificadas e uma sólida formação profissional e cultural.  Dessa forma, para alcançar as melhores funções, os indivíduos devem se esforçar para se tornarem competentes.  Cada vez mais temos que agregar valor ao nosso eu. Temos que falar inglês, fazer cursos, ter mais de uma faculdade e adquirir de maneira pérpétua e constante competências esperadas por nossos empregadores.   

 "Num mundo onde se valoriza a vitória e o 

desempenho, os vencedores são poucos e os 

logrados são milhares."

         Mas o que isso tem a ver com a vitória do Corinthians? Significa que o futebol é um recurso simbólico para satisfazermos nossa incompletude.  Numa sociedade estratificada pela ocupação social muitos são os logrados. As posições na hierarquia social são limitadas, enquanto o número de indivíduos é ilimitado. O resultado disso é a frustração, a impotência e o desajustamento social. A sociedade nos ensina que temos que lutar, temos que nos esforçar, temos que vencer. As propagandas de carros, de bancos, de faculdades e de lojas de comércio constantemente dizem isso. Num mundo onde se valoriza a vitória e o desempenho, os vencedores são poucos e os logrados são milhares. Se no vestibular de medicina da USP 14.400 se escrevem e apenas 200 conseguem as vagas, a culpa deve recair sobre os indivíduos. Eles não estudaram o suficiente, eles não se esforçaram como deviam. É exatamente isso o que acontece.  O indivíduo culpa-se por sua incompetência. Acham que o problema está na sua incapacidade, na sua falta de esforço, na sua falta de perseverança. Mas o que não se deram conta, é que somente alguns superam as expectativas do sistema. O indivíduo deve se sacrificar para alcançar um lugar ao sol. Contudo, o sol nasceu para poucos. Só alguns privilegiados podem sentir o gosto da glória, mas isso a duras penas.    Dessa forma, a satisfação simbólica é o único recurso. A vitória do Corinthians é uma satisfação efêmera cuja função é manter o equilibrio mental de milhares de torcedores. A vitória não alcançada na vida é uma vitória que pode ser alcançar no futebol simbolicamente.
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* Professor.
Fonte:  http://filosofonet.wordpress.com/author/filosofonet/

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