Priscila Anversa*
“Só a imaginação pode ir mais longe no mundo do conhecimento. Os
poetas e os artistas intuem a verdade. Não pinto o que vejo, mas o que
sinto.”
“A minha pintura, sombria, dramática, suja, corresponde à verdade
mais íntima que habita no íntimo de uma burguesia que cobre a miséria do
dia-a-dia com o colorido das orgias e da alienação do povo. Não faço
mortalha colorida.”
Na fase mais madura de sua produção, destaca-se o famoso conjunto de
obras conhecido como “Os Carreteis”, seus brinquedos favoritos na
infância e presentes até o fim de sua produção. Resguardados na memória
do artista, foram incorporados a partir de 1958, período em que ele
adquiriu uma hérnia de disco e necessitou ficar em casa. Nessa época,
através do carretel explorou questões formais na arte, como a
geometrização.
“À medida que envelhecemos, parece que a infância fica mais perto.
Sentimos vontade de reencontrar os primeiros amigos e tudo que foi
nosso.”
“À medida que envelhecemos, parece que a infância fica mais perto.
Sentimos vontade de reencontrar os primeiros amigos e tudo que foi
nosso.”
Após um trágico incidente ocorrido no Rio de Janeiro na década de 80,
Iberê retorna ao Rio Grande do Sul, depois de muitos anos vivendo na
capital carioca. Buscava a tranquilidade após ter sido atacado por um
desconhecido na rua, reagindo e matando o agressor com dois tiros, em
legítima defesa. Através de relatos da família e de amigos próximos, o
ocorrido transformou o artista e sua arte. Nesta fase surge o conjunto
de obras que exibe figuras pedalando sem rumo, chamado “Os Ciclistas”.
“Sou um andante. Carrego comigo o fardo do meu passado. Minha bagagem
são os meus sonhos. Como meus ciclistas, cruzo desertos e busco
horizontes que recuam e se apagam nas brumas da incerteza.”
A década de 90 é marcada por sua última fase com a série “As
Idiotas”, composta por personagens sentadas em bancos de praça, com o
olhar vago, perdido. São obras que remetem à morte, à solidão, o
abandono, à tristeza.
“Sou um andante. Carrego comigo o fardo do meu passado. Minha bagagem
são os meus sonhos. Como meus ciclistas, cruzo desertos e busco
horizontes que recuam e se apagam nas brumas da incerteza.”
“As figuras que ora povoam os meus quadros (elas mesmas são os
quadros) nascem da saga, da vida que dói. Elas envolvem-se na tristeza
dos crepúsculos dos dias de minha infância, guri criado na solidão da
campanha do Rio Grande do Sul.”
O artista era filho de ferroviários, iniciando o desenho aos quatro
anos e idade. Aos treze ingressou na Escola de Artes e Ofícios de Santa
Maria, onde ganhou seu primeiro prêmio de pintura. Com dezoito anos
adquiriu seu primeiro emprego como desenhista do 1º Batalhão Ferroviário
de Jaguari. Na sequência, também atuou como desenhista na Secretaria de
Obras Públicas do Rio Grande do Sul. Em 1939 casou-se com Maria
Coussirat, professora de desenho e sua principal incentivadora. Iberê
viveu cerca de dois anos na Europa. Frequentou museus e estudou com De
Chirico, Petrucci, Achille e André Lhote. Interessado pela gravura,
trouxe uma prensa para o Brasil, formando uma geração de gravadores no
Rio de Janeiro. Seu lado cômico e extrovertido, pouco conhecido, está
presente em seus cartuns, ironizando políticos como José Sarney,
Fernando Collor e Pedro Simon, com seu personagem Maqui, nos jornais “O
Pasquim” e “Terceira Imagem”. Liderou também uma mobilização pela
redução das taxas de importação de materiais para pintura, cansado da má
qualidade das tintas fabricadas no Brasil, levando a questão ao então
presidente Getúlio Vargas, promovendo exposições contra os impostos
abusivos.
“Arte, para mim, foi sempre uma obsessão. Nunca toquei a vida com a ponta dos dedos. Tudo o que fiz, fiz sempre com paixão.”
Iberê Camargo morreu em agosto de 1994, pouco antes de completar 80
anos, vítima de câncer. Sem dúvida seu desejo de permanência, definição
por ele citada, foi realizado. Sua obra foi preservada graças a sua
incansável viúva, Maria Coussirat Camargo, de 96 anos, idealizadora do
projeto da Fundação Iberê Camargo, criada em 1995.
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