sexta-feira, 6 de julho de 2012

Querer ser grande

 DAVID COIMBRA*

 
Quando uma pessoa cai em depressão, quando ela se refocila em crise existencial, o que ela perde é a capacidade de se alegrar com as pequenas coisas da vida. De repente, ela não encontra mais prazer nas coisas realmente importantes, que são as coisas sem importância.

A xícara fumegante de café e o jornal de todas as manhãs. Uma gargalhada de criança. Um beijo terno. O chope cremoso com os amigos. As brincadeiras dos colegas de trabalho. A música que se evola do rádio do carro. Um despretensioso filme policial de fim de noite. Nada disso muda a vida de ninguém, mas é isso que constrói a vida a cada dia.

Muitas vezes, a grande dificuldade não torna a pessoa infeliz. A grande dificuldade, em vez de abatê-la, pode fazer com que lute, pode desafiá-la, pode até dar sentido a sua existência.

O ideal seria que o homem compreendesse que a verdadeira realização, que a vitória mais gloriosa que ele pode alcançar é sentir todos os dias a alegria de estar vivo, é aproveitar cada momento não com euforia, mas com suave satisfação.

Mas isso é quase impossível. As pessoas anseiam por grandes conquistas, por fama e fortuna, por glória e reconhecimento. Todos querem ser o número 1. Mas não podemos ser todos o número 1: somos 7 bilhões, e o número 1 é um só. Mais: o número 1 não existe. Não existe um campeão. As pessoas não podem ser classificadas por ordem de importância, como times num campeonato de futebol.

Só que as pessoas se alimentam dessa ilusão. Então, elas se enganam com amores perfeitos, quando o ideal é o amor do dia a dia; se enganam com a fama, quando o ideal é o afeto; e se enganam com o dinheiro.

Todas as pessoas precisam de dinheiro, mas há uma quantidade de dinheiro suficiente para suprir quaisquer desejos. Por que alguém que tem cem milhões precisa de mais um bilhão? Não precisa, mas muitas vezes a pessoa luta por isso e até se corrompe por isso.

Grandeza. As pessoas têm a ilusão da grandeza. Por isso que é quase incompreensível o senador Demóstenes ter aceitado que o Cachoeira lhe pagasse até a conta do celular, algo que, ele mesmo admitiu, era da monta de trinta ou quarenta reais. Corrupção barata, portanto. Corrupção pequena. Feia, como toda corrupção, mas com o triste agravante de ser baixa.
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* Cronista da ZH.
Fonte: ZH on line, 06/06/2012
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